[Por Sindicato dos Químicos de Osasco - 20.08.2012]
“Essa mídia não é neutra.
Ela tem um lado: o lado da classe dominante”
Há 28 anos, em meados de abril de 1984, o Brasil viveu uma de suas maiores
mobilizações sociais, o movimento pelas Diretas-Já!, que segundo estimativas
reuniu 1,5 milhão de pessoas no centro de São Paulo.
O movimento contou com a intensa participação de movimentos sociais,
sindicais, políticos, da classe artística, e até esportistas, como o falecido
jogador Sócrates, entrevistado pelo Jornal do Unificados em agosto de 2010.
Apesar das enormes manifestações, com intensa participação popular, o Jornal
Nacional, da Rede Globo, noticiou o movimento como a comemoração do aniversário
da cidade de São Paulo. Poucos dias depois, a proposta de eleições diretas foi
derrotada no Congresso, e o presidente do Brasil foi escolhido por eleições
indiretas.
Esse é só um exemplo de manipulação da informação por um grande veículo de
mídia no Brasil. Existem muitos outros.
A informação tem
dono
Segundo o livro A Ditadura da Mídia, do jornalista Altamiro Borges, hoje,
somente cinco famílias, donas de grandes grupos, dominam toda a comunicação no
país.
O mesmo livro afirma que as Organizações Globo têm uma enorme hegemonia no
setor. São 35 grupos afiliados que controlam, ao todo, 340 veículos. A relação
com empresas em todos os estados permite que o conteúdo gerado pelos 69 veículos
próprios do grupo carioca seja distribuído por um sistema que inclui 33 jornais,
52 rádios AM, 76 rádios FM, 11 rádios OC, 105 emissoras de TV, 27 revistas e 17
canais e nove operadoras de TV paga. Além disso, a penetração de sua rede é
reforçada por um sistema que inclui 3.305 retransmissoras.
Para falar sobre esse tema o Jornal do Unificados entrevistou o
ex-metalúrgico, escritor e um dos fundadores do Núcleo Piratininga de
Comunicação (NPC – http://www.piratininga.org.br/), Vito Giannotti.
ENTREVISTA
“Essa mídia não é neutra. Ela tem
um lado: o lado da classe dominante”
Jornal do Unificados – Qual é a importância da mídia na formação
da opinião pública, na forma com que a população vê e entende os fatos
sociais?
Vito Giannotti – Eu prefiro falar de ideologia dominante ao
invés de opinião pública. Podemos falar de opinião dominante, ou seja, a opinião da maioria. Esta não
nasce do nada. Ela é criada pelos fatos. E quem é que define o que é ou não um
fato? O que é uma notícia que merece ser levada ao conhecimento do público? Aí
já começa a formação de opinião. E quem relata o fato é a mídia: rádios, TVs,
jornais, revistas e, hoje a internet. E essa mídia não é neutra. Ela tem um
lado: o lado da classe dominante.
Jornal do Unificados – A mídia deveria apresentar
imparcialmente todas as versões de um fato para que cada leitor tirasse suas
conclusões. É isso que ocorre? A mídia é imparcial?
Vito Giannotti - Isso é papo furado de quem não leva em
conta que a sociedade é dividida em classes. Não existe “A” mídia, uma mídia só…
Existem duas mídias. A mídia da classe patronal. A mídia comercial, empresarial,
burguesa. A mídia “deles”.
A mídia dos inimigos da classe trabalhadora. Desgraçadamente, esta é muito
forte. Tão forte quanto o capital que eles têm, quanto o poder que os patrões,
que nós chamamos de burguesia têm. E existe a nossa mídia que infelizmente é
fraca, magrelinha, absolutamente insuficiente. A mídia deles não tem obrigação
nenhuma com a verdade, com a neutralidade, a imparcialidade. Ela tem dono, E
dono tem classe e classe tem interesse de classe. Qual classe? A “deles”,
evidentemente.
Então nada de acreditar em Papai Noel. A mídia deles é nossa inimiga e ponto.
Só nos resta a nossa.
Jornal do Unificados – Como é hoje a comunicação dos
sindicatos e dos movimentos populares com a sociedade?
Vito Giannotti – Insuficiente. Podemos fazer muito mais.
Iludimo-nos com um jornalzinho uma vez por mês e um discurso aqui e acolá.
Enquanto isso nosso inimigo faz suas novelas, seus programas policiais em rádios
e televisão. Seus telejornais e seus “Fantásticos”. A gente se ilude e se
contenta com migalhas. Precisamos avançar muitíssimo na batalha da construção da
nossa mídia alternativa. Juntar esforços. Criar novas realidades e ir pra cima
dos governos para exigir passos concretos de democratização da mídia. E garantir
condições da população criar e manter sua própria mídia, com dinheiro público,
tanto quanto a escola deve ser pública, os transportes e por aí vai. Exigir dos
donos da política uma virada total no campo das comunicações. Mas isso só se
consegue com força política da nossa classe. Com partido, sindicatos e toda
forma de associação comprometidos verdadeiramente com os interesses da maioria,
com os interesses dos trabalhadores. Esta é uma luta de 10, 20, 50 anos. É a
luta para construir uma sociedade socialista, totalmente diferente desta aqui de
hoje.
Jornal do Unificados – Esse ano é ano de eleição. Você acha que a
mídia pode influenciar no resultado? O que você espera dos veículos de
comunicação nas eleições 2012?
Vito
Giannotti – Claro que a mídia influencia qualquer eleição. A mídia
patronal continua a fazer seu trabalho, como sempre.
Nesta época, dirige suas ações para ter um resultado eleitoral favorável à
sua classe. Como sempre. É a lógica do sistema.
Quem não lembra como a Globo manipulou o último debate entre Lula e Collor,
em 1989?
A classe trabalhadora precisa aproveitar este momento para apresentar suas
alternativas. Mostrar qual sociedade quer construir. Aproveitar o momento para
propagandear suas ideias, suas proposta para avançar rumo a uma sociedade justa
com uma verdadeira democracia.
Jornal do Unificados – As novas tecnologias da informação,
principalmente a internet, podem ser consideradas uma porta para a
democratização dos meios de comunicação?
Vito Giannotti - Sim, sem dúvida. Mas, atenção. 60% do nosso
povo não vão acessar estas novas tecnologias nos próximos 30 anos. Por quê?
Simples, porque temos 60% do povo na faixa entre analfabeta total e analfabeta
funcional, isto é, que sabe ler duas linhas, mas não entende o que leu, não sabe
juntar o sentido das palavras.
A internet proporciona, sim, uma maior circulação das informações, mas pode
ser que ela fique circulando apenas entre círculos de amigos. Precisamos estar
ligados na internet sabendo que a direita está também atuando firmemente nas
redes sociais tanto para divulgar suas ideias quanto para vigiar a esquerda.