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Por NPC
No Congresso Nacional existe o lobby da terra, do céu e do ar, diz Laurindo Leal

Por Daniel Hammes e Tatiana Lima

Laurindo Leal, ouvidor-geral da Empresa Brasil de Comunicação (EBC)e professor de comunicação da USP, fala, em entrevista, sobre a importância da regionalização da programação para a democracia e a cultura do país. Ele comentou ainda o papel da Confecom em se estimularem meios alternativos e populares de comunicação para que não se perpetue o pensamento único. E reforçou a ideia da comunicação como um direito humano fundamental, portanto de todos. Laurindo finalizou observando que existe, no Congresso Nacional, o lobby da terra, do céu e do ar. Confira a entrevista feita pelos jornalistas Daniel Hammes e Tatiana Lima, durante o 15° Curso Anual do NPC.

 

Durante a sua fala, você abordou a questão da diversidade no Brasil. Qual a importância da  cultura regional na programação midiatica?

Essa importância é fundamental. O Brasil é um país de dimensões continentais com uma diversidade cultural muito grande. Infelizmente os meios de comunicação, principalmente os eletrônicos, se concentraram no eixo Rio-São Paulo. Como essas emissoras foram organizadas em forma de redes regionais, com centralização nesse eixo, elas acabaram impondo para o Brasil um modelo de vida, de hábitos, gostos e costumes produzido nesse trecho Rio-São Paulo. Também acabam não abrindo espaço para as produções regionais, pelos contratos e convênios que mantêm com as emissoras afiliadas. Então só tem um jeito: estabelecer uma legislação que determine a obrigatoriedade de programações regionais, inclusive de acordo com a própria Constituição. Isso está na Constituição, mas não existe a lei. Tem um projeto de lei da ex-deputada Jandira Feghali que está no Congresso há mais de dez anos, porque as emissoras se negam a estabelecer as programações regionais, que é fundamental para a cultura e para a democracia do país.   

 

 

Você comentou que 98% das pessoas são informadas pelo Jornal Nacional, que tem uma visão bem conservadora de mundo. Qual o papel da Confecom em se apontar uma saída para isso?

Veja bem. A questão não é uma democratização desses meios que estão aí, porque eles são empresas comerciais, cujo objetivo final, primeiro e único é o lucro. Então tudo, toda a programação, inclusive jornalística, é subordinada aos interesses comerciais. Qual o papel da Conferência? Não é querer que a Globo mude sua linha. É estabelecer a legislação, exigindo que ela passe a oferecer um serviço de qualidade, mas não será possível mexer na estrutura da empresa. O que tem que se impulsionar é a criação de meios alternativos. O que não podemos ter é o que você acabou de falar: uma emissora sendo responsável pela informação de 98% da população. Em outros países há limites de abrangência dos canais de rádio e TV, da mídia em geral. Na Inglaterra, por exemplo, você tem um órgão regulador que não permite que nem a BBC passe dos 40%, justamente para evitar o monopólio. Aqui não! Você ultrapassa os 90%, e fica tudo por isso mesmo. Quer dizer, você cria e enraíza, através da comunicação, o pensamento único no país. Então a Confecom tem que criar mecanismos para levar ao Congresso medidas para impedir essa forma de monopólio que existe no Brasil.

 

 

Você citou que, no blecaute, a saída foram os rádios de pilha. Como você vê o papel das rádios comunitárias nessa difusão de informações?

Eu acho também fundamental esse papel, mas é preciso ter cuidado com o que se chama de rádios comunitárias. Nós temos infelizmente a apropriação de algumas frequências por políticos, que transformam essas rádios ditas comunitárias em palanques. Há também os interesses comerciais, os interesses religiosos... Então eu acho também que tem que se fazer uma separação entre o joio e o trigo, e definir mais claramente o papel das rádios comunitárias, que é exatamente o de dar voz às comunidades. Elas têm que ter esse princípio de atender ao coletivo, e não aquele que ganhou a concessão ou o que opera a rádio. Bem, isso vale para a comunicação como um todo. As pessoas conseguem a concessão, e querem fazer com que sirva ao seu interesse. A comunicação tem que atender ao interesse do público, e não de quem controla a emissora.

 

Sabemos que a comunicação é um direito...

Isso. A comunicação tem que ser entendida como direito humano, como a saúde, a educação, a habitação... Por que é um direito? Porque todos os cidadãos têm voz. A palavra é posse de quem a detém, não do outro, que dá a oportunidade de que ela fale ou não. Hoje a palavra de cada um de nós só irradia se passar pelo filtro dos meios de comunicação de massa, que filtram de acordo cm seus interesses. Então tem que haver critérios para que a palavra seja socializada. Para que haja  a possibilidade de todos colocarem suas ideias, valores e preocupações. Esse é um direito humano que faz com que a pessoa se torne cidadão de primeira categoria. Porque aqueles que têm menos possibilidade de transmitir suas informações acabam transitando na sociedade como cidadão de segunda categoria, porque tem menos possibilidade de entender e de se mover nesse mundo cada vez mais complexo. Então a comunicação tem que ser vista como um direito de todos os cidadãos.

 

Você também fala sobre a questão da terra, do céu, e do ar no Congresso...

Essa é uma imagem que eu costumo fazer, porque os lobbys no Congresso Nacional da radiodifusão são poderosíssimos. As comissões que discutem renovações quase não se reúnem. Quando existe a proposta de uma Audiência Pública para se discutir a renovação da Globo, por exemplo, ela é imediatamente derrotada. Então há um lobby muito forte! Muitos concessionários são parlamentares, o que é um absurdo no Brasil. Então essa foi uma imagem que eu criei: a de que existem no Congresso esses três grandes lobbys: o da terra, que é o dos latifundiários, que criminalizam o MST e toda proposta séria de Reforma Agrária no Brasil. Tem o do céu, que é o dos religiosos em geral que inclusive também dominam a comunicação. E, finalmente, o lobby do ar, que é o dos radiodifusores em geral.

 

 

E a construção da Empresa Brasil de Comunicação tem sofrido algum ataque do ar, do céu e da terra?

Nós tivemos na TV Brasil uns ataques sérios recentemente, quando a Folha de São Paulo, por exemplo, publicou um editorial pedindo o fechamento da emissora. Existe, sem dúvida alguma, uma animosidade. Por enquanto, a TV Brasil ainda não tem forte presença nacional, por motivos técnicos. Hoje o canal aberto mesmo que funciona é no Rio, Brasília e em São Luis do Maranhão. Então ainda não tem presença forte no contexto nacional. Na hora que tiver, o bombardeio será feroz. A gente tem que se preparar mais! Sou defensor da ideia de se formarem grupos de apoio à TV Brasil. A sociedade, entendendo o papel e a importância que ela tem, deve começar a se organizar para defendê-la, porque as ameaças já começaram a surgir. Ainda são pequenas, mas, à medida que forem crescendo,  a campanha contra certamente será maior.

 

E qual é a perspectiva desse crescimento?

Eu gostaria que fosse mais rápido. Acho que o grande entrave é ela não estar presente nas grandes cidades. Aí esse é um debate político. Acho que deve haver uma ação do Governo mais forte, no sentido de abrir concessões e colocar a  TV Brasil em todo o país. Acho uma incoerência você pensar que quem mora no Rio Grande do Sul ou em São Paulo paga imposto, mantém a TV Brasil, e no entanto não recebe esse serviço. Acho que essa é uma decisão política que precisa ser enfrentada. É problemática, porque em São Paulo o espectro está praticamente todo ocupado. Mas há brechas para abrir espaços, e essa brecha requer essa ação política que precisa ser feita.


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 NPC - Núcleo Piratininga de Comunicação * Arte: Cris Fernandes * Automação: Micro P@ge