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Direitos Humanos
Moradores da Vila Autódromo permanecem unidos contra perigo de despejo pela Prefeitura do Rio

Por Sheila Jacob

A comunidade da Vila Autódromo existe há mais de 40 anos. Localizada na Barra da Tijuca, bairro nobre da Zona Oeste do município do Rio, hoje possui mais de quatro mil moradores, a maioria antigos no local. “Muitos nasceram aqui, tiveram filhos e hoje estão tendo netos na comunidade” lembrou Sandra, em depoimento na assembleia realizada no dia 18 de novembro. A causa desse e de outros encontros que estão ocorrendo regularmente é a mobilização de moradores e moradoras devido ao anúncio de remoção da comunidade feito pelo prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PMDB), em coletiva de imprensa. A causa para o despejo é a construção do Centro de Mídia e outras obras previstas para a realização dos Jogos Olímpicos em 2016.

Em entrevista para o jornal comunitário O Cidadão, da Maré, a assessoria de comunicação da Prefeitura do Rio afirmou seu posicionamento em relação à remoção de algumas comunidades, principalmente as que se encontram em torno das vias expressas, nas zonas Sul e Oeste da cidade. Apesar de ainda não ter entrado em contato com a comunidade, a página do Plano Diretor do Município (http://spl.camara.rj.gov.br/planodiretor/rio2016plano.htm), em “Prioridades para a habitação”, já mostra a previsão de reassentamento para as seguintes comunidades: Vila Autódromo, Canal do Anil, Gardênia Azul e Parque da Panela. 

A advogada Maria Lúcia Pontes, do Núcleo de Terras e Habitação da Defensoria Pública do Rio, tem acompanhado as reuniões, que ocorrem a cada duas semanas para mobilizar a comunidade. A ideia da última assembleia, no dia 18, foi esclarecer as dúvidas e saber as expectativas dos moradores, por sugestão de Maria Lúcia. “Como defensora pública, farei a melhor defesa técnica possível para ganhar o processo judicial. Mas sabemos que, além dele, existe um processo político que existe há mais de dez anos para tentar tirar vocês daqui. Precisamos saber o que vocês querem para, a partir disso, pensar em estratégias de defesa”, disse Maria Lúcia a todos os presentes. Ela esclareceu ainda que, mesmo que uma decisão judicial seja ruim, é possível derrubar essa decisão. Isso se a comunidade estiver mobilizada.

Os defensores públicos Alexandre Mendes e Eliete Jardim também estiveram presentes, assim como a ex-presidente do Iterj, Célia Ravera. Ela lembrou que já acompanha a comunidade há muitos anos “sem precisar marcar audiência”, fez questão de destacar, e inclusive lutou pelos títulos para os moradores para garantir o direito de ficar no local. Para ela, a questão não é querer ficar, mas sim ter o direito de permanecer. “O título entregue para os moradores, a ‘concessão real de uso’, dá proteção à família que está no local, o que é muito ruim à especulação imobiliária. Por isso há a tentativa de esvaziar esse instrumento. O problema é que acham que o trabalhador pobre pode ser enganado com indenizações, por não conhecer seus direitos”. Ela sugeriu que todos lutem por um título de concessão de uso, como tentativa de garantir que ninguém seja retirado.
 

Moradores perguntam e defensores públicos esclarecem

“Sou morador antigo, vim para cá há mais de 30 anos. Construí minha moradia, ajudei na administração da comunidade, fiz o melhor possível desde que cheguei. Quero permanecer aqui, junto com quem pensa da mesma maneira”. Esse foi o depoimento emocionado de Antônio Jesus, um dos presentes na assembleia. Após certa hesitação inicial, outros presentes assumiram o microfone. Disseram quais eram suas dúvidas e fizeram coro com Antônio, reafirmando a vontade de permanecer na Vila Autódromo. Ao serem questionados por uma moradora, Jocilene, se queriam continuar na comunidade, todos e todas levantaram as mãos, mostrando que não têm interesse em receber pensão pela moradia, nem pela inscrição no projeto “Minha Casa, Minha Vida”.

Muitos presentes fizeram perguntas em relação às condições de reassentamento. Como o defensor Alexandre Mendes esclareceu, geralmente as famílias são reassentadas para imóveis de cerca de 40m2. Ele disse ainda que a legislação garante indenização ou complementação em relação ao imóvel anterior. Mas, mesmo assim, ele fez questão de sublinhar que a mobilização deve ser pela permanência no local, já que “existe o direito à não remoção previsto na lei orgânica do município. Essa tem que ser a ideia principal: continuar aqui”. O defensor disse ainda que existe um outro documento jurídico produzido pela ONU que garante uma série de condições melhores do que a realidade de hoje. “Por exemplo: o reassentamento tem que ser discutido com a comunidade, e ela tem que aceitar previamente para onde vai”. Como observou a defensora Eliete Jardim, esse documento garante também que as novas casas têm que ser iguais ou melhores que aquelas em que as pessoas já viviam. Mas, como ela reconhece, isso é previsto por um documento internacional, e é muito difícil fazer os governos cumprirem isso no Brasil. “Mas o direito existe, está lá”.

Mendes comentou ainda o fato de a Vila Autódromo não ser mais considerada área especial de interesse social. “Esse é um fato grave, porque a comunidade é titulada e houve processo de regularização fundiária. Isso aconteceu em uma votação recente na Câmara dos Deputados que ninguém ficou sabendo”. O defensor esclareceu que isso não significa, entretanto, que certamente haverá remoção. “O que ocorre é um enfraquecimento, mas isso não garante o direito de o município remover a comunidade”, concluiu.

Eliete Jardim concorda com Mendes, e acha que a mobilização tem que ser no sentido de ficar. Caso não seja possível, aí sim devem ser discutidas as condições de reassentamento e as indenizações. A defensora esclareceu que a Constituição Brasileira e outras leis permitem a tomada da propriedade em caso de utilidade pública ou por interesse social. “Mas isso só é possível ou com acordo prévio com o proprietário, ou então através de um processo judicial para discutir o valor pago, determinado ao final pelo juiz. O poder público só pode tomar a comunidade após essas medidas”.


Para presidente do MUP, mídia comercial não mostra o lado perverso das Olimpíadas

Durante a assembleia do dia 18 de novembro foi festejado o aniversário de sete anos do Movimento União Popular, criado justamente pela luta dos direitos da população mais pobre, inclusive o de moradia. O presidente do Movimento, Maurício Braga, lembrou o apoio da mídia comercial à realização das Olimpíadas no Rio, sem ouvir, entretanto, os moradores das comunidades ameaçadas. “Hoje, boa parte do Brasil está batendo palmas porque o Rio de Janeiro será sede das Olimpíadas. Isso está na mídia, já circula o mundo todo essa informação. Pelo que dizem, parece que vai ser bom para todos e todas, vai gerar empregos, melhorar a economia etc. Essa é a informação geral”, indignou-se Braga.

Como ele observa, ao silenciar os moradores em situação de ameaça de despejo, a imprensa empresarial garante o apoio da opinião pública à Prefeitura e ao Governo do Estado. “Essa mídia, que só divulga o lado positivo, não fala sobre a violência que vai acontecer aqui na favela. Por quê? Porque eles não estão do nosso lado. Estão do lado do poder econômico, que circula por causa dos Jogos Olímpicos. Temos que denunciar essa situação, e mostrar que as celebrações pelas Olimpíadas escondem um processo perverso de despejo. É isso que o povo não sabe”, concluiu.

Na mesma semana da Assembleia do dia 18 foi feita uma reunião com o secretário estadual de habitação, Leonardo Picciani, e também com o presidente do Instituto de Terras e Cartografia do Estado do Rio de Janeiro (ITERJ), Leonardo Azeredo dos Santos. De acordo com o presidente da Associação de Moradores da Vila Autódromo, Altair Guimarães, o Instituto reafirmou estar do lado da Vila Autódromo, juntamente com a Defensoria Pública. Está marcada uma visita de ambos à comunidade para o dia 28 de novembro, para discutir nova titularização.


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 NPC - Núcleo Piratininga de Comunicação * Arte: Cris Fernandes * Automação: Micro P@ge