[Por Laudenice Oliveira] “Mídia no Brasil e Eleições de 2010”. Esta foi a mesa que fechou o terceiro dia do 16º Curso Anual do NPC. Para analisar o papel que a mídia desempenhou durante o processo eleitoral brasileiro, formou-se uma mesa de debate com Altamiro Borges, do Centro Barão de Itararé; Ivan Pinheiro, da Casa da América Latina; o jornalista Gilberto Maringoni; o professor Valério Arcary, do Instituto Federal de São Paulo; o professor Gabriel Mendes, da FACHA; e Breno Altman, do Ópera Mundi. A um consenso todos chegaram: a mídia brasileira mais do que nunca deixou clara a sua face conservadora nestas eleições. Nunca foi tão transparente a sua defesa do capital e da classe dominante do Brasil.
Acompanhe trechos das análises feitas por esses representantes dos segmentos de esquerda e estudiosos do mundo da comunicação.
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Valério Arcary, Breno Altman, Gilberto Maringoni, Renato Rovai, Gabriel Mendes, Ivan Pinheiro e Miro
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Valério Arcary: Hoje a mídia burguesa representa nossa derrota política
Para Valério Arcary, a partir dos anos 80 um dos elementos de consolidação dos regimes democráticos passou a ser a força da mídia, hoje com peso superior ao da década de 30. Isso porque, como ele analisa, no século 20 havia movimentos que enfrentavam as idéias e a ordem do capital. As entidades de classe, como os sindicatos, intermediavam as relações do mundo cotidiano com o do trabalho. Eles tinham a sua própria imprensa que dialogava com os operários e possibilitava um pertencimento ao movimento. Isso gerava credibilidade e permitia que os trabalhadores tivessem a sua interpretação de mundo dentro de uma outra lógica. Para Arcary, isso hoje não existe mais; a mídia burguesa se tornou maior. “Isso representa uma derrota política e até material para a classe trabalhadora”, declara. Segundo o historiador ainda há muito que se avançar no setor da regulação da mídia do Brasil. De acordo com ele, o Governo Lula, apesar de fazer críticas pontuais à mídia brasileira, teve duplicidade de tratamento neste segmento.
Breno Altman: Meios burgueses de Comunicação de Massa são Partidos
Na sua palestra, Breno Altman defendeu que o fortalecimento dos meios de comunicação no Brasil não é um fenômeno da fraqueza orgânica do capital. Para ele, as eleições no Brasil são a síntese do processo de fusão do poder econômico e político. Altman ressaltou o oligopólio da mídia controlada por poucos grupos, numa situação em que 70% do que se lê, se ouve e se assiste no país é determinado por eles. “Esse ambiente desgasta ao máximo as experiências dos trabalhadores e estabelece a negação dos valores de esquerda”, analisa. Na sua avaliação, nessas eleições houve uma mudança de perfil, pois os meios de comunicação de massa assumiram a campanha eleitoral quase abertamente, como foi o caso do Estadão. Outros colocaram algum verniz, mas apresentavam a mesma postura. Segundo Altman, o território da comunicação foi onde o governo Lula não avançou, chamando atenção para a importância da regulamentação da mídia. Breno concluiu para a necessidade da regulamentação da mídia, como acontece em vários países.
Altamiro Borges: A mídia é o partido político do capital
“Um tema complexo e polêmico”. É desta forma que Altamiro Borges classifica o assunto das eleições de 2010 e a mídia no Brasil. Para ele, a mídia não mede esforço para se voltar contra a classe trabalhadora. Isto fica muito claro quando ela resolve fazer cobertura de alguma greve e nunca procura saber qual a reivindicação da categoria. “A mídia é cada vez mais avessa a liberdade de imprensa, é concentrada, pratica as maiores sujeiras. Ela omite o que não lhe interessa e salienta o que lhe interessa”, ressalta Miro. De acordo com ele, nas eleições deste ano a mídia foi o partido da direita e virou forte cabo eleitoral desse segmento, fazendo uma campanha preconceituosa e obscurantista. O jornalista ressalta ainda que a campanha deste ano representou um retrocesso para a luta feminista. “Vamos viver quatro anos de virulência machista. Nessas eleições, tivemos a pior cobertura do jornalismo brasileiro”, afirmou.
Ivan Pinheiro: Mídia escolheu os candidatos
Ivan Pinheiro, que foi candidato à presidência nesse ano pelo PCB, definiu como “show midiático” a cobertura das eleições deste ano. Ivan defende que a mídia brasileira escolheu os dois candidatos que deveriam ir para o segundo turno. “Nenhum deles propunham a revolução”. Ele critica a posição de alguns movimentos que não entraram em determinadas lutas para não desgastar o governo Lula, como foi o caso da democratização da comunicação. Lembrou que, em países como a Venezuela, apesar dos processos de mudanças serem lentos e não profundos, lá eles estão criando seus jornais diários. “Aqui, são oito anos e não se criou um jornal diário para fazer o contra ponto. Há uma acomodação”. Além do jornal impresso, ele falou inclusive em se criar uma agência de notícia para a esquerda.
Gilberto Maringoni: Democratização da comunicação está na pauta
Na abertura da sua palestra, Gilberto Maringoni lembrou que as primeiras discussões sobre a democratização da comunicação ficavam muito restritas e esse segmento, mas hoje essa pauta já chega à sociedade brasileira. Como lembrou, a manipulação da mídia não é algo atual: se estende por algumas décadas. Ele analisa que a população brasileira teve ganhos materiais durante o governo Lula, mas não houve um aumento na consciência política. “É por isso que houve a virada do segundo turno, quando se introduziu o discurso religioso, fundamentalista, o casamento gay, o aborto e por aí foi”, lembra. Segundo Maringoni, para ganhar as cabeças é preciso fazer disputas como a da regulamentação da banda larga no Brasil. “Do nosso lado, a guerrilha também está na Internet, mas só isso não basta. Temos que lutar também pela regulamentação dos conselhos, garantir que o Estado faça isso. Precisamos reunir nossa força social para fazer a pressão”, finaliza Maringoni.
Gabriel Mendes: Campanha mostrou que direita reacionária está acordada
O professor Gabriel Mendes afirmou que desde 2005 que a imprensa brasileira estabeleceu um padrão de cobertura com face anti-popular e golpista. Como ele observa, todas as vezes que o governo procura estabelecer políticas públicas e a valorização dos direitos da cidadania, dissemina-se a ideia de autoritarismo e ineficiência. Mendes concorda que o governo Lula não avançou em diversas áreas, mas reconhece que valorizou a distribuição de renda entre as camadas mais populares – o que a mídia divulga como assistencialismo. Mendes discorda das análises de que a campanha foi despolitizada. Ele acredita que a Dilma tinha interesse de politizar, mas o Serra não: para alavancar a campanha pegou o gancho da corrupção para explorar o moralismo, o machismo e as questões religiosas. “Esse tipo de campanha mostra o quanto a direita reacionária está muito acordada. Não dorme profundamente como parecia”, adverte Mendes. “O que precisamos é valorizar a permanência e o fluxo de informação independente. Fazer o debate democrático. Pensar num mundo onde todos sejam proprietários e produtores de informação”, finaliza