Por NPC
Para Gilberto Maringoni, Brasil deveria seguir o exemplo de países vizinhos que regularam o setor de comunicação para incentivar a diversidade informativa
Postura apática do governo federal com relação à democratização dos meios de comunicação decepciona o jornalista e professor Gilberto Maringoni, que aponta Dilma Rousseff e FHC como os presidentes mais próximos da mídia nos últimos anos. Nesta entrevista exclusiva ao Boletim do NPC, Maringoni avalia ainda que a cobertura da mídia sobre a América Latina melhorou na última década, mas mantém a orientação editorial de demonizar Chávez, Evo e Correa e de atacar Cuba. “É uma cobertura enviesada e sem muito compromisso com a verdade”, critica. Militante político há mais de três décadas, Maringoni fala também sobre sua candidatura a vereador em São Paulo, uma tarefa que considera coletiva. “Sou candidato porque é preciso deter um processo elitista de privatização da cidade”, afirma. Gilberto Maringoni participará do 18º Curso Anual do NPC, em novembro, fazendo uma exposição sobre as grandes corporações de comunicação da América Latina.
BoletimNPC - Como militante pela democratização da comunicação, de que forma você avalia que este tema tem sido tratado pelos governantes no Brasil? E pelos movimentos sociais? Gilberto Maringoni – Os movimentos sociais fizeram a proeza de abrir o tema para os não-especialistas na área. Esse foi o grande saldo da I Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), em 2009. Participaram do processo mais de 60 mil pessoas em todo o Brasil. Mostrou-se ali que a democratização da comunicação é um assunto de interesse de toda a sociedade. Sobre os governantes, minha decepção com Dilma nesse quesito é total. Votei nela no segundo turno, em 2010. A então candidata foi atacada pela mídia sem dó durante a campanha. Mas logo que tomou posse, foi à festa de aniversário da Folha de S. Paulo. Em março último, deu uma entrevista exclusiva à Veja e segue entupindo esses veículos de publicidade oficial. Como se não bastasse, agora anuncia sua ida à Assembléia Geral da SIP (Sociedade Interamericana de Prensa), entidade dos grandes monopólios continentais. Ela e FHC são os presidentes mais próximos da mídia nos anos recentes. Lula governou com medo dos meios de comunicação. Reclamou muito, mas não teve nenhuma iniciativa em prol da democracia no setor. Isso para não falar de Paulo Bernardo, um representante dos grandes monopólios na Esplanada dos Ministérios. BoletimNPC - Para promover maior diversidade informativa deveríamos seguir o exemplo da Argentina e do Uruguai, países que criaram leis nacionais distribuindo as frequências de radiodifusão por três setores – 33% para o Estado, 33% para o setor privado e 33% para instituições sem fins lucrativos? Gilberto Maringoni – Minha resposta já está em sua pergunta: claro que sim. O Brasil é uma exceção na America Latina. Em quase todos os países, a televisão nasceu estatal, como serviço público, nos anos 1950. Somente aqui surgiu como negócio. Assim, até hoje há uma preponderância das grandes corporações em detrimento de emissoras públicas. Mas isso pode ser mudado. BoletimNPC - Você tem experiência na cobertura de política na América Latina. Como vê o tratamento da mídia brasileira sobre os principais fatos ocorridos nos países de governo progressista da região? Gilberto Maringoni – A cobertura melhorou nos últimos dez anos, pois há correspondentes fixos pelo menos na Venezuela e na Argentina. Mas a orientação das edições – e muitas vezes não é culpa do repórter – é sempre a mesma: demonizar Chávez, Evo e Correa, sem deixar de atacar Cuba. É uma cobertura enviesada e sem muito compromisso com a verdade. Quer um exemplo? A mídia ataca a entrada da Venezuela no Mercosul, alegando que se deu um golpe contra o Paraguai ao excluí-lo da decisão. Pouco se menciona que o problema é justamente o golpe que o Paraguai sofreu com a deposição de Fernando Lugo. BoletimNPC - Você escreveu dois livros sobre a Venezuela (“A Revolução Venezuelana” e “A Venezuela que se inventa”). Por que escolheu registrar acontecimentos políticos e parte da história deste país? Maringoni – Logo após a volta de Chávez ao poder, após o golpe de 2002, Raimundo Rodrigues Pereira, um dos mais notáveis jornalistas brasileiros, me convidou para fazer uma matéria sobre os acontecimentos daqueles dias. Eu pouco sabia do país, além dos noticiários de jornais. Fiquei espantado, pois a imprensa brasileira não apenas foi colhida de calças curtas pelo malogro do golpe, como tripudiava sobre o significado do processo político bolivariano. O quadro que vi lá era fascinante: um governante, atacado pela mídia impiedosamente, voltava ao poder por pressão popular. Fiz a matéria e fui convidado pela Editora Fundação Perseu Abramo para fazer um livro sobre a Venezuela. Em quatro anos voltei mais nove vezes ao país, fiz mais de quarenta entrevistas e li dezenas de livros, centenas de páginas de imprensa, visitei bairros pobres e ricos e tentei entender a singularidade da dinâmica política local. A efervescência venezuelana foi o prenúncio de uma década de mudanças na América Latina. É por isso vale a pena estudá-la a fundo. BoletimNPC - Você é jornalista, professor e militante político. Por que decidiu ser candidato a vereador em São Paulo nessas eleições? Quais são suas principais propostas? Maringoni - Sou militante há 35 anos. Militei em organização clandestina, fui base, dirigente partidário no PT e no PSOL, coordenei campanhas e exerci outras tarefas. A candidatura é também uma tarefa coletiva. Sou candidato porque é preciso deter um processo elitista de privatização da cidade. Ele se dá através da concessão e terceirização de equipamentos e serviços públicos, como na saúde, na educação e nos transportes. Um subproduto disso é um surto conservador que envolve demonstrações de preconceito racial e sexual, higienismo social e violência contra os pobres. Para fazer frente a isso é necessário ajudar a recompor a esquerda na cidade de São Paulo para um projeto consistente de mudança. É uma tarefa gigantesca e coletiva. Precisa ir em frente.
Núcleo
Piratininga
de Comunicação
—
Voltar —
Topo
—
Imprimir
|