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Memria - Golpe de 64
A mídia e o Golpe de 64

Do Boletim NPC nº 39 - De 4 a 12.04.2004


Maria da Conceição Tavares, em artigo na Folha de S.Paulo de 29/3 deste ano cita “os célebres editoriais do Correio da Manhã e do Jornal do Brasil de 30 de março de 1964: - Chega! Basta! – eram apenas o registro do acordo final. Dias antes, Carlos Heitor Cony havia afirmado com todas as letras, no mesmo jornal, que antes do golpe de 64 todos os jornais do país, menos o carioca Última Hora, eram a favor do golpe.

É importante destacar este fato para reforçar a visão de que o golpe que implantou a ditadura não foi só militar. Ao contrário. Foi civil-militar. Ou seja, o pensamento hegemônico na época era a favor do golpe. Este pensamento foi construído com um intensíssimo trabalho de formação e propaganda política encabeçada pelo Instituto de Pesquisa e Estudos Sócio-econômicos (IPES). Este instituto foi o grande articulador e formador de opinião pública pró-ditadura. Produziu milhões de exemplares de livros, influenciava centenas de jornais, programas de rádio e TV. Produzia cartilhas, panfletos, jornais aos milhões e promovia milhares de conferências. Tudo para levantar o espantalho do “comunismo ateu” que estaria prestes a tomar conta do Brasil.

E por falar em mídia, o IPES, de 62 a 64, produziu dezenas de filmes com duração de 10 minutos no máximo cada um, para fazer projetar nas mais de 3000 salas do país. Estes filmetes, muito bem feitos, eram outra grande arma para condicionar milhões de cabeças sobre a necessidade do golpe.

E depois de tudo isso, hoje, vêm doutores de história dizer que o golpe foi um “contra-golpe”, foi um “golpe preventivo” para evitar que a esquerda desse seu golpe contra a sociedade.

Este golpe estava sendo programado nos quartéis, na Embaixada Americana, nas organizações empresariais, na maioria das igrejas com padres reacionários, nos aparelhões controlados pela burguesia, como o Sesi, o Sesc, o Senac, nas rádios e televisões e na imprensa.

Por isso, outra grande mentira, que o golpe veio como reação e prevenção contra um possível golpe de esquerda só serve para justificar o golpe. Para absolver a ditadura que este implementou. E serve para tranqüilizar consciências de arrependidos que precisam dizer que “tanto faz, tanto fez... era tudo igual. Direita e esquerda se igualavam”. (Por Vito Giannotti) 

O Globo e toda a direita tentam salvar sua pele

Os anos passam e a memória se esmaece. Nesse embalo fica fácil embaralhar as cartas e falsificar a história. O Globo de 23 de março é um belo exemplo dessa manobra: “Disposição golpista da esquerda divide opiniões”. Taí o fato consumado. Para O Globo não há mais dúvidas. A disposição golpista é real, a ponto de se dividir opiniões.

Na intelectualidade carioca está ganhando corpo uma interpretação do golpe que é falsa e ideologicamente dirigida. Vejamos só o enunciado de um discurso que seria longo demais para esse boletim.

Primeiro: o golpe da direita já estava sendo preparado desde maio de 1954. Foi tentado em agosto antes e depois da morte de Vargas. Foi retomado antes da posse de Juscelino, em 1955, e na renúncia de Jânio Quadros, em 1961. Inicialmente foi articulado, com decisão total, a partir da fundação do IPES, em 1962. Ou seja, o golpe da direita não foi para evitar um fantasioso golpe da esquerda. A direita estava decididíssima a acabar com a democracia para, no discurso histérico da época, acabar com o perigo comunista.

Segundo: Quem hoje quer inventar que a esquerda estava preparando o golpe está mentindo descaradamente. O PCB, única força real de esquerda com inserção nacional, não preparava nenhuma revolução socialista desde 1948. Seu sonho era uma chamada revolução democrática-burguesa, liderada pela burguesia nacional. Não havia projeto nenhum de tomada de poder. Além do mais, o equilíbrio mundial implantado desde os acordos de Ialta não admitia esta hipótese.

Afinal não havia nenhuma ameaça de golpe pela esquerda. Havia uma mobilização popular parcial para exigir mudanças mínimas, como as reformas de base. E havia muitos discursos vazios, muitas “bravatas”, como se diz hoje, no campo da esquerda.

Terceiro: A distorção histórica de quem quer plantar a idéia que o golpe militar foi um contra-golpe, ou, como dizem, um “golpe preventivo” quer fazer esquecer que a esquerda que, dizem eles, iria dar este tal golpe, estava tão longe disto que quando o golpe militar veio, não reagiu. Que esquerda pronta para dar o golpe era esta, se quando a direita veio com seus tanques, não teve um só tiro. Esta esquerda, que os que hoje falam golpe preventivo, estaria pronta para implantar seu regime, não matou um só mosquito. Não deu um tiro de festim sequer. Cadê o perigo da esquerda que exigiu um “golpe preventivo?”

Para quem, como O Globo e a imensa maioria da mídia apoiou o golpe militar, a tentativa em curso, hoje, é se limpar dizendo que “somos todos iguais”. Ou a direita dava o golpe, ou a esquerda daria.

E para os que já foram de esquerda, e hoje estão arrependidos, esta teoria do golpe de direita para se prevenir de um golpe de esquerda, serve para justificar sua mudança de posição. Para poder dormir em paz na cama do neoliberalismo dominante. (Por Vito Giannotti)

Golpe de 64. O projeto de nação que passou na TV

ASegundo informa Aydano André Motta, na edição de 28/03 de O Globo,  a execução da estratégia de propaganda dos governos militares estava a cargo da Aerp (Assessoria Especial de Relações Públicas), órgão ligado à Presidência da República e criado especialmente para formular as peças publicitárias do regime. “A Aerp é obra do então coronel (hoje general da reserva) Octávio Costa, elogiada até hoje por publicitários consagrados. Quem tem mais de 35 não se esquece, por exemplo, do Sujismundo, estrela da campanha “Povo desenvolvido é povo limpo”. Ou do magistral jingle “Marcas do que se foi” (“Marcas do que se foi/ Sonhos que vamos ter/ Como todo dia nasce/ Novo em cada amanhecer”). 

— A idéia de vender a noção de cidadania, melhorar a auto-estima da população, sem a chancela do governo, é moderníssima. Tem que se tirar o chapéu, porque foi a única coisa que os governos do golpe fizeram de realmente eficiente — diz Lula Vieira, presidente da V&S Comunicações, que trabalhou na produção de dez filmes. — Não eram como hoje, com chapa-branca da marca no fim. Transmitia-se uma idéia apenas. 

No mesmo texto, o jornalista Aydano informa que o coronel Octavio Costa criou a Aerp após ganhar um espaço de dez minutos diários em rádios e TVs. “Somente entre 1970 e 1973 foram produzidos 191 filmetes com um minuto de duração cada e 205 comerciais de rádio, o grande meio de comunicação da época.”


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 NPC - Núcleo Piratininga de Comunicação * Arte: Cris Fernandes * Automação: Micro P@ge