ltimas Notcias
Militantes do MTST denunciam onda de criminalização da pobreza na periferia de São Paulo
Publicado em 10.7.12 - por Guilherme Boulos e Guilherme Simões*
Nas últimas semanas, a Polícia Militar tem sitiado vários bairros
periféricos da Região Metropolitana de São Paulo. Numa suposta reação a
ataques do crime organizado, policiais tomam comunidades, fecham ruas e
abordam de forma indiscriminada e frequentemente agressiva os moradores.
Como costuma ocorrer em casos como este, a “reação” é inteiramente
desproporcional à ação. Além de desorientada.
Desde o início de junho, quando a ROTA protagonizou uma brutal
chacina na Zona Leste, executando 6 pessoas que estariam em uma “reunião
do PCC”, o clima de terror alastrou-se pelas periferias. Segundo a
própria PM, cerca de 100 mil pessoas foram abordadas entre os dias 24 e
30 de junho. Neste mesmo período, cerca de 400 pessoas foram presas. Mas
estes números são apenas a face pública da situação.
Momentos como este, em que a polícia – estimulada pela maior parte da
imprensa e pelo sentimento fascista de um setor da classe média –
coloca-se como vítima, que precisa reagir em nome da lei e do Estado de
Direito, são extremamente perigosos. Abre-se então a temporada de caça
aos “criminosos”, identificados sem muita restrição aos pobres,
moradores da periferia, negros e, preferencialmente, jovens. Julgamentos
sumários, extermínios e acertos de contas são feitos em nome da lei e
da ordem.
Crimes de Maio de 2006
Há seis anos o mesmo estado de São Paulo vivenciou uma situação
análoga. O resultado foi a maior chacina, ainda que descentralizada, de
que se tem notícia nas últimas décadas no Brasil. Entre os dias 12 e 20
de maio de 2006, 493 pessoas, em sua maioria jovens da periferia, foram
mortos pela PM. À época, associaram-se tais mortes a uma reação da PM aos
ataques e os mortos a criminosos do PCC. Os relatos daquele maio
sangrento foram recuperados e podem ser acessados por todos através do
Movimento das Mães de Maio, organização de mulheres que perderam seus
filhos na suposta reação ao crime organizado.
Esta Cruzada contra o “crime” de 2006 naturalmente não reduziu os
índices de criminalidade no estado. Não era esse seu objetivo. É mais do
que sabido que o combate ao crime organizado passa, antes de tudo, por
enfrentar suas profundas ramificações dentro do próprio Estado e, em
particular, da polícia. O que a chacina de 2006 representou foi uma
oportunidade privilegiada de criminalização da pobreza, de extermínio
sádico e de mostrar aos trabalhadores mais pobres qual deve ser o seu
lugar nesta sociedade.
Pesadelo revivido
As últimas semanas nos fizeram reviver este pesadelo. Toques de
recolher, prisões e mortes obscuras estão novamente sendo naturalizados
pelo governo e imprensa sob o argumento do combate ao crime. Não nos
parece natural que a PM imponha toques de recolher no Capão Redondo,
Jardim São Luiz e Grajaú ou em regiões de Guarulhos, como ocorreu dias
atrás.
No Capão Redondo, depois da morte de um policial que estava de folga,
pelo menos 8 pessoas foram executadas por um grupo encapuzado. Após um
destes extermínios, o do copeiro Eleandro Cavalcante de Abreu, de 21
anos, um ônibus foi incendiado em protesto. Entre 17 e 28 de junho já
foram 21 assassinatos no bairro. Moradores do bairro Jd. São Bento Novo
afirmam que a polícia baleou três jovens que não tinham sequer passagem
pela polícia. No Jardim São Luiz, 6 jovens foram executados em situação
semelhante.
O hospital do M’Boi Mirim, na mesma região, atendia cerca de 6
feridos por bala nos dias que seguiram os ataques. A média desse tipo de
atendimento era de 2 por semana, segundo funcionários do hospital.
No Grajaú, também na zona sul, após ataque a uma base da PM, a quinta
feira dia 27 foi de bastante temor para os moradores. Helicópteros e
ostensiva presença da Força Tática impunham toque de recolher como forma
de retaliação. Moradores do bairro dos Pimentas, em Guarulhos, afirmam
que além do toque de recolher, cerca de 13 pessoas foram executadas nos
últimos dias. No último dia 2 de julho, a Rota executou dois jovens em
Sapopemba, zona leste da capital. Apenas entre os dias 17 e 28 de junho,
127 pessoas foram assassinadas, o que é 53% mais do que o mesmo período
do ano passado.
Estas são apenas algumas das denúncias que conseguimos levantar. O próprio jornal Folha de S. Paulo
publicou, no dia 5 de junho, que os homicídios cometidos por policiais
da ROTA aumentaram 45% nos cinco primeiros meses deste ano em relação a
2001 e 104% em relação a 2010. Ou seja, antes mesmo dos ataques a bases
da PM, que teriam provocado a “reação”, a polícia já estava num ataque
crescente.
Todos sabem que a imensa maioria da população que vive na periferia
não faz parte do crime organizado. Muito diferente disso, somos
trabalhadores formais, informais, desempregados e quase sempre
super-explorados. Em troca, direitos básicos nos são negados
cotidianamente. Nossa pobreza é tratada como crime a ser punido e
reprimido. A única face do Estado de Direito que se apresenta nas
periferias é a polícia.
O governador Geraldo Alckimin foi à imprensa para dizer que quem
enfrentar o Estado vai perder. Sua Secretária de justiça, Sra. Eloísa
Arruda, já havia dito na ocasião do massacre do Pinheirinho que, para
ela, a legalidade está acima dos direitos humanos. A senha foi dada.
Enquanto isso, a chacina continua a céu aberto...
*Membros da coordenação nacional do MTST
(Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto) e da Resistência Urbana – Frente
Nacional de Movimentos
Núcleo
Piratininga
de Comunicação
—
Voltar —
Topo
—
Imprimir
|