Entrevistas
Um dia a mais, um dia mais forte - entrevista com um dos trabalhadores em greve da Vale do Canadá
Do blog Atingidos pela Vale: atingidospelavale.wordpress.com
"One day longer, one day stronger". Além da frase [Um dia a mais, um dia mais forte], a pazinha
dourada da foto é outro símbolo importante para os mineiros do Canadá que trabalham para a Vale.
Eles a carregam em uniformes e bolsas. Quando ela está virada para
baixo, significa que os trabalhadores estão na ativa em minas e fornos. Se estiver horizontalmente, é aviso de que algum companheiro tombou, vítima de
acidente de trabalho. Se as pazinhas estão de pé, quer dizer que os
trabalhadores estão em greve.
James West, de 38 anos, é um dos 3500 trabalhadores em greve há nove
meses no Canadá. Ele pertence ao sindicato USW e há oito anos opera um
forno da Vale Inco na cidade de Sudbury, a 400 quilômetros de Toronto.
Jamie participou do 1° Encontro Internacional dos Atingidos pela Vale.
Nesta entrevista, ele conta que a empresa tenta rebaixar direitos de
aposentadoria e remuneração dos trabalhadores.
Nesta semana vocês comemoraram o aniversário de nove meses de greve na empresa Vale Inco. Por qual motivo decidiram entrar em greve? JW: Optamos por entrar em greve porque a companhia argumentava que
nós não estávamos contribuindo suficientemente para os fundos de
pensão, ela queria que contribuíssemos diretamente. Só que, ao mesmo
tempo, a empresa se recusava a entregar detalhes de um possível futuro
contrato. Esse foi um abuso muito grande por parte da Vale.
Por causa da crise global que estourou em final de 2008, a Vale
achou oportuno tentar uma estratégia. Na época, muitas empresas
renegociaram contratos com os trabalhadores e empregados, já que
aparentemente a crise teria abalado os resultados dessas empresas. E a
Vale argumentou dessa mesma forma. Mas a Vale se diferencia das
empresas abaladas pela crise, que tiveram que pedir aos bancos novas
linhas de créditos, em um detalhe: Mesmo com a crise, a Vale lucrou!
Nossa opinião é de que a Vale fez o jogo do ¨eu também¨.
Daí os trabalhadores pensaram: se aceitarmos “ofertas”da Vale numa
situação como essa, de fazer muito lucro mesmo com a crise, o que
acontecerá com a gente se num cenário futuro a empresa tiver perdas?
Nosso sindicato tem mais de 100 anos de história e jamais tivemos uma
experiência de tanto desrespeito e agressividade.
E qual foi a reação da Vale em relação à greve de vocês? JW: Pensamos que a Vale, desde o início da crise, planejou demitir
os trabalhadores. Por ser uma empresa de capital aberto, com os ações
na bolsa de valores, a Vale achou que demitir poderia ser interpretado
pelo mercado como um erro da empresa e isso poderia abalar o valor de
suas ações. Mas com a greve, a empresa poderia argumentar que as
demissões são coisas de trabalho, culpa dos trabalhadores.
Caso a gente tivesse aceitado a ¨oferta¨ da Vale, a empresa também
teria ganhado também. Por isso, no começo da nossa luta, a Vale se
recusou a negociar. Demorou sete meses e meio para a Vale sentar na
mesa com gente. Daí passamos aos trabalhadores a decisão: votar a favor
ou contra a oferta da Vale. Houve, então, um plebiscito geral dos
trabalhadores. Mais de 90% dos trabalhadores optaram por não aceitar a
oferta. Podemos imaginar como a proposta da Vale era horrível.
Como as comunidades mineiras de Sudbury veem o fato da empresa Vale ser considerada no mundo uma empresa brasileira? JW: A Vale está tentando desclassificar nossa luta como racista,
como se odiássemos os brasileiros. Mas não é nada disso. A Vale é uma
empresa global. Atua de forma global, o lucro é global.
‘One Day Longer, One day stronger!’ – ‘Um dia a mais, um dia mais fortes!’ – o que significa esse grito de greve para vocês? JW: Nos anos noventa houve uma grande greve em West Virginia , nos
Estados Unidos, que durou 20 meses. Era uma greve dos trabalhadores do
aço. Esse também foi o grito de greve desses trabalhadores. Voltamos
com ele agora. O grito mostra que mesmo a greve estando mais difícil a
cada dia, isso quer dizer que a greve continua durando. Cada dia mais
difícil desse é mais uma dia de greve. Os trabalhadores em greve ficam
mais determinados na luta.
Depois de 9 meses de greve temos um bebê nascendo? JW: Faz alguns dias que não me comunico com meus companheiros no Canadá, mas a ideia era fazer um jantar comemorativo
dos nove meses de greve na esperança do bebê nascer. Antigamente, eu
era trabalhador preocupado somente com questões de segurança do
trabalho, para trabalharmos de forma digna. Hoje, depois desses meses
de greve e dessa viagem com a Caravana dos Atingidos pela Vale, aqui no
Brasil, eu não sou mais apenas um trabalhador. Eu aprendi muito e hoje
eu me tornei um trabalhador militante.
Trabalhamos duro, é um trabalho físico com muitos riscos. Eu
trabalho com lava quente e uma vez num acidente tudo explodiu perto de
mim, perto do meu corpo. Somos trabalhadores fortes. Mas o que eu vi em
algumas comunidades aqui no Brasil me fez chorar. Todo mundo vê, todo
mundo sabe o que acontece com as comunidades atingidas pela mineração.
O governo sabe, a Vale sabe, mas ninguém faz nada. É para chorar
mesmo. Não é que eu acredite que tudo possa ser resolvido amanhã.
Porém, gostaria que as pessoas se dessem conta e começassem a fazer
algo desde agora para essa situação mudar.
Núcleo
Piratininga
de Comunicação
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