Menu NPC
 
 Conheça o NPC
 Quem somos
 O que queremos
 O que fazemos
 Equipe
 Fotos do NPC
 Fale conosco
 Serviços do NPC
 Cursos
 Palestras
 Agenda
 Clipping Alternativo
 Publicações
 Livros
 Cartilhas
 Apostilas
 Agendas Anuais
 Nossos Jornais
 Dicas do NPC
 Dicionário de Politiquês
 Leituras
 Documentos
 Músicas
 Links
 
 
Cidades
Remoções violentas no Rio: o caso da democracia

Publicado em 25.02.11 – Por Comissão de Comunicação da Rede contra Violência

O anúncio de qualquer grande conquista para uma cidade, como a Copa do Mundo ou as Olimpíadas, deveria significar apenas felicidade. Entretanto, não é isso que observamos no Rio de Janeiro: Copa do Mundo e Olimpíadas, para as camadas populares, é significado de coação, ameaças e violência, muita violência. A cidade está sendo limpa para que milhões possam ver o "sucesso" da organização destes eventos por um país em desenvolvimento. Esquece-se de mencionar que a vitória não será de todos, mas de alguns (grandes empresas da construção e incorporadoras). É falacioso o argumento de que "todos sairão ganhando": a não ser que a palavra (e a prática) violência tenha ganhado um novo significado no repertório dos opressores. Certamente não é isso que está acontecendo neste momento.
 
O "sucesso", no sentido dado especialmente pelos arbitrários e violentos prepostos do prefeito Eduardo Paes, é a velocidade com que estão removendo aqueles que causam "dano estético e visual": os moradores de favelas, quistos que precisam erradicados a qualquer preço. No caso da Transoeste, R$ 1,2 bilhão. Foi isso que aconteceu com a comunidade Vila Harmonia, no Recreio dos Bandeirantes.
 
Na manhã do dia 24/02, uma equipe da prefeitura chegou à comunidade, formada basicamente por guardas municipais, operários responsáveis pelas demolições e mudança e pelos funcionários da subprefeitura da Barra da Tijuca. Como é comum nestas situações, os moradores não são informados sobre o que vai lhes acontecer. Entretanto, neste caso, insistentes e resistentes, perguntaram o porque daquele aparato todo. A resposta, curta e grossa, foi a de que a liminar que sustentava juridicamente a comunidade havia sido derrubada pela Procuradoria do município.

Não demorou muito, a pressão começou: o maquinário pesado, as pessoas que os conduziriam, a guarda municipal e o bando que forma a subprefeitura local foram diretamente para casa de uma moradora, avisando que esta seria a primeira. Como nesta casa havia muitas crianças, a prefeitura levaria também uma assistente social. Contudo, a dona da residência se recusou a recebê-la, pois, da outra vez que esta assistente esteve no local a destratou e lhe tratou com deboche e descaso.
 
Em seguida, um senhor chamado Cesar, que se identificou como delegado, de forma agressiva apontou para o relógio disse a moradora que estava cansado dela e que ela teria apenas 30 minutos para sair de casa. Logo depois, enviou um operário para começar a demolição. Entretanto, este se recusou a cumprir a ordem: aquela casa era de sua mãe. Este operário, então, tirou a camisa, reafirmou que não quebraria nada e se demitiu, na frente de todos. Outro operário, como num efeito dominó, também se recusaria a iniciar a demolição daquela casa. O senhor chamado Cesar disse que ele não poderia fazer aquilo, pois seria demitido. Não adiantou a ameaça: o operário, firme em sua decisão, disse que não cumpriria a ordem e também se demitiu. Mas a fúria e o ódio eram tantos que, apesar destas duas resistências, a ordem de demolição foi mantida. Iniciariam pela parte de cima da casa. Mesmo sabendo que ainda havia pessoas e pertences na parte debaixo da residência, de maneira irregular e sem se preocupar com as consequencias, funcionários da prefeitura viraram a caixa d´água, o que causou goteiras na parte inferior, o que poderia prejudicar os bens dos moradores. A moradora, dona da casa, reclamou. Em vão. Para piorar a situação, a polícia civil entrou em sua casa, sem ordem judicial, vasculhou gavetas, armários e todo e espaço da casa. Não justificaram o que faziam. Como que num passe de mágica, acharam duas capsulas de bala deflagradas próximos à casa. Provavelmente queriam criar uma situação para facilitar a demolição, incriminando alguém, seja lá porque. Moradores confirmaram que, durante a semana, policiais militares, que passavam na pista próxima à comunidade, atiraram a esmo, aparentemente sem motivo. Sabemos, pelos fatos, que havia motivos de sobra.
 
Por tudo isso, a moradora desta casa desmaiou e foi confirmada um Acidente Vacular Cerebral (AVC). Seus vizinhos e outros colaboradores que estavam próximos foram ajudá-la. A guarda municipal queria retirá-la numa maca e colocá-la no chão, como se fosse um objeto que, com prazo de utilidade vencido, pudesse ser descartado no lixo. Foi assim que a guarda municipal a tratou: como um lixo que se joga fora. Afinal, um caminhão da Comlurb já estava ali para isso... A arbitrariedade não parecia ter fim: primeiro, guardas e policiais não permitiram que a moradora fosse atendida, impedindo que a ambulância da SAMU entrasse na comunidade. Em segundo, um policial militar, que supostamente disse estar ajudando, ligou para o serviço de emergência, mas forneceu o endereço errado. Os moradores descobriram quando ligaram para a equipe médica e esta afirmou que estava perdida no bairro. Apesar disso tudo, desta moradora estar passando mal e não poder ser atendida, funcionários da prefeitura falavam que não podiam interromper o trabalho de demolição. Funcionários e guardas municipais eram agressivos e violentos com os moradores, mandando-os parar de falar e protestar, afirmando que eles fariam a despejo de qualquer maneira. O funcionário de nome César, em tom debochado e desrespeitoso, a todo momento ia na casa desta moradora dizer quanto tempo faltava para ela sair. Um jovem, inconformado com o via, ainda tentaria interpelar este funcionário, afirmando que este tipo de atitude violenta e arbitrária ocorreria só com os moradores. O César, em tom ameaçador, lhe responderia: "você vai se complicar".
 
Em outra situação, outra moradora, preocupada com o que poderia lhe acontecer, tentava organizar sua mudança. Entretanto, a equipe da prefeitura iniciaria a demolição de sua casa. Quando começaram a derrubada, ainda havia pessoas dentro da moradia, inclusive uma criança de 9 anos, que quase foi atingida por pedaços da parede que estava sendo derrubada. Moradores, neste momento, começaram a gritar, exigindo que se interrompesse a ação, mas sua reivindicação não foi ouvida e continuaram. Inconformados, os moradores insistiram, quando um guardo municipal, como se fosse integrante de uma gangue, chamaria moradores para brigarem fisicamente com ele. Em relação a um templo de candomblé que há na comunidade, os funcionários da subprefeitura afirmaram que nada fariam hoje. Todavia, essa é uma estratégia de desmobilização muito comum. Mais tarde, de maneira sorrateira, dirigiram-se para o templo e começaram a derrubar uma mureta que o separa da rua. Não respeitaram sequer um dos rituais mais importantes desta religião: naquele momento, haviam pessoas que estavam, seguindo a linguagem corrente, "recolhidas no santo". O responsável pelo local e também morador disse aos prepostos da prefeitura que no próximo final de semana ocorreria uma festividade, a "saída do santo". Mas, de maneira soberba e arrogante, os agentes da subprefeitura disse que era para ele "se virar", que não tinham nada a ver com isso.
 
A situação é desoladora: pessoas desorientadas, ofendidas em sua dignidade de seres humanos, sendo-lhes roubado um dos direitos mais fundamentais: a moradia. Uma moradora mencionou que a ação da prefeitura obrigou a separação de familiares, forçando a que cada um vá para um lugar diferente, para pelo menos passar a noite. Outra, embora muito resistente, disse estar se sentindo impotente: "ver um amigo no chão, precisando de ajuda e a prefeitura passando por cima em nome do que eles chamam de progresso".
 
Retornando à história da primeira moradora aqui citada, o funcionário referido acima, diante de um questionamento feito por ela, disse que os moradores teriam sido avisados e que lhes foi ofertado uma casa do programa Minha Casa Minha Vida em Cosmos, além de abrigo e que os moradores não aceitaram. A moradora ainda tentaria ponderar. Afirmou que sua filha, quando havia ido para a escola, tinha uma casa e endereço, mas que agora, quando retornasse, não teria mais. O funcionário, indiferente, afirmou que isto não seria um problema seu, que todos os moradores foram avisados e que, inclusive, estava sendo "bonzinho" com eles. Novamente, o sentido das palavras é invertido: violência agora é sinonimo de bondade, no repertório dos fascistas da prefeitura.
 
Como uma dos últimos esforços de resistência, meios de comunicação foram acionados, Ministério Público, mandatos parlamentares. Além disso, a defensoria pública tentaria reverter a decisão favorável à prefeitura. Sem sucesso. O juiz e os dois desembargadores acionados negaram o pedido de reconsideração da liminar. Um deles alegaria, ainda, que não faria isso porque faltava provas que o convencesse a fazer isso.
 
O que a experiência da Copa do Mundo e das Olímpiadas está nos trazendo de legado é a violência cada vez maior contra os pobres. Estes são humilhados, tratados como lixo, como algo que deve e precisa ser afastado, anulado, controlado, expulso, disciplinado e até morto. As leis são completamente rasgadas quando se observam as ações práticas do poder público municipal. Não há garantia institucional. O Judiciário opera como um braço do executivo. Os Juizes atuam como incorporadores imobiliários. Será o ocaso da democracia? É possível falar em democracia diante de todos estes acontecimentos? O Estado brasileiro, em todos os seus níveis, não será tão violador de direitos como tantas muitas ditaduras no mundo?
 
Isto precisa ser colocado à reflexão. Não podemos deixar o prefeito Eduardo Paes agir tão impunimente como tem feito. Será que ele não será responsabilizado? O que ele está fazendo é digno do Tribunal de Haia, que julga crimes contra a humanidade!


Núcleo Piratininga de ComunicaçãoVoltar Topo Imprimir Imprimir
 
 NPC - Núcleo Piratininga de Comunicação * Arte: Cris Fernandes * Automação: Micro P@ge