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Entrevistas
Pesquisador de ciências sociais da Guatemala fala sobre concentração dos meios de comunicação no país

[por Sheila Jacob] De 7 a 12 de outubro, foi realizado na capital da Guatemala o 3º Fórum Social das Américas. O cientista social Enrique Alvarez, diretor do grupo Incidência Democrática (IDEM), falou sobre a atual situação econômica e política do país, os movimentos sociais e a concentração dos meios de comunicação. O IDEM é um centro de investigação de ciência democrática, especializada em análises políticas, econômicas, sociais e em termos de segurança.


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Qual é a importância de o Fórum ocorrer aqui na Guatemala?
Creio que este é um acontecimento de grande importância, principalmente nesse momento em que há alguns processos em marcha que precisam ser fortalecidos. Principalmente para que os movimentos sociais da Guatemala recebam respaldo e impulso, já que há uma certa dificuldade agora neste sentido.  

É preciso também ter uma reflexão clara e precisa em relação a essa crise financeira internacional, para se definir algumas linhas conjuntas de ação. Prevemos que vai se expressar a redução de remessas e a debilidade das exportações, porque a Guatemala depende quase em termos absolutos da economia dos Estados Unidos. Portanto temos que repensar o modelo que estamos adotando.


E em que o Brasil tem contribuído ou pode contribuir para o desenvolvimento da América Latina?
Creio que o futuro do mundo, mais especialmente de nosso continente, está na integração dos povos. Evidentemente o modelo neoliberal e mercantilista tem provocado e gerado a pobreza. Para se contrapor a isso, no Brasil começou o Fórum Social Mundial para pensar em ações e práticas sociais muito importantes para os países.  

Um evento como o Fórum contribui para que se compreenda a natureza do que se vai enfrentar. E também a necessidade de se fortalecerem os laços das organizações sociais de distintos países para pensar em ações conjuntas. É evidente que há forças sociais no Brasil que têm bastante desenvolvimento, e podem servir como um suporte importante para as organizações sociais em nossos países da América Central.  


Qual a situação atual dos movimentos sociais na Guatemala?
Na Guatemala os movimentos sociais experimentam um refluxo, principalmente após os Acordos de Paz, assinados em dezembro de 1996, após 36 anos de conflito armado no país. Acredito que a principal razão é, por um lado, não ter encontrado reivindicações gerais. E, por outro, as dificuldades para incorporar as juventudes, que são atores fundamentais em todo o mundo.

 

Quais grupos você destacaria?
Há organizações fortes aqui, especialmente os campesinos, que lutam pela terra e por melhoria das condições de vida na área rural. Por outro lado há também o movimento dos professores  de nível primário e secundário, que têm forte capacidade de organização. Fora desses dois, creio que os outros não têm expressão sistemática.
 
 

E os indígenas?
Além da falta de política de preservação das culturas, da língua, e preservação de lugares históricos, por exemplo, existe ainda a falta de unidade entre os grupos. O movimento indígena é importantíssimo, todavia tem que se potencializar mais. Acho que o Fórum pode ser importante nesse sentido.  

E sobre a comunicação na Guatemala após 1996?
Nos Acordos de Paz tem uma determinação que busca fortalecer o processo democrático ampliando o direito à comunicação. Nesse sentido, se desenvolveram alguns mecanismos para promover a democratização dos meios, com a limitação óbvia de se fazer isto em um sistema capitalista, em que predominam os interesses econômicos dos grupos poderosos. E também contribui a pequena capacidade coercitiva dos mecanismos para cumprir os acordos.  

A interpretação que o Governo fez como uma notória manipulação do direito à informação é que a forma mais democrática possível era liberar a propriedade dos meios e oferecer como livres. O que produziu foi uma concentração dos meios de comunicação em quatro grupos econômicos que detêm todas as frequências de rádio, e desenvolvem mecanismos para enriquecer a partir disso. Uma é alugando por preços altíssimos. Estamos falando de privilégio de grupos econômicos fortes ou então de igrejas que têm apoio internacional.  

Qual seria a importância?
Na Guatemala já estão todas as frequências outorgadas. Então são muito poucas as possibilidades de se conseguir uma, com os preços altíssimos. A via que se promoveu como alternativa foi a das rádios comunitárias. A FGER (Federação Guatemalteca de Escolas Radiofônicas) é muito importante, e tem grande difusão. A Federação firmou um acordo com a rádio nacional, e ambas têm espaço de transmissão conjunta, tanto de atividades quanto de programas. Esse me parece um avanço importante. Mas ainda assim existe a dificuldade de se manter, e a necessidade de se competir em um meio que predomina o comercial, com uma disparidade enorme de recursos.


A alternativa que nós temos é exigir do Estado que cumpra sua responsabilidade de dotar a sociedade com um meio de comunicação que não está na lógica em que está a maioria. Na Guatemala, o Estado não exerce pressão alguma nesse sentido. E os meios estatais estão sendo subutilizados. 

O que pensa das iniciativas de lei a serem aprovadas pelo Congresso em relação à radiodifusão?

Tenho conhecimento de algumas iniciativas, como da FGER. O problema grave é que na Guatemala esses grupos econômicos exercem uma enorme influência no aparato político. Então essas leis sofrem algumas mutilações, e quando são aprovadas acabam sendo limitadas. Isso é negativo, mas também creio que tem uma certa relação com a falta de ação dos movimentos sociais em torno desse tema, para que se identifique o direito à comunicação como um direito humano. 

É claro que há inúmeras possibilidades de entender as lutas econômicas, mas não se percebe a importância dos aparatos ideológicos, inclusive sobre o desenvolvimento e a força das próprias organizações sociais. Existe um movimento dos comunicadores que organizaram esse fórum, a maioria mulheres, para tratar esse tema de outra forma.  


Em relação às rádios comunitárias, no Brasil muitas sofrem a repressão da Polícia Federal e da Agência de Telecomunicações. Como ocorre a repressão às rádios comunitárias na Guatemala?
Aqui ocorrem ações com frequencia promovidas por empresários. Já ocorreram prisões de pessoas e destruição de equipamentos. Esta prática tem se produzido sim aqui em Guatemala, mas não de uma maneira sistemática. Na verdade, a principal forma que se tem produzido a repressão tem sido a econômica. Esta normalmente está disfarçada de marco de liberdade de mercado, que sabemos que não é livre nunca. Apenas beneficia grupos muito pequenos. 

Como é a concentração dos meios de comunicação?
São quatro grandes grupos que dominam as rádios do país. O grupo mais forte está vinculado à televisão. Os quatro canais que temos na TV aberta estão nas mãos de um empresário mexicano, Angel Gonzalo, que possui a rádio também e tem grande capacidade de incidir de forma determinante nas campanhas políticas. É um interlocutor com quem todos os partidos negociam. Na imprensa guatemalteca experimentamos o fenômeno da concentração.  

Dionisio Gutierrez é outra figura pertencente aos grupos econômicos que dominam aqui na Guatemala. Seu nome está ligado a uma das famílias mais poderosas do país, que possui o monopólio em vários aspectos da economia, como na produção de trigo, frango, e ainda rede de restaurantes para a comercialização. Agora esta mesma família está comprando ações de jornais. Penso que a democratização dos meios é uma questão fundamental a ser pensada tanto para a Guatemala quanto para todo o continente.


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 NPC - Núcleo Piratininga de Comunicação * Arte: Cris Fernandes * Automação: Micro P@ge