Entrevistas
Beto Almeida: “A TV dos Trabalhadores é quase um sonho depois de um longo pesadelo”
Por Sind. Bancários Conquista e Região
O Brasil possui, atualmente, 28 TVs públicas. Além dos canais universitários, o conceito de TV pública engloba também as estaduais, as comunitárias e os canais dos poderes legislativo e judiciário. A partir desse mês, após 23 anos de espera por uma concessão, também vai ao ar a Televisão dos Trabalhadores (TVT). Para falar sobre o papel desses canais de comunicação e sua importância para a sociedade, o Piquete Bancário entrevistou Carlos Alberto de Almeida, Presidente da TV Comunitária de Brasília e diretor da Televisión del Sur (TeleSur).
Como está o cenário das TVs públicas no país? Houve avanço? Está
em curso um processo de fortalecimento do campo público da comunicação,
aos trancos e barrancos, com alguma lentidão. Mas, há um
fortalecimento, sobretudo após a criação da Empresa Brasil de
Comunicação (EBC), que acaba criando as bases para uma maior presença
da comunicação pública no país. Porém, falta muito para caminhar.
Trata-se de uma área extremamente sensível, e totalmente dominada pelo
poder econômico, pela oligarquia midiática. Alterar isto, sem uma
revolução social, é tarefa das mais complexas. Dentro deste quadro,
avançaremos sempre contraditoriamente. Não se deve ficar no discurso do
tudo ou nada.
A TVT é um indicativo de que os sindicatos e movimentos sociais devem ampliar os investimentos? A
TVT é quase que um sonho depois de um longo pesadelo, ainda que o seu
alcance, inicialmente, seja limitado. Primeiro, ela é importante por
representar a validez da tese de que não só o empresário pode ter
televisão, mas os trabalhadores também podem e têm todo direito
histórico de possuí-la. Aliás, são os trabalhadores que as constroem.
Segundo, porque abrirá mais outra brecha para ampliar a pluralidade
informativa, hoje quase que totalmente dominada pelo pensamento único
da oligarquia midiática, imposto ditatorialmente, à sociedade. Nem a
Constituição é respeitada no Brasil quanto a isto. Também é
importante porque poderemos criar uma linguagem nova, fazer uma tv sem
baixaria, sem apelos ao sensacionalismo. E por fim, porque poderemos
criar um círculo de apoio, envolvendo a participação de diversos
sindicatos que poderão ter espaço para a divulgação de vídeos que sejam
do interesse da classe trabalhadora. É uma mudança concreta, que não
recomenda o discurso do pessimismo.
As propostas para as TVs públicas apresentadas pela Conferência Nacional de Comunicação (Confecom) estão sendo respeitadas? Evidentemente,
a Confecom é um campo de disputa. Lá estavam os empresários. Não era
uma conferência revolucionária. Como a relação de forças no setor
comunicação não é amplamente favorável ao campo progressista, é preciso
fortalecer e articular novas iniciativas para o cumprimento das teses
aprovadas na Confecom.
A principal delas, a meu ver, é a
regulamentação do artigo 223 da Constituição, que fala na
complementaridade entre os sistemas público, estatal e privado de
Comunicação. É o que a nova lei de comunicação da Argentina está
tornando realidade. Um terço para cada setor! A Confecom mostrou que
esta luta tem que ser permanente e que é um enfrentamento com a
ditadura vídeo-financeira. Não basta aprovar teses na Confecom. É
preciso encorajar o governo a ir mais adiante, mais além. Portanto, é
indispensável articular a continuidade desta luta, em aliança com o
governo Lula e com a sua continuidade, e tudo indica que será a Dilma.
Como as novas tecnologias podem contribuir para a ampliação das TVs públicas? Eu
sou dos poucos que acha indispensável que o poder público também tenha
jornal impresso, como hoje tem na Bolívia, o jornal Cambio fundado pelo
Evo Moralez e o Correo do Orinoco, na Veneczuela, fundado pelo Chávez.
Tudo o que estiver no papel poderá estar no digital. Todas as novas
tecnologias podem ser complementadas.
Creio firmemente que
atualmente o movimento sindical já dispõe de recursos financeiros e
humanos suficientes, de compreensão acumulada para lançar um jornal
público impresso nacional, de grande tiragem, de grande circulação. É o
que estamos assistindo na América Latina, onde toda a mídia impressa de
grande circulação é de direita. Na Bolívia, Venezuela, Argentina e
Uruguai não funciona assim.
Nesse caso, com uma aplicação
mais adequada das verbas publicitárias públicas, parte do que hoje vai
para a Veja e O Globo, pode ser perfeitamente usada para sustentar uma
mídia pública dos trabalhadores.
Mas, no próprio movimento de
democratização há ainda muita relutância e dúvida, acerca do direito
dos trabalhadores terem seus próprios meios com o apoio do Estado. Se
as verbas públicas apóiam a oligarquia midiática, se o governo paga
para apanhar, qual é a dúvida de também termos jornal público
sustentado por verbas públicas, tvs comunitárias, jornal sindical de
grande tiragem apoiado por verbas públicas?
Núcleo
Piratininga
de Comunicação
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