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Entrevistas
Com Altair Guimarães, da Vila Autódromo: “A Ditadura não terminou”

Por Marianna Araujo e Marília Gonçalves
Observatório de Favelas

Na quinta entrevista da série especial “Qual é o futuro da favela?”, o presidente da Associação de Moradores de Vila Autódromo, Altair Guimarães, fala sobre o futuro das comunidades e o constante risco de remoção. A Vila Autódromo se localiza nas proximidades de algumas obras previstas para os Jogos Olímpicos.

No início do mês, foi divulgado que o projeto entregue ao Comitê Olímpico Internacional não apenas prevê a construção do Centro de Mídia e do Centro Olímpico de Treinamento no mesmo local onde está a comunidade, como simplesmente desconsiderou sua existência. No projeto, o local onde vivem centenas de famílias há pelo menos 40 anos, aparece como um imenso vazio.

Altair não vê possibilidades de um futuro melhor para as favelas sem luta popular. “Se não houver uma reação do povo, não tem melhoria”, afirma. Leia a entrevista completa.

Como foi a reunião com o prefeito no dia 03 de março para tratar da questão da remoção de Vila Autódromo?

Não foi como esperávamos, porque a gente tinha a esperança de conseguir fazer a prefeitura mudar de ideia em relação à remoção. O prefeito se mostrou muito frio e acabou jogando a responsabilidade para o seu antecessor, explicando que o projeto apresentado ao Comitê Olímpico Internacional é de 2007. E nesse projeto a comunidade não aparece. Tem também o fato de que, segundo ele, é exigência do Comitê que não existam favelas próximas aos equipamentos olímpicos. Nós tentamos argumentar que a comunidade podia ser beneficiada com as melhorias desses recursos usados para os Jogos e o Rio de Janeiro podia dar um exemplo para o resto do mundo. Nosso terreno é do Estado e não do município e o único serviço público que temos aqui é coleta de lixo. Falta asfalto e saneamento, por exemplo. A prefeitura podia oferecer tudo isso.

Qual foi encaminhamento dado a partir da reunião?

Ficou acordado que ele faria o envio do projeto para a defensoria pública e a defensoria, juntamente com alguns urbanistas que estão preocupados com essa questão, ia tentar encontrar uma solução para a remoção. Uma solução que inclua a comunidade no projeto. Só que o prefeito ainda não encaminhou o projeto. O que ele fez foi mandar uma secretária agendar outra reunião para o dia 13 de abril. O problema é que sem projeto não tem como negociar. Vamos conversar o que com ele? O que a gente vê é que a prefeitura não está interessada nessa negociação, ela quer levar adiante a remoção.

Por que a comunidade se recusa a aceitar a remoção? A prefeitura não ofereceu nenhum reembolso?

O esforço para nos remover é antigo e essa é uma luta histórica. Nós temos o título de posse dessas terras. O que a prefeitura oferece é um terreno em Vargem Grande e a construção de um condomínio. Eu já passei por duas desapropriações na minha vida e não vou aceitar mais uma, porque eu conheço a violência delas. O Estado chega abrindo buracos nas paredes, em casas que muitas vezes levamos um ano para construir um banheiro. Nós criamos vínculos, isso aqui é a história de cada família. É mais importante do que a terra em si. Aí vem a prefeitura e oferece um dos seus condomínios. Você sabe como são as casas que o governo dá?

Como?

Pois é, o último construído na Estrada dos Bandeirantes é de 2,50m x 15m. É um corredor, não uma casa. No programa “Minha casa, minha vida” do governo federal as casas têm 36m2. Aqui nós temos terrenos, que nos foram dados pelo governo do Estado, de até 11m x 36m. Nós estruturamos nossas famílias nessa área e fizemos nossas vidas. Os Jogos não podem servir para massacrar essa parte da população. Como pode? Ser bonito para o resto do mundo e um desastre para muitos brasileiros?

De que forma você vê o fato da sua comunidade não estar nos projetos para o Jogos Olímpicos (aparecer como um terreno vazio)?

É um sentimento de vergonha com relação ao meu país. Para a gente a ditadura não terminou, o pobre continua sendo massacrado. Quem não sofre mais é o rico. É tão vergonhoso que a gente fica sabendo através da mídia que nossas casas, aquilo que construímos, vai ser removido. Se não tomarmos consciência de que é preciso ir para a rua lutar, vão continuar nos massacrando.

Nós próximos dias ocorrerão o Fórum Social Urbano e o Fórum Urbano Mundial. A comunidade de Vila Autódromo pretende participar desses eventos voltados para discutir a urbanização na cidade?

Nós vamos estar presentes nos dois Fóruns. Vila Autódromo estará lá com suas faixas. Porque a mídia do Rio de Janeiro não dá espaço para a comunidade, já que ela não quer bater de frente com o governo. Ir aos espaços de debate é uma forma de mostrar para o resto da sociedade que os Jogos Olímpicos não são só a beleza que está na televisão, é também o sofrimento de uma parcela da população.

Dentro desse contexto de lutas, qual o futuro que você vê hoje para as favelas do Rio?

Eu acredito que se não tivermos uma mudança na política, que só funciona para a elite, o futuro será ruim. Só vai melhorar se o mundo acabar e começar de novo. Do jeito que está, com bandido e miliciano nas comunidades, mas também no governo, com essa política de truculência para o pobre, se não houver uma reação do povo, não tem melhoria.

Basta pensar no movimento que está sendo feito para amanhã, por conta dos royalties do petróleo. Só tem gente na rua porque a máquina pública e a mídia estão envolvidas. Você não vê nenhum estudante na rua porque tem seres humanos sendo tirados de suas casas. Isso é triste, vergonhoso.


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 NPC - Núcleo Piratininga de Comunicação * Arte: Cris Fernandes * Automação: Micro P@ge