Por Beto Almeida
17/06/10
1. A Empresa Brasil de Comunicação
(EBC), que abriga a TV Brasil, registra entre tantas diferenças em
relação às demais empresas de comunicação privadas do país, a boa
diferença de ser a única de alcance federal a possuir um Conselho
Curador, composto pelos mais variados segmentos sociais, inclusive com
representante de segmento da população negra, responsável por decidir
pelos rumos da instituição pública. Uma inquestionável vantagem
democrática, superioridade social comunicativa, sintonia com a
Constituição brasileira.
2. E esta empresa pública de
comunicação nasce de reivindicação antiga do movimento pela
democratização da comunicação, consolidada Carta Final no Seminário
Nacional “A imaginação a serviço do Brasil”, de julho de 2002, entregue
ao então candidato Lula. Em 2007, da caneta de Lula, nasce a EBC,
aprovada pelo Congresso Nacional. Não nasce como outras empresas de
mídia, na ilegalidade da ditadura, ou por meio de ações orientadas pelo
capital externo que patrocinou o golpe militar de 1964. Nasce com
lastro democrático, plenamente previsto no artigo 223 da Constituição,
aprovada pelo Congresso e embasada por anos e anos de lutas sociais E
já nasce com um Conselho Curador.
3. Apesar desta inegável vantagem
democrática, recente escolha também feita pelo presidente Lula para a
composição daquele Conselho, nele incorporando lutadores sociais com
trajetória comprovada de uma vida inteira à serviço das melhores causas
desta nação – como o jornalista Mário Augusto Jakobskind,
representante da ABI de densa história e o engenheiro Takashi Tome, do
CPQD – foi recebida com um controvertida restrição em artigo publicado
neste Observatório da Imprensa (ver “Conselho Curador, sem diferença”).
4. O artigo coloca em dúvidas os
critérios utilizados por Lula para o preenchimento dos cargos vagos. E
sugere que a melhor opção seria a indicação de duas ou de uma das
integrantes de entidades negras deixando transparecer que só assim, ou
seja, só por meio de mulheres negras no Conselho, as causas da luta
contra o racismo institucional podem ser efetivamente combatidas. É o
artigo que suscita dúvidas – sobre si próprio – não a escolha de Lula.
TV Brasil e a dívida informativo-cultural
5. Desde que foi criada, a TV Brasil,
pertencente à EBC, nascida da caneta de Lula e das lutas sociais, vem
pagando efetivamente a enorme dívida audiovisual acumulada neste país
contra o direito do povo brasileiro de ser ver por inteiro nas telas.
Isto não é irrelevante num país que registra apenas 8% dos municípios
com salas de cinema. A TV Brasil, embora jovem, vem tirando o cinema
brasileiro da clandestinidade. E nesta caminhada, exibe em volume e
qualidade jamais vistos nas telas nacionais documentários e temáticas
referentes à odisséia quilombola, às causas da cultura negra,
documentários denunciando o racismo, combatendo efetivamente a
invisibilidade a que foi relegada a população negra na televisão
brasileira comercial.
6. Mais do que isso, a TV Brasil acaba
de lançar, por sugestão de Lula, o seu canal internacional alcançando
inicialmente 49 países africanos – o que demonstra um indubitável
critério – sendo ainda a primeira emissora televisiva brasileira a
possuir um correspondente em território da Mama África. O pagamento da
dívida informativo-cultural vai além quando exibe a belíssima série
Nova África, conduzida pelo talentoso jornalista Luiz Carlos Azenha,
revelando um tesouro de cores e segredos da alma e da cultura africanas
para a população brasileira. Aliás, seguindo uma orientação da política
externa de Lula, o presidente da República que mais vezes visitou a
África e que afirmou termos uma dívida histórica a ser paga com os
povos africanos, que sob fogo e chicote construíram esta nação do lado
de cá do Atlântico. Esta política externa brasileira, tão criticada
pelos que preferem uma outra diplomacia, vassala aos EUA, como no
passado, nasce sim dos critérios e da mesma caneta com que Lula nomeou
os conselheiros que integram um Conselho diversificado e plural,
inexistente nas outras emissoras privadas, nas quais o departamento
comercial é o principal órgão de decisão editorial.
7. Talvez os críticos da escolha de
Lula não tenham acompanhado os documentários exibidos pela TV Brasil
relatando a luta revolucionária dos povos africanos, sobretudo a
libertação de Angola e de Moçambique. Neste caso, foram narrados
magistralmente dimensões da vida do líder negro Samora Machel,
assassinado numa operação organizada pelo governo racista da África do
Sul, com apoio dos EUA, quando Mandela ainda estava na prisão e o
movimento de luta contra o apartheid tinha como um de seus principais
líderes um comunista branco.
Cuito Cuanavale: o começo do fim do apartheid
8. Angola só conseguiu sua libertação
com a ajuda heróica e inestimável de 400 mil cidadãos cubanos, negros e
brancos, homens e mulheres, inclusive a filha de Ernesto Che Guevara,
que lá também combateu como médica, com a brancura de sua pele e a
gigantesca consciência solidária internacionalista cubana. Seguia os
passos do pai que havia lutado em Cabinda e no Congo. Liderados por
Agostinho Neto, angolanos e cubanos derrotaram o exército racista
sul-africano, que apoiava a Unita, movimento mercenário de direita
liderado pelo nazista negro Jonas Savimbi, com o apoio do regime do
apartheid, este por sua vez apoiado pela “democracia” dos EUA.. O ápice
desta luta foi a batalha de Cuito Cuanavale, em que o exército do
apartheid que apoiava o nazismo do negro Savimbi foi derrotado
implacavelmente. Para Mandela, Cuito Cuanavale foi “o começo do fim do
apartheid”. Depois veio a libertação de Namíbia, do próprio Mandela e
da própria África do Sul.
Tudo isto foi mostrado aos brasileiros
numa série de documentários exibidos pela TV Brasil, retirando do
ostracismo uma das mais belas páginas de solidariedade que a história
da humanidade registra. Cabe perguntar: por que o movimento negro
brasileiro foi incapaz de oferecer uma aspirina que fosse em
solidariedade aos angolanos e cubanos em luta contra o apartheid? E já
existiam relações normais entre Brasil e Angola naquele período, o que
teria permitido algum gesto concreto solidário. Mas o médico
brasileiro, brizolista e branco, David Lerer, exilado em Angola, esteve
cuidando de angolanos e cubanos. Enquanto o Brasil reconhecia o governo
de Agostinho Neto em plena guerra.
9. Mas, se constatamos que a TV Brasil
vem fazendo um esforço de justiça televisiva em relação ao papel da
solidariedade de Cuba na derrota do apartheid, verificamos em TVs
privadas, como a Globo News, critérios editoriais rigorosamente opostos
como quando da cobertura da secretária de Estado dos EUA, que em visita
ao Brasil participou de “debate” com estudantes negros da Faculdade
Zumbi dos Palmares. O reitor desta universidade, José Vicente, conta
que Hillary se surpreendeu quando soube que nem mesmo as multinacionais
norte-americanas instaladas no Brasil têm um único executivo negro. Não
surpreende a desinformação da secretária, mais interessada em assegurar
o expansionismo militar dos EUA sobre o Iraque e Afeganistão, a custa
de mais de 1 milhão de cadáveres já. E também em preparar e encorajar
uma incineração nuclear do povo persa, que tem todo o direito de ter
acesso à tecnologia nuclear, como outros povos. Não consta que o Irã
tenha invadido ou oprimido outro povo. Já os EUA, incontáveis vezes! O
que surpreende sem dúvida foi a honraria com que um personagem tão
nefasto da história moderna foi recebido pela Zumbi dos Palmares.
Ninguém sobre as torturas de Guantánamo?
10. O encenado debate, transmitido pela
Globo e conduzido por jornalistas que afrontam a política externa de
Lula para a África, não contou com uma só pergunta à Hillary Clinton
sobre os bombardeios a alvos civis iraquianos ou afegãos, sobre as
torturas na base de Guantánamo, ou sobre a ocupação militar
estadunidense sobre a negra e destruída Haiti, cujo presidente negro,
Jean-Bertrand Aristides, eleito pelo voto popular, foi seqüestrado por
ordem de Bill Clinton – o maridão que se distraía sexualmente no Salão
Oval enquanto ordenava ações militares pelo mundo –, assim que começou
a estabelecer acordos de cooperação em saúde e educação com Cuba.
Implacável coincidência: quando o líder negro Malcolm X estabeleceu
contato com Che Guevara e com idéias socialistas, ele foi metralhado
por um comando negro que cuidava de manter a boa relação entre luta
contra o racismo e o acúmulo de capital. Mas os estudantes negros
“perguntaram” ou sugeriram a crítica ao presidente negro da vizinha
Venezuela, e ela não escondeu a satisfação com a deixa para atacar Hugo
Chávez, sobretudo pelo fato de ter terminado com o privilégio que
empresas norte-americanas tinham no passado sobre o petróleo da terra
de Bolívar.
11. Não surpreende o grau de
desinformação de Hillary Clinton com o racismo institucional das
multinacionais dos EUA. Será que ela sabe que nas prisões dos EUA mofam
uma maioria pobre e jovem de negros, hispânicos e asiáticos? Será que
ela e Barack Obama têm idéia da cor da pele das crianças afegãs sobre
as quais bombardeios não-tripulados despejam toneladas de bombas?
Estará informada que um total de 500 jovens norte-americanos, pobres e
negros, moradores do Harlem e do Brooklin, estudam medicina em Cuba na
Escola Latino-Americana de Medicina, mesmo com o bloqueio dos EUA
contra a ilha? Na mesma ilha, enquanto marines norte-americanos
torturam em Guantánamo, em Havana jovens estadunidenses negros e pobres
estudam. Que similaridades há entre a cor da pele e a consciência dos
que torturam, do que manda torturar e aqueles que estudam? Nenhuma! Que
diferença há entre eles: a Revolução Cubana que oferece ao mundo a mais
elevada taxa de justiça social do planeta, inclusive na superação do
racismo.
12. Talvez sejam assuntos muito
complexos para discutir com uma Hillary Clinton mais familiarizada com
uma diplomacia que produza mais encomendas para a indústria bélica. De
todo modo, fica o espanto: por que nenhum estudante negro da Zumbi dos
Palmares perguntou sobre o jornalista negro Múmia Abu Jamal, preso no
corredor da morte nos EUA, condenado por um juiz que prima por ser o
campeão na ordem de executar negros, ainda quando as provas do crime
são escandalosamente forjadas como neste caso? Estão informados deste
caso clamoroso? Ou estariam mais preocupados em sustentar que sua
concepção de luta contra o racismo tem inspiração no modelo político
dos EUA que, para eleger Bush, promoveu o maior embranquecimento do
cadastro eleitoral que se tem notícia?
13. A afirmação de que a escolha de
Lula para o Conselho Curador da EBC deixa lacunas lança dúvidas quanto
a um presidente que tem sido o mais empenhado, até hoje, em pagar as
dívidas sociais acumuladas contra nosso povo pobre, inclusive as do
racismo institucional. E com atos concretos. É da caneta de Lula que
nasce, por exemplo, o Programa Luz para Todos que retira da escuridão
milhões de famílias pobres, em sua maioria negra e mestiça, e permite
que jovens negros e pobres ingressem na universidade. É da mesma caneta
de Lula que se impulsionam políticas para que a carteira de trabalho
deixe de ser um OVNI e passe a ser uma realidade que garanta direitos
sociais a mais de 10 milhões de trabalhadores e trabalhadoras,
provavelmente com uma maioria negra e mestiça. É daí também que vem a
força para eliminar a sub-documentação ou sub-registro de nascimento,
pela qual uma maioria esmagadora de negros era impedida da cidadania
plena, não tinha sequer certidão. Era barganha do coronelismo político
entrelaçado com a corrupção cartorial em períodos eleitorais. Não
nos esqueçamos da criação da Secretaria para a Igualdade Racial, da
sanção da lei obrigando o ensino da história da África, da política de
cotas para negros, índios e pobres, da presença de ministros negros
etc. Todos, decorrentes de critérios de Lula.
Almirante Negro
14. Para fechar lacunas históricas,
Lula foi pessoalmente à solenidade de instalação da estátua do
Almirante Negro João Cãndido “nas pedras pisadas do cais” na Praça XV,
no Rio de Janeiro. A estátua estava inexplicavelmente guardada, havia
mais de ano, num depósito da Marinha, que até hoje não tem almirantes
negros. A simbologia do gesto prolonga-se na inauguração do maior navio
petroleiro da estatal Transpetro, que a partir de agora também leva o
nome de João Cândido e inaugura um estaleiro em Pernambuco, permitindo
que trabalhadores negros que eram escravos da sazonalidade da cana, ou
da casualidade dos caranguejos, agora tenham carteira assinada, objeto
que as políticas neoliberais da dupla FHC-Serra queriam relegar ao
museu de objetos inúteis. A criação da Universidade da África, na
cidade de Redenção, a primeira a eliminar o escravagismo no Brasil, vai
fortalecer os mecanismos de aplicação de uma política externa voltada
para a solidariedade com a África, com a enorme qualidade de ser uma
universidade estatal, com metade de alunos brasileiros e metade de
africanos, que já não mais virão ao Brasil nem para o canavial, nem
para o sub-emprego nas favelas. Como continuidade a esta solidariedade
concreta está a instalação de unidades da Embrapa em solo africano, tal
como também está instalada na Venezuela e em Cuba.
15. Fica a dúvida se terá sido justa a
crítica à escolha de Lula justamente no momento em que o Brasil firma
convênio com Cuba para, juntos, os dois países serem responsáveis pela
reconstrução do sistema de saúde da negra ilha do Haiti? Sem contar os
300 milhões de reais, as retroescavadeiras, os hospitais, os médicos
militares, engenheiros, as máquinas e os medicamentos, a construção de
fossas e cisternas, o envio de sementes, equipamentos agrícolas e
processadoras de castanhas que o Brasil já enviou para lá. Sem contar
que foi lá nesta ilha da primeira República Negra da América em que a
branca Zilda Arns regou com o próprio sangue o último capítulo de sua
bela a história da solidariedade, escrita ininterruptamente a longo da
vida inteira. E também os 18 militares brasileiros, negros e brancos,
que lá deixaram suas vidas debitadas à causa da solidariedade com um
povo sofrido. O que faz jus à declaração de Fidel Castro: “Prefiro
soldados brasileiros no Haiti a mariners dos EUA”. A TV Brasil, com o
seu bom Conselho Curador, suas audiências públicas, fez a diferença
também com uma cobertura mais generosa sobre nossa presença na ilha
caribenha, faltando agora descrever como se desenrola a nova cooperação
com Cuba.
A solidariedade é a ternura entre os povos
Registro o gesto bonito da Universidade
Católica de Brasília, que coletou e doou para o Haiti uma expressiva
quantidade de radinhos de pilha, tão úteis para uma população sem
eletricidade, morando em barracas e carente de informações relevantes.
Vi que a TV Brasil deu importante cobertura sobre o terremoto haitiano,
muito embora tenha tido dificuldades jornalísticas para mostrar a
presença de uma brigada de mais de 600 médicos cubanos que lá estava
muito antes de a terra tremer, pois o terremoto social vem ocorrendo há
décadas, e tem sido agravado pelas políticas do negro Obama.
16. A crítica sobre suposta incorreção
dos critérios que Lula usou para a escolha dos conselheiros da EBC
também parece confrontar-se e apequenar-se com os critérios que Lula
utilizou para firmar convênio entre Brasil-Cuba e Timor Leste. Por ele,
estudantes timorenses que estudam medicina gratuitamente em Cuba, ao
formarem-se farão estágio no Instituto Oswaldo Cruz , no Brasil, antes
de retornarem à terra maubere. Em Díli, o embaixador de Obama
pressionou o presidente Ramos-Horta, do Timor, a não receber os 400
médicos cubanos que lá estão prestando solidariedade até que sejam
formados os médicos timorenses na ilha. Lula, com seus bons critérios,
incluiu a presença solidária do Brasil nesta operação de larga
distância que une continentes, mas, sobretudo, de imensa profundidade
humana.
17. Finalmente, permanece a dúvida se a
crítica à escolha de Lula estaria embasada na crença de que somente
negros podem levar adiante e de modo eficiente, com toda a plenitude, a
luta contra o racismo institucional. Como vimos pela variedade de
exemplos, a tese carece de confirmação. Desde os ensinamentos de nossa
história que registra uma luta abolicionista com intensa participação
de cidadãos de pele branca, entre eles Joaquim Nabuco ou o General
Abreu e Lima. Este, além de ter acolhido e protegido quilombos em
terras de sua família em Pernambuco, depois, ao lutar na Venezuela ao
lado de Bolívar, também promoveu, na ponta de fuzil, a luta contra o
escravagismo. E Chiquinha Gonzaga?
Princesa Diana contra as minas terrestres em Angola
18. Do mesmo modo, negros também
demonstraram captura pelas ideologias mais reacionárias. Além do citado
terrorista Savimbi, capataz do apartheid, temos também a negra de
orientação nazista Condolezza Rice, que deixou um rastro de cadáveres e
de sangue de cidadãos de várias cores mundo afora com a sua política
externa em nome da indústria bélica. Ou o general negro-fascista Colin
Powell , responsável pela mais sanguinária e criminosa mentira deste
século até o momento – a de que havia armas de destruição em massa no
Iraque –, pretexto para o aniquilamento de mais de 1 milhão de vidas
naquele país por meio da invasão estadunidense.
19. Brancos são capazes de gestos
rigorosamente necessários e grandiosos, como o da princesa Diana, que
teve a coragem de enfrentar a indústria armamentista e ir a Angola –
onde não foi a solidariedade do movimento negro brasileiro – para
associar sua imagem à luta contra as minas terrestres que por décadas e
décadas irão mutilar crianças da terra do poeta Agostinho Neto. Não
estranha a campanha de destruição de imagem que a princesa sofreu após
este gesto, até o seu misterioso acidente. Se além de combater minas
terrestres, Diana também parisse um filho de um árabe…
A literatura revolucionária de Pepetela
20. Foi Pepetela, o escritor que tinha
numa mão um fuzil e na outra uma caneta, que legou à literatura
africana a preciosa obra Mayombe, que conta a história da luta
guerrilheira de libertação de Angola. Assim como é o próprio Pepetela
que descreve em Predadores, o amargo percurso de parcelas da liderança
negra angolana pós-Agostinho Neto pelos corredores fétidos da
corrupção. Dois livros magistrais da literatura africana que o nosso
Ministério da Cultura deveria editar e distribuir aos milhões, assim
como faz o presidente negro da Venezuela com o livro Contos, do mulato
Machado de Assis, com tiragem de 300 mil exemplares – nunca registrada
no Brasil – , distribuído gratuitamente junto com o Dom Quixote, de
Miguel de Cervantes, este com tiragem de 1 milhão de exemplares.
Detalhe, Pepetela, guerrilheiro do MPLA e maior escritor angolano, é
branco.
21. Em outro artigo, pode ser útil
prestar atenção ao processo de degeneração da direção do CNA na África
do Sul no período pós-apartheid, quando surge uma burguesia negra, cuja
única diferença sobre a crueldade e ganância praticadas por outras
burguesias está na cor da pele negra. Ou sobre a natureza da cor e da
ideologia da exploração da burguesia negra do Senegal sobre a classe
trabalhadora senegalesa. Ou sobre entidades que levantam bandeiras
contra o racismo espelhando-se em modelos dos EUA, mas calam-se diante
da opressão que esta sociedade espalha pelo mundo e do desprezo com que
tratam seus cidadãos mais pobres, negros atirados nas prisões, ou
tangidos para o narcotráfico, ou mercenários escalados para matar nas
mais de mil bases que o imperialismo montou mundo afora. Ou sobre
entidades que defendem a democracia na comunicação aqui mas são
subvencionadas por agências do governo dos EUA ou a eles ligadas e
calam-se sobre a mais sofisticada ditadura midiática localizada
exatamente naquele país, que também tenta impor um apagão
informativo-cultural mundial, sufocando e destruindo outras culturas em
escala planetária.
Negros na Casa Branca e no corredor da morte
22. Portanto, que diferenças há entre o
negro Obama que está na Casa Branca e o negro Mumia Abu Jamal que está
no corredor da morte, ambos igualados pela cor da pele? A posição que
assumem na luta de classes, a escolha que fazem do terreno da história
que querem atuar, a ideologia que assumem para se comportarem no mundo.
O primeiro ordenando bombardeios aos pobres da terra. O segundo
escrevendo com o coração na mão, com a consciência limpa em defesa dos
pobres da terra, corajoso e sem dobrar a espinha, embora esteja há
poucos metros da cadeira elétrica. Vai deixando suas crônicas
inapagáveis de amor à humanidade, à vida, enquanto o negro da Casa
Branca que pode, como uma caneta, liberar Múmia Abu-Jamal, libertar os
cinco cubanos ilegalmente presos nos EUA, retirar a base de Guantánamo
de Cuba, mostra não ter estatura para ser Prêmio Nobel da Paz. Prova
disso é que usa a caneta para se preparar, com sanções, a acender as
chamas para incenerar o bravo e valente povo persa. Enquanto Lula usa a
caneta que pouco pode usar quando criança para propor ao Congresso o
envio de ajuda para a reconstrução de Gaza, demolida com apoio de
Obama, e fazer do Brasil um mensageiro da paz perante o mundo.
***
Em Tempo – Como também fui indicado
para o processo de seleção para compor o Conselho Curador da Empresa
Brasil de Comunicação e não fui escolhido pela caneta de Lula, quero
deixar pública minha solidariedade ao presidente quando recebe uma
crítica tão injusta. Não me sinto de nenhum modo preterido. Ao
contrário, dou fé da legitimidade democrática da escolha marcada por um
presidente que obteve 63 milhões de votos. E sinto-me rigorosamente
contemplado pelos progressos da TV Brasil aqui mencionados e trabalho
para que vá muito mais longe na realização de uma justiça televisiva,
malgrado as contradições e limites a superar. Sinto-me contemplado,
também, pelos conselheiros escolhidos; compartilho o progresso dos
outros, que não é progresso alheio, porque, como escreveu um filósofo
barbudo, “nada do que é humano me é alheio” Ou como canta Labordeta,
“también será posible, que esta hermosa manaña, ni yo, ni tu, ni otros,
la lleguemos a ver, pero hay que empujar-la, para que pueda ser”.