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Para diretor da Companhia dos Comuns, só haverá presença significativa dos negros na mídia brasileira quando acabar a feudalização do espaço midiático
Publicado em 06.12.11 - Por Marina Schneider-NPC
O ator e diretor da Companhia dos Comuns, Hilton Cobra, afirmou que o racismo é enriquecido e lapidado pela televisão brasileira, que faz uma manipulação da cultura e da situação social da gente negra. Segundo ele, é necessário incentivar a participação da população brasileira, discutindo, propondo e opinando, por exemplo, sobre as concessões de TV. “É justo que nós opinemos sobre os programas que chegam às nossas casas. Só teremos uma presença significativa da gente negra na mídia brasileira quando destruirmos a feudalização do espaço midiático, que insiste em confrontar a democratização dos meios de comunicação”, disse, durante o debate Racismo: a imprensa nega. A TV prega?, no dia 1º de dezembro, no Rio de Janeiro. O debate fez parte do Seminário Mulher e a Mídia 8, realizado pelo Instituto Patrícia Galvão entre 29 de novembro e 1º de dezembro e que discutiu racismo e sexismo na mídia.
Para Cobra, a regulação do setor de comunicação no Brasil é uma forma de combater o que chamou de “vale-tudo” promovido pelo sistema de mídias. “Um sistema excludente e atrasado do ponto de vista semiológico, pois as imagens dos negros são carregadas de sentidos que corroboram com o imaginário que se encontra, em pleno século 21, atrelado ao sistema escravocrata”, criticou. Ele ressaltou, ainda, que sem liberdade de expressão e de acesso aos canais não há como inserir outros discursos que não aquele imposto pelas famílias que detém o sistema de mídias no Brasil. Sobre a presença de artistas negros e negras nas novelas ou programas televisivos, Hilton Cobra acredita que só acontecerão se houver uma ampla e absoluta inserção dos negros em todos os espaços aos quais têm direito através da Constituição.
Além de regular a mídia também é fundamental uma nova gramática de produção
A atriz Maria Ceiça, que também participou da mesa, falou de sua trajetória profissional e afirmou que existe uma dificuldade para se tratar o negro e a pobreza com naturalidade na televisão. “Prevalecem os estereótipos”, disse. Rosane Borges, que é jornalista e membro do Núcleo de Estudos Afro-Asiáticos da Universidade Estadual de Londrina, também criticou a forma como o negro é representado na televisão. Ela lembra que na primeira personagem Helena negra do autor Manoel Carlos, na novela Viver a Vida, houve uma retração do protagonismo. “Taís Araújo passa a ocupar um lugar secundário. No momento em que se tem uma protagonista negra ela é menos protagonista do que as outras ‘Helenas’”, opinou.
Rosane também falou sobre a importância da regulação das comunicações e disse que só é possível pensarmos nas representações do homem e da mulher negra quando se entende que os sistemas midiáticos são nexo importante na construção do imaginário. “É necessário pensarmos uma nova gramática de produção para fazer um contraponto que não seja apenas de denúncia, mas de pensar outra estética negra”, sugeriu. De acordo com a professora, ao oferecer novas balizas técnicas de produção e execução de programas e peças publicitárias é possível construir outro imaginário. “Se não mudarmos a gramática de produção a luta contra o racismo na mídia e na dramaturgia fica mais difícil”, reiterou.
Necessidade de mobilização popular e de ocupação social das mídias públicas
A auto-regulação, tema também discutido na mesa anterior “Raça e gênero na publicidade: onde estão os limites éticos?” foi trazida pela debatedora Ana Veloso, jornalista, professora e representante da sociedade civil no Conselho Curador da Empresa Brasil de Comunicação (EBC). Segundo ela, os donos da mídia no Brasil – “os heterossexuais, brancos e ricos que dominam a comunicação no Brasil”, como frisou, querem discutir com a sociedade a possibilidade de a mídia se auto-regular, o que em sua concepção é uma falácia. “Diante da alta concentração dos meios de comunicação no Brasil isso não resolve o problema da democratização da comunicação. Poderia ser um dos caminhos, mas não vai resolver o problema”, disse. Ela concordou com a necessidade de mobilização popular pela democratização, apontada também por Hilton Cobra. “Se a gente não for para a rua nada vai acontecer”, disse.
Também se remetendo à fala de Hilton de que não se faz movimento negro pela internet, Ana frisou que o acesso à internet também não é o que vai resolver o problema da democratização da comunicação no Brasil. Ela ressaltou que a ocupação da internet – que não é uma zona completamente livre – não pode fazer com que o debate da radiodifusão seja abandonado. “Não acreditem nesse mito de que a internet vai democratizar o acesso aos meios de comunicação”, alertou.
Para Ana, a televisão brasileira, apesar de ter avanços técnicos e tecnológicos, é uma das mais racistas do mundo. Ela lembrou que às vezes tecnologia é colocada como uma condição para que a repórter negra não possa usar o cabelo do jeito que ela gosta (fato comum, relatado inclusive pela jornalista Rosane Borges durante o debate ao contar sobre a sua trajetória profissional). “Essa imposição tecnológica é uma falácia. Existe uma imposição que é ideológica, cultural e racista. Não podemos abandonar esse debate da apropriação social da tecnologia e da televisão”, destacou.
A jornalista explicou que quando negros e negras são tratados de maneira desrespeitosa na televisão acabam sofrendo um tipo de violência simbólica. Ela apontou as TVs e rádio públicas como espaços de contraponto a este tipo de postura, devendo cumprir uma função educativa. “Temos que recorrer à ouvidoria e ao conselho curador da EBC. O debate passa por relações de poder, pela segregação racial, mas passa também por esse espaço fundamental e a construção de uma mídia pública de qualidade”, disse.
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