Direitos Humanos Audiência Pública apresenta violações cometidas por siderúrgica
[Por
Gilka Resende, do PACS]
A economista Sandra Quintela entrega relatório do GATE,
apontando irregularidades no EIA/RIMA Os prejuízos causados à população do entorno da
Baía de Sepetiba com a instalação da Companhia Siderúrgica do Atlântico (TKCSA)
foi tema de Audiência Pública realizada no dia 19.03 pela Comissão de Direitos
Humanos e Cidadania da Assembléia Legislativa do
Estado do Rio de Janeiro (Alerj). Dentre as principais acusações estava o envolvimento
de milicianos na segurança do canteiro de obras da transnacional. Crimes ambientais
e o desrespeito às leis trabalhistas também figuram entre as denúncias. A empresa
alegou desconhecer tais acusações.
Pescadores
artesanais disseram ser proibidos de trabalhar com seus barcos na região. Lideranças
contrárias ao empreendimento vêm sendo ameaçadas de morte. Por esse motivo, o
pescador Luis Carlos da Silva teve que deixar sua moradia em janeiro: “É
difícil você não poder trabalhar naquilo que gosta e sabe fazer. Por lutar
pelos direitos da classe dos pescadores tive que me afastar da minha família,
dos meus companheiros. Fui ameaçado na minha própria casa”, contou emocionado.
Luis Carlos, que
é cadeirante, enfrenta dificuldades financeiras para se manter fora do estado.
Durante seu depoimento, contou ainda que teve seu barco atropelado duas
vezes pelas embarcações da empresa, lembrando a morte de um pescador em situação
semelhante. “Nosso companheiro morreu assim, com o barco sendo abalroado. Três
dias depois, quando foram procurar o corpo no rio, acharam mais três corpos com
o uniforme da empresa. O outro pescador que estava no barco, conseguiu se salvar.
Foi levado pela empresa para o hospital, sendo registrado como funcionário dela”,
relatou.
Os pescadores
identificaram dois acusados em fotos exibidas durante a Audiência, presidida
pelo deputado estadual Marcelo Freixo (Psol). Valdir Monteiro, diretor de
Recursos Humanos da TKCSA, confirmou a presença de Roberto Barroso no quadro de
funcionários da Companhia, exercendo a função de supervisor de segurança, desde
2005. O segundo acusado, identificado apenas como Paulão, teria prestado serviços
terceirizados à siderúrgica em 2008, pela empresa Protege. Monteiro reconheceu
nas fotos ainda o gerente de Logística da empresa, Sebastião Coutinho.
Marcos Garcia,
também pescador, destacou que as fotos foram feitas durante ato de protesto em
frente à empresa. Na ocasião, segundo ele, os seguranças coagiram os
manifestantes com armas. “Eles falaram para a gente sair, para pararmos de
fotografar. Não tinham crachá nem uniforme, mas disseram ser da TKCSA”, contou.
Carros brancos, também sem identificação, aparecem nas fotos contendo
giroscópios, como nos veículos de polícia. Sobre o caso, Valdir Monteiro
assegurou desconhecer os carros como pertencentes à frota da Companhia.
Desrespeito às
leis trabalhistas e crimes ambientais também foram denúncias
A
economista Sandra Quintela, do Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul
(PACS), avalia que as ações da TKCSA
colocam em risco o real desenvolvimento econômico da região, quando desconsideram
as potencialidades de uma Área de Preservação Ambiental (APA), historicamente
ligada ao turismo e à pesca. “A TKCSA quer transformar a região numa área de
exclusão do capital, em que países ricos procuram o terceiro mundo para
implementar projetos de altos níveis de poluição”, disse. Sandra lembrou,
inclusive, que a obra foi embargada pelo IBAMA em 2007, o que não impediu a
continuidade do empreendimento.
O trabalho de cerca
de 8000 pescadores foi prejudicado, segundo dados da Federação das Associações
de Pescadores Artesanais do Estado do Rio de Janeiro (Fapesca). O pescador Isac
Alves disse que a TKCSA se instalou no principal pesqueiro da Baía de Sepetiba:
“A empresa destruiu o manguezal, que é o berço de tudo. Costumava ganhar R$ 300
por semana com a pesca. Agora, não tiro nem R$ 60. É isso que o pescador, que é
gente humilde, está ganhando nesse país de ninguém”, protestou.
Diante
das denúncias, o deputado Marcelo Freixo solicitou aos representantes da
empresa o Estudo
de Impacto Ambiental e o Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA)
da transnacional. Sandra
Quintela aproveitou a ocasião para entregar o relatório do Grupo de Apoio
Técnico Especializado do Ministério Público Federal (GATE), que aponta que a TKCSA
não tem respeitado os critérios previamente definidos pelo EIA/RIMA.
A contratação irregular de
trabalhadores também foi pauta. Duas ações civis públicas foram instauradas no Ministério Público do Trabalho: uma
por ter contratado engenheiros chineses sem validação do CREA; e outra por
manter 120 chineses no canteiro de obras sem contrato de trabalho e em situação
irregular no Brasil. “Para reduzir custos contratam mão-de-obra barata não
especializada. Seguem a lógica capitalista falida de colocar o lucro acima do
desenvolvimento humano”, disse a economista Sandra.
O empreendimento conta com incentivo público, mesmo com todas as
irregularidades. Recebe isenções fiscais do estado e da prefeitura do Rio, além
de financiamento de R$ 1,48 bilhões do BNDES. O conglomerado pretende produzir
5,5 milhões de toneladas de placas de aço por ano, com produção 100% voltada à
exportação para os Estados Unidos e Europa.
Representantes
da TKCSA dizem desconhecer as denúncias
Pedro Teixeira, representante legal da TKCSA,
afirmou que até o momento da Audiência, a empresa não havia tomado conhecimento
de nenhuma das denúncias realizadas. No entanto, a transnacional publicou nota
que ocupou um quarto das páginas dos jornais Folha de São Paulo, Jornal do
Brasil e O Globo, no dia 3 de
março. No “esclarecimento”, a transnacional nega as acusações do envolvimento
de milícias em sua equipe de segurança.
Além do deputado estadual Marcelo
Freixo (Psol), a Audiência Pública contou também com a participação dos
deputados estaduais Paulo Ramos (PDT) e Alessandro Molon (PT). Os parlamentares
encaminharam o pedido de proteção oficial ao Programa Nacional de Defesa dos
Defensores dos Direitos Humanos para o pescador Luis Carlos da Silva. Outra
medida será o agendamento de visita ao canteiro de obras da transnacional,
sendo convidadas também as comissões permanentes do Trabalho, Meio Ambiente e
Saúde dos Ministérios Públicos Estadual e Federal.