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James Holmes, um consumidor
Publicado em 30.7.12 - por Carta Capital Online
 Novamente o mundo assiste perplexo a mais um massacre nos Estados
Unidos. E, novamente, a sociedade estadunidense chora seus mortos.
Nenhuma novidade. Lá são inúmeros os casos de pessoas, aparentemente
insuspeitas, que planejaram cuidadosamente cada detalhe de uma chacina e
a colocaram em prática com itens encontrados em estabelecimentos
comerciais.
No dia 20 de julho, um jovem de nome James Holmes, equipado com
colete balístico, capacete, máscara contra gases e armado de pistola,
escopeta e fuzil, entrou num cinema em Aurora, no Colorado, lançou
bombas de fumaça e atirou contra os espectadores matando 12 deles e
ferindo outras dezenas. De acordo com a polícia, James Holmes não tinha
antecendentes criminais, o que significa dizer que até o dia do massacre
James não infringiu a lei, fora uma multa de trânsito em 2011. O jovem
não comprou o armamento e a munição das mãos de traficantes ou
contrabandistas. Tudo foi adquirido legalmente em lojas estabelecidas.
James Holmes comprou quatro armas, dentre elas um fuzil
semi-automático calibre .223. Armas com esse calibre podem ser
encontradas em qualquer mercado nos Estados Unidos e sua aquisição não
requer nenhum exame psicotécnico, depende apenas do dinheiro. Na Bas Pro
Shop, uma das lojas visitadas por James, um fuzil nesse calibre,
semi-automático, Remington R-15 VTR Predator, custa US$
1149.99. Apesar de ser vendida como arma de caça, seu calibre foi
desenvolvido por empresas dos Estados Unidos para o exército daquele
país que, depois da Segunda Guerra Mundial, concluiu que precisava de um
munição mais leve que a tradicional 7.62, afim de que seus soldados
tivessem mais precisão de tiro e pudessem carregar consigo mais balas. O
campo de provas desse novo calibre foi a selva vietnamita nos anos 60.
O mercado não se importa em produzir artigos que podem, fatalmente,
resultar na morte de seus consumidores. O sistema econômico vigente
consiste no tripé produção em massa/consumo/descarte. Para mantê-lo é
preciso criar perfis de consumo que nem sempre são baseados em
necessidades reais. É preciso produzir, não importa a que preço. Basta
rotular um maço de cigarro com “O Ministério da Saúde adverte” ou uma
garrafa de bebida alcóolica com “Se beber não dirija” para que se redima
a culpa da indústria pelas mortes decorrentes de doenças respiratórias e
acidentes de trânsito. A indústria de alimentos despeja todos os dias
nos supermercados produtos que serão responsáveis por doenças cardíacas,
câncer, diabetes. A indústria química, proibida de vender agrotóxicos
nos países ricos, os vende à preço de banana para nações do Terceiro
Mundo.
Indústria cinematográfica e armamentista de mãos dadas
Nos Estados Unidos a indústria cinematográfica e armamentista sempre andaram de mãos dadas. Hollywood tem sido vitrine para o lobby
das armas. É a forma mais eficiente de publicidade. Raramente um filme
americano na TV ou no cinema não tem ao menos um personagem disparando
armas, mesmo em comédias ou filmes românticos como Ghost e Titanic.
Assim como os filmes de Humphrey Bogart e James Dean estimularam muita
gente a fumar, Sylvester Stallone, Arnold Schwarzenegger e Bruce Willis
certamente inspiraram outros tantos a comprar ao menos uma pistola.
E aí fica a pergunta. Por que tanta perplexidade com a ação de James
Holmes? O atirador do Colorado não fez nada que a sociedade e o mercado
não conhecessem e incentivassem. Ele foi até uma loja, comprou máquinas
de matar de forma legal e fez exatamente o que se espera delas. Matou.
James Holmes é portanto um consumidor, e o mercado agradece. A indústria
armamentista não vai parar por causa das vidas ceifadas à bala naquele
cinema em Aurora, muito menos pelos mortos em ataques de aviões
não-tripulados estadunidenses no Paquistão e no Afeganistão. É tudo
negócio, nada pessoal.
Mais importante que nos debruçar sobre o perfil psicológico de James Holmes é analisar o caráter do establishment que tornou possível sua ação brutal.
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