Hist�ria
A sociedade industrial do século 19: os EUA se desenvolveram com forte investimento estatal
Desenvolvimento
do capitalismo é tema de curso no Rio
O capitalismo não é apenas um modo
específico de organização da economia, mas também orienta o modo de se viver, pensar e organizar o cotidiano. Esta afirmação
foi feita pelo professor Reginaldo Carmelo de Moraes em aula para os
alunos do curso de comunicação popular do NPC, no dia 11 de maio, sobre o
funcionamento do sistema capitalista
hoje.
“Os países
desenvolvidos nos dizem para não fazermos exatamente o que eles fizeram no
passado. Os Estados Unidos, por exemplo, se desenvolveram com um forte
investimento estatal. Mas hoje eles nos dizem o contrário: que devemos tirar o
Estado da economia”, explicou.
[Por Sheila Jacob]
Reginaldo Moraes apresentou as mudanças por que passou o capitalismo
desde o século 19, quando Marx estudou a sociedade. “De lá para cá houve muitas
mudanças, como o perfil do capitalista e da classe trabalhadora”. Mas, segundo
ele, as diferenças sociais ainda são uma realidade, e a desigualdade existente
dentro de cada país pode ser vista na comparação entre o Norte e o Sul, tanto
no nível de concentração de riqueza mundial quanto na produção de conhecimento
e alta tecnologia.
Para explicar o desenvolvimento do capitalismo, o professor fez um
esquema bem resumido da sociedade industrial estudada por Marx no século 19.
Basicamente, a sociedade foi dividida em duas grandes classes: a dos patrões,
formada por aqueles que têm o domínio dos meios de produção; e o proletariado,
que depende de sua força de trabalho para sobreviver.
Ele explicou didaticamente que ao longo da história do mundo, há
momentos diferentes da evolução do capitalismo: durante a Idade Média houve renovação
técnica agrícola. Depois veio a fase industrial e, posteriormente, a
pós-industrial. Essas alterações geraram mudanças nas lideranças econômicas: de
produtores agrícolas aos donos de manufatura e, depois, em uma fase posterior, os
banqueiros, financistas, seguradoras etc.
“Marx disse que a história da sociedade é a história das lutas de
classes. Desse conflito surgem as mudanças”, explica. Ele lembra que todo
sistema econômico se sustenta em um sistema legislativo, jurídico e político. “As
épocas mudam e as ideias também mudam. Marx viu que em toda sociedade, as ideias
dominantes são as ideias da classe dominante. Mas não são as únicas: existem muitos
conflitos econômicos, políticos e também de valores, expectativas. Toda época
tem sua ideologia, ou seja, um conjunto de ideias com as quais as pessoas
justificam seu comportamento e explicam o que esperam e entendem do mundo. Uma
revolução ocorre quando se levam os conflitos até o fim e se coloca outro
sistema de ideias e de relações econômicas no lugar daquele que predominava
antes”, observa.
Segundo Moraes, a imagem do que era o capitalismo e a classe
trabalhadora na época de Marx está no filme Os
companheiros, do cineasta italiano Mario Monicelli (Roma, 15 de maio de
1915 — Roma, 29 de novembro de 2010) que mostra bem o conflito entre patrões e
trabalhadores. Segundo o professor, é importante perceber que o capitalismo
também muda ao longo do tempo e as ideias de Marx precisam ser atualizadas,
apesar de muito úteis. Um exemplo citado por ele é o fato de, no século 19, os
operários sobreviverem apenas com o que ganhavam a partir da sua força de
trabalho. Lutaram por leis trabalhistas e garantias de boas condições de
emprego para toda a classe trabalhadora. Depois, ao longo do tempo, foram
percebendo que também precisavam lutar para que parte da riqueza de uma
sociedade seja destinada a serviços públicos voltados para quem não é rico,
como saúde e educação. “Por este motivo, ao longo do tempo não apenas os
sindicatos ganharam importância, mas outros movimentos sociais que vão sendo criados
para exigir do Estado a garantia de direitos”, observa.
A vida produtiva
passou a ter menos importância que a financeira
Além das mudanças na luta da classe trabalhadora, também muda o perfil
do capitalista. “Hoje as empresas não se
especializam em um produto ou outro. Agora a única especialização é produzir
lucro. As empresas vão se transformando em agentes financeiros, aplicações de
finanças etc. A vida produtiva passa a ser menos importante que a financeira”,
explica Regis.
Alan Tygel, aluno do curso de comunicação popular, citou a campanha “Quem são os proprietários do Brasil”, que procura
investigar quem tem o controle financeiro no país. “Existe ainda a diretoria
cruzada, um verdadeiro cartel de capitalistas fazendo acordos”, explica Moraes,
mostrando como a classe capitalista possui uma organização complexa e muito
eficiente também. Ele inclusive brincou, dizendo que o economista inglês Keynes
dizia que o capitalismo tinha que ser protegido dos próprios capitalistas. “Hoje
existem as bolhas especulativas, que movimentam o mercado financeiro com
projeções e mentiras. Vende-se até o que não existe. Há uma verdadeira desarrumação
do capitalismo produtivo pra sustentar
o ganho financeiro. O ramo que mais ganha são os bancos e suas corretoras”,
explica, lembrando que a especulação existe tanto sobre o valor da mercadoria quanto
sobre o câmbio também, já que as transações financeiras são feitas a nível
internacional. “Um dia esse castelo de especulação que só cresce pode vir a
ruir. A crise das hipotecas americanas foi exatamente isso: os Estados Unidos
acabaram salvando as grandes empresas, aquelas que não podem falir, e tornou-se
o Estado mais endividado”, reflete.
Duas animações que explicam o funcionamento dessas bolas especulativas e
sua relação com a crise financeira são Inside Job [Trabalho interno] e American Dream [Sonho Americano].
“Façam o que eu digo,
não façam o que eu faço”
Depois da 2ª Guerra Mundial, houve a transnacionalização do mundo
produtivo. Os Estados Unidos e o Japão, por exemplo, passaram a montar réplicas
de fábricas em outros países. “Assim, ao invés de exportar o produto, passaram
a montar no país que iria consumir, gerando ali o lucro e enviando-o de volta
para a matriz”, conta. É o caso das empresas maquiadoras no Norte do México.
Muda também o estilo do produto. Passa da exportação de produtos agrícolas
brutos. Países desenvolvidos se especializam em produzir internamente bens
menores e altamente tecnológicos. Os países menos desenvolvidos produzem bens
maiores e mais poluentes. “Aqui se inova pouco, porque as empresas têm
interesse em renovar lá. Recomendam que os outros países não façam tudo aquilo
que eles fizeram”, observa o professor.
Para entender o assunto, ele indicou o livro Chutando a Escada: a estratégia
do desenvolvimento em perspectiva histórica, do sul-coreano Ha-Joon
Chang. “Esse estudo mostra como os
países que tomaram a dianteira recomendam o contrário do que fizeram. Lá todo
desenvolvimento foi bancado pelo Estado, e eles dizem que a gente deve fazer
exatamente o contrário”, observa. Segundo ele, foi o Estado norte-americano que
impulsionou o crescimento do país, mesmo que eles preguem o contrário. Ou seja:
o investimento governamental foi muito importante, exatamente o que eles dizem para
a gente não fazer.
Apesar dessas
mudanças, Moraes ressaltou que a diferença entre o Norte e o Sul permanece, o
que se percebe, por exemplo, na concentração da riqueza mundial. Há ainda a
diferença de produção de conhecimento. O mapa abaixo mostra como a produção de alta tecnologia está concentrada nos
EUA, Europa Ocidental e Ásia.
O ramo das comunicações foi um dos que mais cresceu nos últimos tempos,
possibilitando negócios e que as bolsas funcionassem, interligadas, 24 horas
por dia. “O capitalismo cognitivo é um dos aspectos do capitalismo de hoje. A
informação também virou mercadoria, mas mais difícil de se controlar. Aí entra a
questão das patentes, propriedade intelectual etc. “O Terceiro Mundo vem conseguindo alguns avanços, como
a questão das indústrias farmacêuticas, mas é uma das lutas que temos ainda
pela frente”, concluiu.
Núcleo
Piratininga
de Comunicação
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