Jornalista “engorda” a estante de livros sobre rádios comunitárias
Em entrevista ao Boletim do NPC, Dioclécio Luz fala sobre o que ele considera o veículo de comunicação mais revolucionário: a rádio comunitária. “Qual a sua formação?”, pergunto. “Tenho uma formação misturada arretada, já fui engenheiro, fotógrafo, agrônomo, ator... e agora, jornalista e escritor”, responde. O pernambucano Dioclécio escreveu os livros “Trilha apaixonada e bem humorada do que é e de como fazer rádios comunitárias, na intenção de mudar o mundo” e “A arte de pensar e fazer rádios comunitárias”. Para Dioclésio, não existe no mundo uma lei sobre rádios comunitárias melhor do que a nossa.
Boletim NPC - Por que escrever sobre rádios comunitárias?
Dioclécio Luz - É um veículo que tem uma originalidade muito grande. Esse é, inclusive, o tema do terceiro livro que estou fazendo sobre o assunto. A Rádio Comunitária se obriga a ter uma gestão da comunidade e tem tudo para promover mudanças muito grandes na sociedade, em todos os termos, culturais, políticas, econômicas...
Boletim NPC - Você diria que a rádio comunitária é potencialmente revolucionária?
Dioclécio Luz - Quando ela não tiver esse espírito revolucionário, ela deixa de ser comunitária. Se ela passa a copiar a comercial, ela deixa de ser comunitária. A Rádio tem um potencial para mudar o planeta. Mas como nós não temos certeza de como vamos fazer essa transformação ficamos titubeando e aí acabamos copiando as emissoras comerciais. É um problema cultural. O brasileiro não tem cultura para assumir um veículo como esse por todas as questões sociais existentes em nosso país. A rádio comunitária é uma rádio do trabalhador, mas não é só isso, as pessoas não perceberam ainda a capacidade de transformação da rádio.
Boletim NPC - Os livros que você escreveu se destinam a algum público específico?
Dioclécio Luz - São basicamente para quem está pensando em fazer ou está fazendo rádios comunitárias. Mas também é para todos os interessados no assunto. A linguagem é bastante clara, a partir de uma visão construída junto com quem faz rádios comunitárias. Isso incomoda academicamente alguns, por isso os livros não são tão usados na academia.
Boletim NPC - Você acha que o tema das rádios comunitárias é tratado de maneira satisfatória nos cursos de comunicação?
Dioclécio Luz - Hoje, em algumas faculdades, há bons professores dessa área. Mas os estudantes são formados para trabalharem na TV Globo, que é considerada o ideal de jornalismo. Não se consideram diferentes possibilidades de se fazer jornalismo, como por meio da rádio comunitária. A rádio comunitária precisa ser vista não como um veículo de esquerda, mas como um instrumento de comunicação crítica. Eu participei como jurado de um concurso de vídeos sobre direitos humanos e 99% dos vídeos concorrentes reproduziam o modelo global [da Rede Globo]. Será que não tem outras formas de fazer? Se não existe, que inventem! Ora, o mundo não acabou.
Boletim NPC - O que não podemos deixar de saber sobre rádios comunitárias?
Dioclécio Luz - Que este veículo é original, tem que ser original, por natureza e princípio. Quando trabalhamos em uma rádio comunitária temos que desaprender um monte de coisas. Não existem duas rádios iguais, e ainda bem que não. Quando a igreja católica, por exemplo, toma posse de uma rádio comunitária é um crime, ela está impedindo que a população aprenda a usar o veículo mais revolucionário que existe.
Boletim NPC - A que você atribui a “magra estante” de livros sobre rádios comunitárias?
Dioclécio Luz - Primeiro porque quem faz rádio comunitária hoje não tem o hábito de ler e escrever, por vários motivos. Segundo porque a academia ainda dá pouca importância ao tema. Poucas pessoas perceberam a importância do sentido transformador desse meio. O terceiro livro que estou escrevendo trata justamente dessa dimensão da rádio comunitária. Mas quem vai ler esse livro? A academia ou o pessoal que está fazendo rádio comunitária? A academia está cheia de gente querendo matar o Willian Bonner e a Fátima Bernardes para assumirem o lugar deles no Jornal Nacional.
Boletim NPC - Como avalia a situação das rádios comunitárias no Brasil atualmente?
Dioclécio Luz - As rádios têm dificuldades de lei, de repressão, do governo Lula que enrola, engana, trai o povo das rádios comunitárias, dificuldades de sustentabilidade, dificuldades culturais. O pior é que existem os espertalhões, políticos, padres, empresários, pastores que sabem usar o poder das rádios comunitárias. Apenas 10% das rádios autorizadas podem ser consideradas rádios comunitárias. O ministro das comunicações Helio Costa já foi acusado de estar beneficiando grupos políticos com as autorizações das rádios comunitárias. Um estudo de Venicio Lima e Cristiano Araújo comprova isso. As rádios têm que enfrentar a Polícia federal, a Anatel, a grande imprensa satanizando-as, dizendo que elas derrubam disco voador, porque se derruba avião, também derruba disco voador, né? O governo brasileiro já foi inclusive chamado à OEA [Organização dos Estados Americanos] porque não reconhece o direito das pessoas à comunicação e vai ser chamado novamente.
Boletim NPC - Em comparação a outros países nossa situação é pior?
Dioclécio Luz - Eu não acredito que exista outra lei pior do que a nossa lei sobre rádios comunitárias, é para impedir o funcionamento. É uma lei que caberia perfeitamente em um regime de Mussolini ou de Hitler. É uma vergonha o governo Lula usar um dispositivo da época da ditadura militar [decreto 236/67] para reprimir as rádios comunitárias. Os radialistas das rádios comunitárias são criminosos políticos porque são seres subversivos. E uma boa rádio comunitária é realmente subversiva.
Boletim NPC - Onde o leitor pode encontrar os seus livros?
Dioclécio Luz - Só com o autor, pelo email dioclecioluz@terra.com.br