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Trabalhadores
Utopia, realidade, e a utopia que vira realidade

Por Alan Tygel
Publicado em http://cirandas.net/alantygel

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra. A luta pela reforma agrária, por uma vida digna no campo e na cidade, por alimentos saudáveis, por respeito à Natureza, igualdade de gêneros, por uma educação popular, e finalmente pela construção de uma sociedade em que o povo seja soberano, todas estas lutas compõem a pauta do MST. Temido pela burguesia agrária e pelo agronegócio, bombardeado pela mídia, criminalizado por governos e judiciários oligárquicos, segue ocupando latifúndios e lutando por terra para quem precisa.

As dificuldades existem. Quem mora num acampamento ou assentamento, ou já visitou um deles, sabe que os problemas não são poucos. Vão desde aqueles causados pelo modelo de assentamento, feito para dar errado, promessas não cumpridas dos governos, dívidas no bancos, até problemas de relacionamento interno, lideranças corruptas ou venda irregular de lotes.

Felizmente, existem muitos lugares onde a utopia do MST virou realidade. Assentamentos modelo, o trabalho em mutirão, as cooperativas de produção agroecológica, exemplos não faltam. O mais notável deles, sem dúvida alguma*, é a Escola Nacional Florestan Fernandes.

No último sábado (8/5/2010) participei de uma visita à Escola, organizada pela Associação dos Amigos da ENFF. Foi a segunda experiência concreta de contato com o movimento que tive, após o EIVI. Nos assentamentos da Bahia, transitei entre utopia e realidade. Desta vez, em Guararema (SP), conheci a utopia que virou realidade.

A Escola tem como objetivo formar lideranças e ser um espaço de troca de experiências não só entre membros do MST, mas de diversos movimentos sociais brasileiros, latino-americanos e africanos, procurando resgatar o sentido internacionalista da luta. Os cursos contemplam as áreas como Sociologia Rural, Economia Política da Agricultura, Conjuntura Internacional, Educação do Campo e Estudos Latino-americanos.

A própria construção da ENFF já foi em si um belo processo de educação. Mais de mil trabalhadores de brigadas de todo o país participaram da obra, doando mãos, cérebros e suor por esta causa. Enquanto trabalhavam, se alfabetizavam ou continuavam os estudos formais, e aprendiam técnicas de construção civil. Seus nomes estão espalhados pela escola, e muitos deles foram educandos em cursos da ENFF. Foi uma construção no sentido mais amplo possível da palavra.

A escola é mantida no dia a dia por cerca de 35 trabalhadores fixos, além dos educandos, que obviamente colaboram nas tarefas. Uma creche (Ciranda Saci Pererê) foi construída para abrigar os filhos dos moradores e para que mães possam trazer seus filhos enquanto participam dos cursos.

As instalações da escola incluem ainda o auditório Patativa do Assaré, a plenária Rosa Luxemburgo, a biblioteca (informalmente Antônio Cândido, que participou da inauguração, mas não aceitou a homenagem), além de 3 salas de aula com capacidade para 200 pessoas e cadeiras dispostas em círculo, um refeitório, áreas de convivência e dormitórios.

Na área da escola existem plantações de hortaliças e frutas, que contribuem para o auto-sustento da escola, junto com as criações de galinhas, porcos, coelhos e de um tanque para criação de peixes. Uma míni-usina de óleo vegetal também está sendo implantada. O belíssimo campo de futebol ajuda na integração entre os educandos e também contribui na boa relação com a comunidade em torno da escola.

Segundo os coordenadores da ENFF, esta relação é de respeito mútuo. As crianças que moram na ENFF estudam nas escolas da região, onde uma clara e cruel disparidade surge: devido às péssimas condições das escolas municipais, as crianças da ENFF frequentemente têm um melhor desempenho, já que moram num ambiente culturalmente muito rico, além de possuírem uma infraestrutura acima da média região, inclusive com acesso à internet, coisa rara por lá. Contudo, as crianças da região frequentam a ENFF, jogam futebol e em breve será inaugurada uma sessão semanal de cinema para que estes laços se estreitem ainda mais.

Pelas paredes da Escola, se vê muita arte. Chamam a atenção as fotografias de Sebastião Salgado, do livro Terra. Este livro, que conta ainda com prefácio de José Saramago e versos de Chico Buarque, teve todos os direitos e recursos obtidos com a venda doados ao MST para o início das obras da ENFF. As fotos, que trazem a força característica de Salgado, mostram ocupações, assentamentos, marchas e funerais. O cotidiano do MST, retratado de modo nu e cru.

Para ajudar a manter a Escola, foi criada a Associação dos Amigos da ENFF, cujo objetivo é arrecadar fundos para cuidar desta iniciativa. Para saber mais informações sobre a Associação e sobre como se tornar sócio, clique aqui.

A ENFF é um espaço fundamental no fortalecimento dos movimentos sociais. Sua manutenção é vital para a formação política dos trabalhadores na luta por um outro modelo de sociedade. No entanto, o apoio à luta do MST vai além. A realidade do movimento é dura, as dificuldades são inúmeras e oportunidades de atuação não faltam.

A utopia existe. A realidade também. Transformar aquela nesta, multiplicar experiência da ENFF por 1000, este é desafio.

* Sem dúvida para mim, considerando meu limitado conhecimento sobre o Movimento.



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 NPC - Núcleo Piratininga de Comunicação * Arte: Cris Fernandes * Automação: Micro P@ge