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Boletim do
NPC —
Nº 181
— De 15 a 30/11/2010
Para
jornalistas, dirigentes, militantes
e
assessores sindicais e dos Movimentos Sociais
Especial: 16º Curso do NPC
Participantes do 16º Curso Anual do NPC refletiram sobre O poder da mídia no século 21
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Cerca de 280 jornalistas, sindicalistas e estudantes participaram do 16º Curso Anual do NPC, realizado entre os dias 24 e 28 de novembro com o tema O poder da mídia no século 21. Dentre os assuntos debatidos estiveram a centralidade da mídia na dominação e veiculação de valores culturais; a hegemonia político-cultural dos Estados Unidos e as respostas que surgem na América Latina; a criminalização dos pobres e dos movimentos sociais pela mídia hegemônica; e as possibilidades de enfrentamento através das diversas formas de comunicação comunitária e sindical, enfim, alternativa. . Como esclareceu o coordenador do NPC Vito Giannotti, os cinco dias de debates foram pensados para estimular a reflexão sobre o poder da mídia no século 21 e as possibilidades de combater a mídia comercial/empresarial e avançar na construção da nossa mídia, a mídia dos trabalhadores. “Os cursos do NPC procuram melhorar esta comunicação nas lutas contra-hegemônicas”, ressaltou Giannotti. Vito repetiu, em várias ocasiões, que o objetivo do Curso/Encontro não é dar receitas prontas para a luta contra-hegemônica, mas sim problematizar, questionar certezas pré-estabelecidas. Para a abertura foi convidado o MC Fiell, rapper do Morro Santa Marta, que cantou ao lado de Antônio, o Peixe, um dos coordenadores da rádio comunitária da mesma favela, na zona Sul do Rio. A música foi feita em homenagem aos trabalhadores brasileiros, “os verdadeiros protagonistas da nossa história”, como apresentou Fiell. “Sem a força do trabalhador nada é construído, nada é feito, mas eles nunca são lembrados como merecem”, reafirmou. . Nesse boletim você confere um resumo da cobertura dos debates do Curso. Os textos completos estão em nosso blog: blogdonpc.wordpress.com
Tariq Ali e Marcelo Santos debatem hegemonia político-cultural dos Estados Unidos
Vito Giannotti, Marcelo Santos e Tariq Ali
. [Por Marina Schneider] “Hegemonia político-cultural dos Estados Unidos” foi o tema central da segunda mesa do 16º Curso Anual do NPC. O cientista político Marcelo Santos, professor da Universidade Estadual Paulista (Unesp), fez uma análise panorâmica da hegemonia político cultural dos Estados Unidos no continente. Segundo ele, grande parte da imprensa tenta transmitir a ideia de que a América Latina não tem nenhum valor estratégico para os EUA, mas que uma análise histórica das relações entre região e os Estados Unidos mostra justamente o contrário. Ele lembrou que as políticas de ajustes estruturais na América Latina foram marcadas por um receituário neoliberal. . Segundo ele, no início do século 21 a América Latina começa a responder, de algumas formas, às pressões dos Estados Unidos. Uma dessas respostas é a Área de Livre Comércio das Américas (Alca). Outra reação é o rompimento de alguns países com o Consenso de Washington, além da oposição à atual política de combate ao narcotráfico – uma política que pune, por exemplo, camponeses envolvidos na produção, mas não age sobre os grandes narcotraficantes. “Essas e outras ações mostram uma certa resistência à perspectiva da hegemonia. Em alguns países já há um afastamento do neoliberalismo, mas o neoliberalismo é também um estilo de vida que ainda tem feito corações e mentes. O desmonte disso é um desafio”, avalia Marcelo. . Tariq Ali fala sobre mídia no mundo . No início de sua conferência, o escritor paquistanês Tariq Ali fez um breve retrospecto sobre a mídia mundial durante o período da Guerra Fria e comparou aquele momento com o atual. Segundo Tariq, a mudança na mídia global tem a ver com o colapso da URSS e do comunismo, a partir do qual não havia mais razões para se fingir que a mídia era aberta e crítica. “Esse processo começou na década de 1990 e o resultado foi uma mídia monocórdia que elogiava o Consenso de Washington e o mercado como se fosse um deus. Foi uma característica universal” afirmou. Para ele, esse cenário mudou drasticamente com as transformações ocorridas na Venezuela, Bolívia, Equador e Paraguai. “Essa grande mídia foi atropelada pelos movimentos sociais e pelo povo, que criou sua própria história, ignorando a rede de mídia desses países”, destacou. . Tariq citou também o exemplo da TV Al Jazeera, que desafiou a supremacia da mídia ao prover imagens alternativas para o noticiário global. Ele disse ainda que foi a partir dessa emissora que surgiu a ideia de se criar a Telesul. Para avaliar o impacto político, hoje, da mídia global, Tariq Ali retomou o contexto da guerra do Iraque. “Durante três semanas tivemos informações na mídia sobre a existência de armas de destruição em massa no país para justificar a guerra. Ainda assim, milhões de pessoas em todo o mundo – que não acreditaram na mídia – foram às ruas para protestar, desafiando esta visão única”, recordou. Como forma de agir frente a este contexto de hegemonia político-cultural dos Estados Unidos sobre o resto do mundo, Tariq Ali indicou: lutar e resistir. “Não podemos desistir e vamos prosseguir nossa luta”, finalizou.
Mesa de abertura do Curso Anual do NPC debate mídia e hegemonia
Dênis de Moraes, Virgínia Fontes e Venício Lima na mesa de abertura do Cursão
[Por Sheila Jacob] “A mídia como elemento central de dominação” foi o tema da mesa de abertura do 16º Curso Anual do NPC. Para participar dos debates foram convidados o professor Dênis de Moraes, do Departamento de Estudos Culturais da UFF, e o jornalista e pesquisador Venício Lima, aposentado pela UNB. A coordenação da mesa foi feita pela historiadora Virgínia Fontes, pesquisadora da Fiocruz, que ressaltou a ligação da grande mídia proprietária com os grandes setores do capital, hoje transnacionais.
No início de sua intervenção, o professor Dênis de Moraes analisou a situação da mídia brasileira como uma “vanguarda do atraso” ao compará-la com governos progressistas latino-americanos que vêm enfrentando os grandes meios de comunicação em seus países. Segundo o professor, em nenhuma outra época a concentração se apresentou de maneira tão forte. Isso tem a ver com esse novo cenário tecnológico, que se mantém a serviço da exclusão, e que apenas “secundariamente e lateralmente” permite intervenções outras. Como ele analisa, ainda existe resistência dos grandes conglomerados regionais, nacionais e transnacionais em ceder qualquer milímetro do poder que está em suas mãos há anos, poder este que vem se reproduzindo nessa era digital. “Os meios de comunicação brasileiros não abrem espaço pra formas regulatórias democráticas e nem querem discutir seu papel na sociedade”, lembrou. Dênis de Moraes finalizou sua fala com uma homenagem ao ex-presidente da Argentina falecido recentemente, Nestor Kirchner, que iniciou em seu país um processo de ruptura com o poder sem limites da mídia local. “Seu governo começou um processo que deu para a América Latina a legislação mais avançada anti-monopólica do mundo, que é a Lei dos Meios. O objetivo desta lei na Argentina é minimizar a concentração de rádio, TV e Internet, sobretudo pelo grupo Clarin, que equivale à TV Globo aqui do Brasil”, concluiu. Já Venício Lima lembrou que nenhuma hegemonia é total e completa, e sempre há espaço para a contra-hegemonia. Ele deu dois exemplos que vão nesse sentido. O primeiro, já referido por Dênis de Moraes, é o da Lei dos Meios da Argentina, que para Venício deveria ser ensinada nas escolas de comunicação como um modelo a ser seguido no nosso país. Já o outro exemplo é a oposição sistemática, violenta e cotidiana sofrida pelo Governo Lula por parte da mídia comercial, com uma intensidade inédita. “Ainda assim o Governo chegou ao final com mais de 80% de aprovação popular, garantindo a sua sucessora“, ressaltou. Ao final, Venício enumerou alguns pontos do que espera para os próximos anos, como o aumento do papel de regulação do setor da comunicação pelo Estado; a consolidação da TV Pública e a efetivação do Plano Nacional de Banda Larga; o reconhecimento por parte do meio sindical da importância da comunicação e o aumento de rádios comunitárias, “mesmo com a lei que está aí”; e, por fim, um movimento importante de repensar a profissão e as condições do profissional de jornalismo.
Radiografia da Comunicação Sindical
Experiências em comunicação sindical mostram que é possível disputar hegemonia
[Por Najla Passos] O relato de experiências bem-sucedidas no campo da comunicação popular pautou o debate realizado no início da tarde de sábado (27/11). Na mesa, exemplos de conquistas dos trabalhadores em diferentes veículos mostraram como é possível disputar a hegemonia com a mídia controlada pelo grande capital. . O jornalista Edo Cerri relatou a experiência do jornal do Sindicato dos Químicos de Osasco que agrada a 92% da categoria e informa a 82% dos seus leitores, conforme pesquisa qualitativa independente encomendada pela entidade. O jornalista deu especial destaque à importância da profissionalização da linguagem. “O jornal não pode ser gritado como se o dirigente estivesse em um caminhão. É preciso respeitar o projeto gráfico, o tamanho dos títulos, não se pode adjetivar os textos”, recomendou. Anderson Engels, Valter Sanches, Paulo Dozinetti Claudia Costa e Edo Cerri
União nas ondas do Rádio Já o jornalista Anderson Engels, da Rádio Fortaleza, de Blumenau (SC), contou como dez sindicatos do município se uniram, há três anos, para colocar essa emissora comunitária no ar, diariamente, de 6 a 22 horas, com música, jornalismo, programas de cultura, variedade, saúde, segurança e prestação de serviços. Segundo ele, os representantes dos sindicatos se reúnem de 15 em 15 dias para discutir a pauta, tocada por dois jornalistas no cotidiano, com o apoio dos moradores da cidade. “Não aceitamos apoio empresarial para não colocar em risco a independência da rádio. O apoio que buscamos é dos sindicatos. E isso é muito importante para ampliar a comunicação com os trabalhadores”. Comunicação para a família
A jornalista e professora universitária Claudia Costa, assessora de comunicação da CSP-Conlutas, falou sobre sua experiência à frente do Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos, onde participou da criação do jornal Metalúrgico em Família, na década de 1990. “Naquele momento, com o avanço a passos rápidos do neoliberalismo, nós percebemos que iríamos ter que enfrentar um período difícil. Em várias categorias os trabalhadores estavam absorvendo esse falso discurso da modernidade. Por isso, trabalhamos a ideia de criar um veículo de comunicação para a família do trabalhador, com matérias gerais. Um jornal que combatesse o pensamento único dominante e apresentasse uma alternativa dos trabalhadores, para auqeles e aquelas que estavam nas fábricas e para seus familiares e vizinhos. Esse jornal existe até hoje. Não é o único intrumento de comuicação que o sindicato possui, mas é mais um, na disputa da visão de mundo que precisamos fazer, todo dia e com todos os meios com a burguesia". Revista unifica sindicatos O jornalista Paulo Donizetti, editor da Revista do Brasil, contou que em 1992 começou a trabalhar na equipe de comunicação do Sindicato dos Bancários de São Paulo. Em 1993, após pesquisar junto aos diretores como gostariam que fosse a publicação da entidade, o sindicato criou a Revista dos Bancários, que circulou 13 anos. “Eles queriam uma revista de atualidades”, disse. O primeiro editor foi Renato Rovai e, em 1995, Paulo Donizetti se tornou coordenador da secretaria de imprensa do Sindicato. Para ele, a edição da revista foi uma decisão política que permitiu que, pelo menos uma vez por mês, o Sindicato entrasse na casa dos trabalhadores para discutir assuntos que eles não encontram no trabalho e, muitas vezes, não têm acesso pela mídia convencional. Em 2006, vários sindicatos decidiram dar início ao projeto que viria a ser a Rede Brasil Atual, começando pela revista. Hoje, 60 sindicatos contribuem financeiramente para que a publicação saia. “Depois do governo, o movimento sindical hoje é a principal força social com capacidade para fazer uma comunicação independente. À medida que os sindicalistas perceberem a importância de socializar as informações com os trabalhadores a partir de notícias que eles não têm acesso, esse movimento estará prestando serviço para ajudar a mudar o Brasil. A Revista do Brasil, hoje tem uma tiragem de mais de trezentos mil exemplare/mês”. A primeira TV dos trabalhadores Diretor do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e da CUT, Valter Sanches apresentou a experiência da TV dos Trabalhadores, inaugurada em agosto passado. “Venho de um sindicato que já descobriu há muito tempo a importância de se investir na comunicação. É claro que a comunicação mais importante, insubstituível, é o olho no olho com o filiado. Mas é necessário também fazer comunicação de massa”. Segundo ele, a luta pela concessão de um canal de TV começou em 1997. “Em 2005, conquistamos concessões de duas rádios e duas TVs. Só agora, conseguimos colocar a primeira TV no ar”. Sanches conta que a TVT possui um quadro de 102 trabalhadores que geram uma programação diária diversificada das 19h às 20h30. “A ideia é que seja uma TV que dialogue com a sociedade. Não é uma TV que pretenda concorrer com as TVs comerciais ou educativas. Mas queremos que seja um canal importante para dar voz aos movimentos sociais, que ou são esquecidos ou são tratados de forma negativa pela mídia convencional”. A TVT, hoje, pode ser vista em 11 estados brasileiros e pela internet. Mais informações em http://www.tvt.org.br/portal
A Comunicação que queremos
“O jornal impresso não acabou”, dizem Beto Almeida e Vito Giannotti
Vito Giannotti, Cristina Braga e Beto Almeida [Por Sheila Jacob] “Nós precisamos desesperadamente de um jornal popular no Brasil, e temos todas as condições de tê-lo”. Foi com essa afirmação que o jornalista Beto Almeida deu início à sua fala na manhã de sexta-feira, 26 de novembro, na mesa sobre o futuro do jornal impresso. O jornalista, que é da Telesul e da TV Cidade Livre, emissora comunitária de Brasília, lembrou a queda nas vendas e até o fim de alguns jornais impressos, mas atentou para a necessidade de um veículo popular. Ele defendeu “um jornal impresso público, de massas, de preferência de circulação gratuita e aberto à participação da sociedade”, o que, segundo ele, é indispensável para a cidadania e para aperfeiçoar a democracia. Beto Almeida defendeu também uma política pública de edição e massificação de leitura do jornal. Isso porque, segundo ele, há deficiência de empregos para jornalistas, além da ociosidade de 50% da indústria gráfica brasileira em um país que precisa ler, mas que não tem acesso à leitura. O jornalista por fim defendeu que a Empresa Brasileira de Comunicação (EBC) tenha um jornal impresso, além da Agência de Notícias, da TV e da Rádio. "Estou defendendo a Constituição, e o Estado Brasileiro deve cumprir esse capítulo, já que o mercado não cumpre". O jornal, no Brasil, ainda não chegou. Lê-se pouquíssimo no país. Representando o jornal Brasil de Fato, do qual é um dos colaboradores, o coordenador do NPC Vito Giannotti começou respondendo à pergunta que a mesa propõe: “O jornal impresso acabou?”. Para ele, um verdadeiro jornal do Brasil ainda nem começou. Assim como fez Beto Almeida, Giannotti também defendeu um jornal diário público. Lembrando os quatro momentos de grande circulação de jornais no Brasil, o coordenador do NPC voltou a 1919 quando em São Paulo e em Recife surgiram, respectivamente, os jornais diários A Plebe e A Hora Social, ambos fechados pela repressão. Trouxe também o exemplo do Partido Comunista Brasileiro que em 1946 se legalizou e lançou oito jornais diários emvárias capitais. Além destes, na década de 1990 havia jornais sindicais diários, “num tempo em que nós, da militância de esquerda, havíamos percebido a importância da comunicação para nossas lutas”.
Para mostrar que o jornal impresso não acabou, Giannotti apresentou três periódicos atuais de distribuição gratuita e com grande circulação: o Desktak, do Rio; o Metro News, de São Paulo; e a Folha Universal, que possui uma tiragem de mais de 2 milhões de exemplares. Para concluir, Giannotti disse ser a favor das novas ferramentas da Internet, como twitter, blog e facebook, mas ressaltou que estas devem ser aliadas à produção e à distribuição de milhões de jornais impressos, com financiamento público, uma boa pauta e uma bela diagramação.
Convidados apresentam experiências em comunicação popular
. [Por Sheila Jacob] Professores e comunicadores que trabalham com mídia comunitária encerraram os debates de sábado, 27 de novembro, penúltimo dia do 16º Curso do NPC. Foram apresentadas experiências em rádios comunitárias, jornais, revistas, cartilhas e páginas na internet, mostrando o amplo espaço que é preciso ocupar para a importante disputa de hegemonia tão discutida ao longo do Curso.
A Associação Cantareira, localizada na região de Brasilândia, periferia de São Paulo, é um dos exemplos de investimento na comunicação popular. “Não basta estar no ar, é preciso ser comunitária”. Esse é o mote da Rádio Comunitária Cantareira 87,5 FM, conforme explicou o Padre Cilto Rosembach, um dos responsáveis por essa iniciativa. A emissora foi criada em 1995, mas dez anos depois a rádio foi fechada pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Foi apenas em julho deste ano que a rádio conquistou sua regulamentação, e em agosto as transmissões foram retomadas. Além da rádio, a Associação também criou, em 1996, o jornal Cantareira, e agora estão investindo na nova página, que vai ao ar em dezembro.
O jornalista Hamilton Octavio de Souza, editor da Caros Amigos e colaborador do Brasil de Fato, atentou para a importância de se construir uma mídia alternativa que de fato esteja ao lado do povo trabalhador, oprimido e excluído pela mídia burguesa, afinada com os interesses da classe dominante. Segundo ele, é preciso haver um enfrentamento sério ao modelo de sociedade que essa mídia defende. São dois modelos contrapostos: o da burguesia e o dos trabalhadores. A imprensa alternativa, popular e sindical deve travar uma verdadeira batalha contra-hegemônica: “Não basta termos jornais e emissoras se não tivermos linhas editoriais de fato críticas, que realmente sirvam para elevar o nível de consciência da nossa sociedade e contribuam para a organização dos trabalhadores”, observou. “Comunicação popular”: conceitos e práticas O jornalista Rozinaldo Miani, professor de comunicação da Universidade Estadual de Londrina, trouxe à discussão sua experiência na formação de profissionais. Em uma rápida avaliação identificou que o tema tem sido tratado em várias vertentes e defendeu a que veio sendo trabalhada ao longo do curso: a que diz respeito à comunicação produzida pelas organizações e movimentos sociais com uma perspectiva de questionamento. Ao final, Miani lançou uma provocação, lembrando que nas universidades não há muito espaço para que essa discussão apareça. “Quando me apresento como interessado em transformar meus alunos em sujeitos políticos que compreendem a sociedade em que estão inseridos, eles esperam que aquele espaço apenas sirva para a questão profissional”. Para Miani, esse tema da formação profissional é uma das questões que precisam ser enfrentadas, mas há outra que é tão ou mais importante que é a formação social, política e ideológica dos futuros comunicadores. Quem finalizou o debate foi o rapper Fiell, ex-aluno do curso de comunicação popular promovido pelo NPC e coordenador do Visão Favela. Fiell lembrou as iniciativas de comunicação no morro Santa Marta, onde mora: além da rádio comunitária recém-instalada, também foi lançada uma cartilha sobre Abordagem Policial para esclarecer os moradores sobre seus direitos e conscientizá-los dos abusos cometidos pelas instâncias de poder. Em relação às dificuldades financeiras de se criar e manter meios de comunicação, Fiell pediu a colaboração de sindicatos para fazer esses materiais. No fim avaliou que qualquer mídia alternativa deve falar a linguagem do povo. “Nossa preocupação deve ser como nos comunicar com todo aquele povo das favelas escravizado pela carteira de trabalho. A linguagem deve estar de acordo com a nossa realidade, com o nosso dia-a-dia”. Para encerrar, Fiell cantou o rap que abriu o 16º Curso Anual do NPC, mostrando o protagonismo dos trabalhadores, sempre identificados como coadjuvantes ao longo de nossa história. A discussão mostrou que uma comunicação construída pelos e para os próprios trabalhadores é o caminho para que isso comece a mudar.
Democratização da Comunicação
Comunicação digital: uma das frentes da batalha hegemônica
Martin Granovsky, Renato Rovai, Katia Marko, Silvio Mieli, Bernardo Joffily e Denise Simeão
[Por Sheila Jacob] O jornalista argentino Martin Granovsky, do Pagina 12, deu continuidade às discussões da manhã de sexta-feira, 26 de novembro, na mesa sobre “comunicação digital e a batalha hegemônica”. Além de defender os jornais alternativos impressos, ele chamou atenção para a importância da qualidade dessas publicações. Só assim poderá ser feito um enfrentamento aos ataques veiculados pela mídia contra governos como Chávez, Morales, Kirchner, Lula, Mujica, Kirchner e outros latino-americanos. “O Brasil precisa ter uma Pagina 12”, afirmou, se referindo ao jornal alternativo argentino no qual trabalha. “A mídia não tem que ser marginal do ponto de vista formal, estético e da modernidade, porque assim não vai chegar ao público nem vai conseguir propaganda. A exigência de qualidade dos jornais populares é cada vez mais alta. O Brasil tem capacidade de criar novos jornais diários alternativos”, ressaltou.
Otimista em relação ao poder comunicacional dos trabalhadores, o jornalista Bernardo Joffily lembrou que o século 21 nos deu exemplo das derrotas dos candidatos da mídia em 2002, 2006 e 2010. Para ele, que é fundador do Portal Vermelho, a eleição presidencial direta no Brasil e na América Latina se revelou como uma grande fragilidade do sistema dominante, pois a grande mídia teve que assumir seu papel de partido político. “Temos o privilégio de viver, nessa primeira década do século 21, uma revolução comunicacional de imenso significado para a nossa emancipação. E a Internet é a ponta de lança dessa revolução”, afirmou. Ele lembrou os exemplos do Pagina 12 argentino e do La Jornada mexicano, e disse ter a ambição de que sejam construídos grandes jornais de esquerda no país. “Isso tanto em relação aos de papel quanto na internet, além de avançar por outros meios, como TVs e rádios, para enfrentar a mídia deles”, concluiu. Clique aqui e veja a cobertura completa da mesa, com as falar de Silvio Mieli, Renato Rovai e Denise Simeão!
TV Pública: debate novo para o povo brasileiro
[Por Gizele Martins] “TV pública” também foi tema de debate no 16°Curso Anual do NPC. A mesa, realizada na tarde do dia 26 de novembro, teve a presença do jornalista Arthur Willian, da TV Brasil e colaborador do NPC; da jornalista Bia Barbosa, do Intervozes; e do jornalista Laurindo Leal Filho, professor de Comunicação da USP e ouvidor-geral da Empresa Brasil de Comunicação (EBC). Uma das questões levantadas pelos palestrantes foi o atraso do Brasil neste assunto, já que outros países já cobraram do Estado este serviço público e já estão colocando em prática. A Telesul é um dos exemplos da América Latina. Laurindo Leal, Ana Lúcia Vaz, Arthur William e Bia Barbosa
Para Laurindo Leal, o Brasil só conseguirá se contrapor à mídia hegemônica quando tiver uma TV Pública, feita pela sociedade. “Teríamos que ter, pelo menos, três tipos de programação: uma que tente acompanhar o gosto da maior parte do povo brasileiro, com interatividade, mas que tenha um conteúdo crítico. A outra seria um canal 24 horas de notícia contrapondo a mídia hegemônica. A Telesul é um exemplo aqui na América Latina que deu certo. E a terceira seria um canal infantil, com programação feita para crianças e adolescentes”, disse. Bia Barbosa lembrou que as crises em que muitas vezes as emissoras públicas educativas se encontraram fizeram com que muitas se transformassem em Organizações Sociais ou Fundações Públicas de Direito Privado. “Esta mudança permitiu que recebessem recursos de patrocínio e publicidade institucional. As demais formas de canais considerados do campo público (universitários, comunitários, legislativos) foram criadas no bojo da regulamentação do serviço de TV a Cabo (Lei 8977/1995). Porém estão restritos a quem tem condições de comprar o sinal de uma televisão a cabo”, concluiu. A democracia só vai avançar quando existir um canal voltado para o povo, principalmente, quando se trata da TV, o veículo mais popular de todo o país. Mas, de acordo com o professor Laurindo, a sociedade precisa avançar neste debate. “Passamos anos achando que este não é um tema que podemos discutir, fomos acostumados a isso. A população não tem ideia de que podemos fazer outro tipo de programação. Só há poucos anos conseguimos fazer com que os movimentos sociais se interessassem por este assunto, mas ainda estamos sem conteúdo, sem preparo para encarar este desafio de frente”, finalizou. Leia abaixo a resolução da Confecom: PL 37: Instituir a figura do Operador Nacional de Rede Digital Pública a ser gerido pela EBC, cabendo a este operador propiciar as plataformas comuns de operação para todas as emissoras públicas de televisão. PL 45: Garantir condições técnicas necessárias para que os sinais analógicos e digitais das emissoras públicas atinjam todos os municípios. Mais informações nos sites: www.intervozes.org.br // www.direitoacomunicacao.org.br
De Olho Na Mídia
A mídia e as eleições de 2010
[Por Laudenice Oliveira] “Mídia no Brasil e Eleições de 2010”. Esta foi a mesa que fechou o terceiro dia do 16º Curso Anual do NPC. Para analisar o papel que a mídia desempenhou durante o processo eleitoral brasileiro, formou-se uma mesa de debate com Altamiro Borges, do Centro Barão de Itararé; Ivan Pinheiro, da Casa da América Latina; o jornalista Gilberto Maringoni; o professor Valério Arcary, do Instituto Federal de São Paulo; o professor Gabriel Mendes, da FACHA; e Breno Altman, do Ópera Mundi. A um consenso todos chegaram: a mídia brasileira mais do que nunca deixou clara a sua face conservadora nestas eleições. Nunca foi tão transparente a sua defesa do capital e da classe dominante do Brasil. . Acompanhe trechos das análises feitas por esses representantes dos segmentos de esquerda e estudiosos do mundo da comunicação. .
Valério Arcary, Breno Altman, Gilberto Maringoni, Renato Rovai, Gabriel Mendes, Ivan Pinheiro e Miro .
Valério Arcary: Hoje a mídia burguesa representa nossa derrota política Para Valério Arcary, a partir dos anos 80 um dos elementos de consolidação dos regimes democráticos passou a ser a força da mídia, hoje com peso superior ao da década de 30. Isso porque, como ele analisa, no século 20 havia movimentos que enfrentavam as idéias e a ordem do capital. As entidades de classe, como os sindicatos, intermediavam as relações do mundo cotidiano com o do trabalho. Eles tinham a sua própria imprensa que dialogava com os operários e possibilitava um pertencimento ao movimento. Isso gerava credibilidade e permitia que os trabalhadores tivessem a sua interpretação de mundo dentro de uma outra lógica. Para Arcary, isso hoje não existe mais; a mídia burguesa se tornou maior. “Isso representa uma derrota política e até material para a classe trabalhadora”, declara. Segundo o historiador ainda há muito que se avançar no setor da regulação da mídia do Brasil. De acordo com ele, o Governo Lula, apesar de fazer críticas pontuais à mídia brasileira, teve duplicidade de tratamento neste segmento. Breno Altman: Meios burgueses de Comunicação de Massa são Partidos Na sua palestra, Breno Altman defendeu que o fortalecimento dos meios de comunicação no Brasil não é um fenômeno da fraqueza orgânica do capital. Para ele, as eleições no Brasil são a síntese do processo de fusão do poder econômico e político. Altman ressaltou o oligopólio da mídia controlada por poucos grupos, numa situação em que 70% do que se lê, se ouve e se assiste no país é determinado por eles. “Esse ambiente desgasta ao máximo as experiências dos trabalhadores e estabelece a negação dos valores de esquerda”, analisa. Na sua avaliação, nessas eleições houve uma mudança de perfil, pois os meios de comunicação de massa assumiram a campanha eleitoral quase abertamente, como foi o caso do Estadão. Outros colocaram algum verniz, mas apresentavam a mesma postura. Segundo Altman, o território da comunicação foi onde o governo Lula não avançou, chamando atenção para a importância da regulamentação da mídia. Breno concluiu para a necessidade da regulamentação da mídia, como acontece em vários países. Veja os trechos dos outros palestrantes em nossa página!
De Olho Na Vida
Quando a favela descer... nada mais será como antes!
[Por Gizele Martins] “A década do medo: mídia, violência e UPP” foi um dos temas mais esperados pelos participantes do Curso do NPC, já que o tema violência não sai das páginas dos jornais cariocas, principalmente nos últimos dias. No início, a coordenadora do NPC Claudia Santiago, que mediou a mesa, falou de quando começou a perceber que a luta do trabalhador, do sindicato, era também a luta da favela. “Fui cobrir um protesto feito por moradores do Morro do Borel há sete anos quando a polícia assassinou diversos moradores daquela favela. Um deles era o filho de Maria Dalva da Silva, que hoje milita para que outras mães não sofram o mesmo. Naquela manifestação não vi nenhum sindicalista, e isso me fez perceber que o sindicato deve participar da luta do povo”, disse Claudia. Logo depois de sua fala, Maria Dalva foi homenageada pela sua força e luta ao som da música Pedaço de mim, de Chico Buarque. “Eu não perdi o Tiago, apenas o devolvi para Deus!”, declarou. Orlando Zaconne, Pedro Strozenberg, Claudia Santiago, Márcia Jacintho, José Arbex e MC Leonardo
Zaccone: Desvincular a favela do crime é a solução! O delegado Orlando Zaccone alertou que é preciso que os jornalistas tenham um olhar crítico sobre o tema que envolve a favela, a violência e o crime. “Os jornalistas e toda a sociedade precisam desvincular a favela da violência e do crime. É necessário também fazer resgates históricos e diferenciar cada acontecimento”, disse. Ele também aponta que, para a favela deixar de ser criminalizada, a saída é resgatar os fatos e desvincular todo o fenômeno da desigualdade social da política de segurança pública. “Não cabe à polícia criar ordem, a função que a polícia tem é a de manutenção. A desordem existe porque há uma sociedade desigual”, concluiu. Márcia Jacintho: Um olhar próximo da realidade “Tem muita gente aqui que acredita no que a televisão mostra, mas tem muita gente aqui que não vive o que a gente vê na TV. Tem gente que acredita que aquele corpo que desceu do morro foi um traficante. Já está se banalizando a vida e eu fico indignada com isso”. Essas são as palavras da moradora do Complexo do Lins, Márcia Jacintho, mãe de um adolescente vítima da violência policial do Rio de Janeiro. Sua indignação contagiou todos os quase trezentos participantes que lhe assistiam. Márcia contou a experiência de ter investigado sozinha o assassinato do filho, fato que não recebeu atenção merecida já que se tratava de um favelado. “Sou negra, pobre e moradora de favela, mas também sou sociedade e exijo respeito. Tive coragem de descer o morro para investigar o caso sozinha e limpar o nome do meu filho”, disse. Além de enfrentar a dor de ter perdido um filho, Márcia teve que encontrar coragem para provar para o mundo que os direitos humanos precisavam valer também para o seu filho. “Eu nunca dependi do Estado para dar o leite aos meus filhos, mas uma bala tirou a vida de um deles”, concluiu. José Arbex: A polícia é violenta porque a sociedade é Para o jornalista José Arbex, a polícia só é violenta porque a sociedade é violenta e aplaude as barbaridades feitas dentro das favelas. De acordo com ele, existe uma classe média e parte do povo pobre que apóiam a violência. “Vi uma entrevista que dizia que o Rio vive numa guerra e que o povo deve cooperar e ajudar a polícia. Como é possível assassinar milhões de pessoas e depois dizer: ‘eu não sabia disso’?”, completou. De acordo com o jornalista, a responsabilidade da crença de que a favela é criminosa e de que é preciso resolver a desigualdade social com violência também é dos jornalistas. “Não é possível, não é admissível que o sindicato não coloque em pauta a favela, o morticínio. Se tivesse uma resistência organizada no país, não falariam isso do povo na televisão. Estamos quietos, estamos calados. Quando os favelados se levantarem e falarem, ‘chega’, é aí que vai acontecer a revolução. Não é no sindicato, não é o jornal sindical. É na favela”, finalizou. Pedro Strozenberg: Estamos numa democracia, ela precisa ser radicalizada, mas ela existe O Subsecretário de Direitos Humanos do Estado, Pedro Strozenberg, teve papel essencial na mesa. Ele trouxe explicações sobre o que é a Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) e disse acreditar na UPP Social, mas que ela deve ser feita de dentro da favela para fora, pensada e realizada com a sociedade civil. “Esta é uma democracia incompleta, que precisa se radicalizar. Vejo a UPP como um caminho de transição, são passos. Acho que hoje temos uma polícia diferente do que tínhamos há 15 anos. A polícia está passando por uma transformação interna”. Segundo ele, a presença do Estado na favela tem sido a polícia, mas na verdade deveria ser a educação, a saúde, o lazer. Para ele, o desafio é criar mecanismos que envergonhem o policial em suas práticas ilícitas, e a UPP Social pode ser uma possível mudança. Mc Leonardo: Chega da favela chorar!
Para Mc Leonardo, presidente da Associação dos Profissionais e amigos do Funk (Apafunk ), o Rio está vivendo o resultado da criminalização da favela, pela qual tudo se resolve com a violência. “Se esta prática que acontece há décadas funcionasse, de entrar nas favelas e massacrar todos, o problema da violência e do crime organizado já teria sido resolvido. As ações nas favelas não podem ser imediatas. O que o Estado faz é colocar na favela carros blindados para acalmar a classe média. Nós somos vítimas ou somos culpados?”, questionou. Para ele, a mídia tem papel fundamental nisso tudo, já que ilustra o pobre, o negro e o favelado sempre como marginal. Segundo ele, para mudar essa história é necessário que o povo participe das reuniões de todas as secretarias, que se junte a outras lutas, a outras resistências.
Governantes fazem limpeza urbana no Rio e a mídia é a grande apoiadora
[Por Gizele Martins] Além das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) e da entrada do Exército nas favelas cariocas, outro tema também em pauta no Rio de Janeiro é a remoção, assunto da primeira mesa do sábado, dia 27 de novembro, penúltimo dia do curso do NPC. Desde o anúncio de que a cidade seria sede da Copa do Mundo e das Olimpíadas, mais de cem favelas foram ameaçadas de remoção. Elas se organizaram, buscaram respostas da Prefeitura, tentaram negociações, mas hoje estão vivenciando a derrubada de suas casas. .
A primeira a falar foi a professora da USP e relatora da ONU, Raquel Rolnik. Como ela analisa, o povo no Brasil precisa construir a sua própria casa porque o Estado tira da sua responsabilidade este direito. “As pessoas acabam hoje tendo que criar sua moradia com as próprias mãos, com os próprios custos. Esse cidadão não recebe nenhum tipo de apoio, e com o seu salário mínimo isso não é possível. O Estado tirou a sua responsabilidade nisso e destinou esses locais, as favelas, a áreas de risco”, disse a relatora da ONU. . Maria Lúcia Pontes, Defensora Pública do Rio, afirmou que o Estado não oferece condições de moradia para os pobres, e o povo precisa construir a sua habitação. “É o povo que constrói a sua casa, a cidade, mas não tem o direito de decidir sobre o próprio local onde vai morar com a família. A mídia defende isso: ela criminaliza o pobre e apóia o Estado”, falou a defensora. Ela tem atuado na defesa da moradia digna, já que este é um direito pleno que consta na Constituição Brasileira. . Grandes eventos são usados para justificar remoções .
Altair Guimarães, Sheila Jacob, Raquel Rolnik e Guilherme Marques .
Por causa dos mega-eventos, moradores de favela e defensores de direitos humanos já alertavam para o risco de remoções e toda a ideia de limpeza urbana acontecerem novamente no Rio, assim como foi feito na época do PanAmericano. Em 2007, diversas favelas foram removidas e o Morro do Alemão também sofreu com a chacina de 19 pessoas. Guilherme Marques, pesquisador da UFRJ e colaborador do NPC, trouxe este resgate histórico. Ele ampliou o debate, dizendo que a “Cidade Maravilhosa” virou uma empresa pronta para obter lucro. “Esta é uma imagem de uma cidade à venda, que seus trabalhadores e moradores são vistos como cordeiros que não podem se manifestar, e se tentarem, vão ser criminalizados e até mortos”, avaliou. . Altair Guimarães, morador e presidente da Associação de Moradores da Vila Autódromo, comunidade localizada em área nobre da Zona Oeste, também está na lista das remoções. Há um ano eles se organizaram junto a outras favelas e tentaram uma negociação com a Prefeitura, o que não foi feito. “Já passei por duas desapropriações. Moro na Vila Autódromo há 16 anos e querem nos tirar porque ela está num local nobre”, contou. De acordo com ele, depois da desapropriação as famílias sofrem mais com a tentativa de organizar a vida, já que a história da comunidade é abalada. . Importância da mídia alternativa . Diante de todos estes desafios e contradições, a chamada “grande mídia” tem papel fundamental nisso. Com o seu poder tem conseguido influenciar toda a população a favor dos mais ricos, caracterizando o povo pobre como culpado apenas por existir. O jornalista Gustavo Barreto, também colaborador do NPC e participante da Rede Nacional de Jornalistas Populares (Renajorp), disse que a solução para minimizar a influência da mídia hegemônica e reunir força para lutar contra tudo isso é fazer um meio de comunicação voltado para o povo. E defende que este meio venha disputar a notícia. “No Brasil, nós não temos uma política de remoções, e nenhum jornalista questiona isso, eles apenas aceitam. Não temos a mídia do nosso lado. É preciso fazer a nossa, investir nela para contrapor a tudo isso”, finalizou Barreto. A conclusão dos participantes da mesa foi a mesma: os jornalistas populares e os moradores de favela precisam construir os seus próprios meios de comunicação.
Convidados debatem relação entre comunicação e valores culturais
[Por Marina Schneider] A mesa “Comunicação e valores culturais: África, América Latina e Brasil”, realizada na tarde de quinta-feira (26/11) reuniu a historiadora Adelaide Gonçalves, a psicóloga Roseli Goffman e o filósofo, poeta e membro do MST, Ademar Bogo. Roseli Goffman, Sheila Jacob, Ademar Bogo e Adelaide Gonçalves
. Roseli Goffman, do Conselho Federal de Psicologia, falou sobre a atuação do Conselho na área da comunicação, principalmente no que diz respeito à mobilização pelo controle social na área. “A mídia é um dos grandes componentes que influencia a formação de subjetividade. A carga de informação que recebemos diariamente é intensa, sendo a televisão um objeto chave neste processo”. A psicóloga afirmou que a cultura do consumismo e do “shopping center” é a que prevalece hoje e é disseminada pelos meios de comunicação. “Os meios de comunicação de massa omitem assuntos que interessam à transformação da sociedade”, disse, reforçando que não é possível mudar os valores culturais de quem assiste à televisão desde a infância sem que haja participação nas instâncias de controle social. Por isso advertiu: “O crime é criminalizar o marco regulatório”. . Somos todos Severinos ; O filósofo Ademar Bogo, do MST, começou sua fala declamando a poesia Morte e Vida Severina, de João Cabral de Melo Neto. Para ele este é um hino que traz a marca de uma cultura inversa àquela transmitida pelos meios de comunicação de massa, que é a cultura do capital. “A cultura e a comunicação não estão separadas e fazem parte desta produção histórica que somos nós”, disse. Para ele, o aprendizado comum de relações sociais não passa pela mídia e nem pelas relações do capital. Passa por fora da ordem, com povos que ousam fazer a sua própria história. Bogo lembrou o intelectual peruano José Carlos Mariátegui como um dos primeiros latino-americanos a tratar a comunicação como um processo cultural. Segundo ele, a imprensa deve ter um papel pedagógico, educativo, mas que o que a grande mídia faz é deseducar, individualizar problemas e para isso não é necessário de debate. . Mulheres de luta . Antes de iniciar a fala sobre o tema da mesa, a historiadora Adelaide Gonçalves comentou sobre o livro/agenda produzida pelo NPC para o ano de 2011 “Mulheres na História”. Ela destacou a importância de Nízia Floresta e Patrícia Galvão (Pagu), citadas na publicação. Em relação à África, Adelaide alertou que nossa ignorância acerca do continente é imensa, não só nas universidades e na mídia, mas também nos movimentos sociais. Ela apresentou um panorama de como o Brasil é retratado desde a época da invasão portuguesa e afirmou que, dos anos 1930 para cá, esse debate sobre os valores culturais foi adquirindo contornos mais apropriados. . . De Olho No Mundo
Jornalista Martin Granovsky, do Página 12, participou da mesa "A comunicação digital e a batalha hegemônica"
Foto: João Zinclar . [Por Marina Schneider] O jornalista Martin Granovsky participou da mesa "A comunicação digital e a batalha hegemônica" no16º Curso do NPC. Granowsky é licenciado em História e jornalista. Esteve de 1987 a 2005 no jornal argentino Página/12, onde foi desde redator até o cargo de subeditor. De 2005 a 2009, presidiu a Agência Nacional de Notícias da Argentina (Telam). Hoje está de volta ao Página/12 como colunista, tem um programa de rádio e estreia em breve a apresentação de um programa de televisão. Leia a entrevista completa!
Imagens da Vida
Documentário fotográfico O Rio São Francisco e as Águas no Sertão
[Por Ana Lúcia Vaz] Uma bela viagem pelas águas do rio São Francisco e do Sertão Nordestino. Isso mesmo! Belos e inundados açudes, no sertão para onde o governo promete levar as águas do São Francisco. “O governo diz que vai levar água para os pobres. Mas ela vai mesmo é para onde já tem água”, afirma João Zinclar. E prova, através de um maravilhoso documentário fotográfico recém-publicado: O Rio São Francisco e as Águas no Sertão. São 70 mil açudes espalhados pelo sertão, com enormes espelhos d’água. Depois de percorrer boa parte deles, seguindo o trajeto da transposição das águas do Velho Chico, o fotógrafo constatou: “Falta água para a população porque ela está sendo usada nas grandes plantações e na produção de camarão”. Portanto, a solução, segundo o repórter fotográfico, é a racionalização e democratização de seu uso. Nos lugares onde realmente não tem água, ela não vai chegar. “Quem vai se beneficiar é o agronegócio exportador”, garante Zinclar. Entre 2005 e 2010, João Zinclar fez dezenas de viagens ao longo das margens do Velho Chico e pelo sertão nordestino. Documentou a natureza e o ser humano. Água, vegetação, animais selvagens, festas, vida e luta das comunidades tradicionais. Também documentou a poluição do Chico pela indústria e pelo agronegócio, o assoreamento do rio e o início das obras de transposição. “O rio precisaria de uma revitalização”. Já a transposição, segundo Zinclar, “é uma obra da oligarquia nordestina!”. O livro começou com uma proposta apenas documental e terminou como um manifesto contra a transposição do rio São Francisco. Recebeu apoio do jornal Brasil de Fato e de vários jornalistas e o financiamento de sindicatos. Para Zinclar, o movimento sindical tem que incorporar as questões ambientais e, entre elas, o conflito sobre o uso e controle da água. Seu livro-fotográfico é, antes, um documentário que revela a importância da luta de quilombolas, índios e trabalhadores rurais pela terra e pela água.
O livro é, portanto um belo passeio pelo interior do país. Belo pelas imagens e pelas mensagens. Sensível à estética, à vida e às lutas. Vale a pena! Para obter mais informações e comprar o livro, entre em contato com o fotógrafo João Zinclar pelo telefone (19) 9121 8425 ou pelo e-mail joaozinclar@yahoo.com.br.
Memória
16º Curso lembra os 100 anos da Revolta da Chibata
João Cândido, em foto de 1964 Crédito: Adalberto Rocha/CPDOC JB [Por Katia Marko] O historiador e jornalista Marco Morel participou na quinta-feira, 25/11, de uma homenagem aos 100 anos da Revolta da Chibata e a João Cândido. Marco Morel é neto do repórter Edmar Morel, autor do livro A Revolta da Chibata. O historiador apresentou uma série de fotografias históricas para resgatar a rebelião que envolveu 2.300 marinheiros em 1910 sob a liderança de João Cândido. Naquela época os marinheiros, na maioria pardos e negros, ainda apanhavam de chibata, mesmo depois da assinatura da Lei Áurea, em 1888. Muitas foram as tentativas pacíficas de acabar com a violência, mas nenhum sucesso foi obtido. Então os marujos se organizaram, e no dia 22 de novembro de 1910, tomaram os principais navios de guerra da Marinha, exigindo o fim dos castigos. O movimento foi vitorioso.
Segundo Morel, foi seu avô que pela primeira vez retratou a vida do líder da revolta, o marinheiro negro e filho de escravos João Cândido Felisberto (1880-1969). Apelidado de “Almirante Negro”, sua história inspirou a música Mestre-Sala dos Mares, de João Bosco e Aldir Blanc, composta na década de 1970. “Uma das curiosidades dessa história é que tanto o autor do livro quanto o personagem principal foram perseguidos por seus feitos. Após a vitória do movimento, o gaúcho João Cândido foi preso por um tempo, sofreu torturas e foi expulso da Marinha. Morreu aos 89 anos, pobre, trabalhando na Praça XV, no Rio de Janeiro. Edmar Morel tornou-se um dos mais famosos jornalistas brasileiros, mas depois da publicação do livro, sofreu perseguições e foi impedido de ser repórter com o advento do golpe de 1964”, contou Morel. A homenagem foi encerrada com a música do Almirante Negro, Mestre Sala dos Mares, cantada a capela pelos bravos participantes do Curso que resistiram até o final do dia.
Dicas
Filme Ao Sul da Fronteira
. A exibição do longa Ao Sul da Fronteira no Cine Odeon, marcou o encerramento do 16º Curso Anual do NPC. O filme é dirigido por Oliver Stone, e o roteiro é baseado no livro Piratas do Caribe, de Tariq Ali. O documentário vai na contracorrente da mídia tradicional ao analisar as mudanças em curso na América Latina protagonizadas pelos governos da Bolívia, Equador, Argentina, Brasil, Paraguai e Venezuela, com foco neste último. Entrevistas e imagens de telejornais mostram como se dá a orientação norte-americana na cobertura midiática mundial sobre esses países. Mentiras e manipulações são postas em jogo para demonizar esses governantes, que representam uma ameaça à hegemonia dos Estados Unidos no continente. O filme encerrou o Curso com chave de ouro, pois mostrou a importância da comunicação alternativa para fazer frente a todos esses ataques. Ao final da exibição, a cientista social Vânia Bambirra e o economista João Pedro Stédile, do MST, participaram de um debate sobre conjuntura nacional e latino-americana. Para baixar o filme, acesse http://www.imovierj.com/2010/11/ao-sul-da-fronteira-2009-south-of.html
Vídeos: Cidade de Latas, Guerra das Privadas e Fahrenheit 2010
Os filmes aqui indicados foram sugeridos pelos palestrantes da mesa “Mega-eventos, cidades, mídia e movimentos sociais”. Os vídeos mostram as “heranças” deixadas pela Copa na África do Sul: uma política de “limpeza social” que segregou moradores de ruas e pobres; a falta de participação popular no evento, quase inteiramente frequentado por turistas; e a ausência de melhorias para a população local: mesmo depois de toda atenção mundial estar voltada para o país os sul-africanos ainda sofrem de problemas de saúde pública, educação, saneamento e alto nível de pobreza. Confira os vídeos:
Cidade de Latas
Guerra das Privadas
Fahrenheit 2010
Livro O Poder das Barricadas
. O Poder das Barricadas, de Tariq Ali, recupera os principais acontecimentos políticos da Europa, Ásia e Américas da década de 1960, principalmente do ano de 1968. Foi um tempo de auge das utopias, quando jovens do mundo todo se manifestavam contra a Guerra do Vietnã e contra a colonização nos continentes africano e asiático. A luta contra o autoritarismo e a repressão resultou em diversas mobilizações, revolução dos costumes e politização da arte. A obra retrata o que o autor chama de “tempos de esperança”, incluindo uma entrevista feita com John Lennon e Yoko Ono. Tariq Ali foi um dos palestrantes do 16º Curso Anual do NPC. Essa é apenas uma das várias obras do autor que merecem ser conhecidas para impulsionar novas formas de luta e engajamento, recuperando a crença de que é possível e cada vez mais necessário transformar o mundo. Quem tiver interesse em adquirir um exemplar, basta entrar em contato com o NPC pelo e-mail boletimnpc@uol.com.br
Novas entrevistas em nossa página
Beto Almeida: “Precisamos fazer nascer no Brasil uma mídia alternativa à ditadura midiática privada”
[Por Marina Schneider] O jornalista Beto Almeida, da Telesul e da TV Comunitária de Brasília, falou sobre o futuro do jornal impresso no 16° Curso Anual do NPC. Nessa entrevista, ele defendeu um jornal público de massas e de grande tiragem. Segundo o jornalista, a experiência negativa que tivemos com a mídia nessas eleições e os exemplos positivos da mídia pública na América Latina revelam essa importância. Confira a entrevista completa.
MC Leonardo fala sobre mídia, violência e criminalização do funk
[Por Marina Schneider] O presidente da Associação dos Amigos e Profissionais do Funk (Apafunk) MC Leonardo esteve de volta no 16º Curso Anual do NPC para falar sobre mídia, violência e UPPs. Sua primeira participação havia sido em 2008 quando, ao lado da professora Adriana Facina, da UFF, rompeu preconceitos ao defender o funk como manifestação cultural e esclarecer sua importância na divulgação da voz da favela. Nessa entrevista, MC Leonardo fala sobre a trajetória da Associação, a importância do funk como veículo de comunicação alternativa e a necessidade da mobilização e participação popular, além de falar sobre o filme Tropa de Elite. Confira a entrevista completa.
Silvio Mieli defende cultura digital rica e mais humana
[Por Marina Schneider] Entrevista com o jornalista e professor da Faculdade de Filosofia e Comunicação da PUC-SP, Silvio Mieli, que participou da mesa “A comunicação digital e a batalha hegemônica”. Confira a entrevista completa.
Expediente
Núcleo Piratininga de Comunicação
Rua Alcindo Guanabara, 17, sala 912 - CEP 20031-130 Tel. (21) 2220-5618 / 9923-1093 www.piratininga.org.br / npiratininga@uol.com.br
Coordenação: Vito Giannotti
Edição: Claudia Santiago (MTB.14915) Redação: Sheila Jacob Web: Luisa Vieira Souto
Colaboraram nessa edição: Ana Lucia Vaz (RJ), Gizele Martins (RJ), Katia Marko (RS), Laudenice Oliveira (PE), Marina Schneider (RJ), Najla Passos (DF), Tatiana Lima (RJ).
Se você não quiser receber o Boletim
do NPC, por favor, responda esta mensagem escrevendo REMOVA.
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