Entrevistas
Meus filhos vão continuar na escola do acampamento
Publicado na Agência Chasque de Notícias 09/04/2009
A polêmica sobre o fechamento das escolas em acampamentos sem terra
gaúchos ficou marcada pela resistência de pais e mães, que se negaram a
transferir seus filhos para a rede pública convencional. Dorildes
Terezinha da Silva é uma dessas mães. Morando há dois anos no
Acampamento Jair Antônio da Costa, na cidade de Nova Santa Rita (RS),
na região metropolitana, Dorildes aprova o ensino dado na escola
itinerante a seus três filhos.
Em entrevista, a sem terra afirma que não vê problema no fato das
crianças aprenderem sobre seus direitos e a lutarem por eles. Ela
também garante que irá manter seus filhos na escola itinerante, assim
como os demais pais.
Por que decidiste acampar? Eu morei uns 20 anos em São Leopoldo (Vale dos Sinos - RS). Aí fiquei
desempregada, meu marido, que trabalhava por conta, também estava
difícil. Nos mudamos para o Paraná onde ficamos um ano e não deu certo.
Voltamos para Sapiranga (RS), onde ficamos um ano e tivemos
conhecimento do acampamento sem terra em Nova Santa Rita (RS). Como já
tínhamos vendido tudo e estávamos morando e aluguel, em uma situação
muito difícil, decidimos ir acampar.
O que tu achas da escola itinerante? Bom, os meus filhos estão estudando lá há 2 anos. Não tenho o que me
queixar porque eles estudam. Pra nós, acampados, fica até mais fácil
porque a gente fica com eles mais perto, estão aprendendo a conviver em
comunidade. Lá fora [do acampamento] é cada um por si, a gente tinha
que levar e buscar na escola. Lá fora está muito difícil mesmo, a gente
sabe que no momento em que saem do pátio estão correndo perigo de todas
as formas. No acampamento fica mais fácil porque estamos ali com eles,
vemos com quem estão convivendo, que tipo de convivência. Estamos ali
lado a lado vendo o que eles estão aprendendo. Pra mim é ótimo. Não é
como dizem alguns, de que eles não estariam aprendendo algumas
matérias. Eles aprendem sim. E mais ainda, eles aprendem a lidar com a
terra, como irão sobreviver em cima da terra. Já desde pequenininho
aprendem a fazer hortas, por exemplo.
Um dos argumentos do Procurador Gilberto Thums para fechar as escolas é de que elas seriam ideológicas. Concordas com isso? O que eles [crianças] aprendem ali é lutar pelos direitos deles. Todos
nós estamos aprendendo a lutar por uma vida mais digna, por lutar por
um pedaço de chão, pela liberdade. As crianças aprendem a lutar pelo
direito de elas estudarem, por exemplo. Vamos supor que estivessem em
uma escola lá fora, do interior - já que as escolas do interior estão
sendo fechadas - e as famílias não se organizassem para lutar, pra ter
esse direito [de estudar]. Ou seja, as crianças estão aprendendo a
lutar pelo direito delas, assim como nós. E não há nada de errado
nisso. Eles [governo e MP] estão preocupados com os nossos filhos, que
estão lá dentro estudando e vivendo em comunidade, longe das drogas.
Será que eles não deveriam se preocupar com as crianças que estão nas
ruas, no meio das drogas, às vezes sem pai e nem mãe para cuidar delas.
E eles estão preocupados com os nossos filhos que estão junto de nós
nos acampamentos, lutando por uma vida digna, ao invés de estarem
preocupados com as crianças que não têm apoio.
Como recebeste a notícia do fechamento das escolas? Isso pra nós foi o fim, meio que desnorteou os pais. Como vamos tirar
nossos filhos agora, depender da escola convencional pública - como vi
no jornal nessa semana que tem pais acampados em frente de escolas com
barracas dormindo lá para conseguir vagas. E nós vamos fazer o que com
os nossos filhos? Vamos ter que nos preocupar com transporte, onde vão
estudar. Eu penso assim e acho que a maioria dos pais se preocupa com
isso. Nós continuamos lá no acampamento e os nossos filhos continuam
estudando lá. Os pais tomaram essa decisão, mesmo sabendo que isso pode
trazer problemas pra nós. Eu e outros pais com certeza vamos mantê-los
estudando lá na escola itinerante.
Núcleo
Piratininga
de Comunicação
—
Voltar —
Topo
—
Imprimir
|