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Hora de entrar no jogo: para além de enfrentar monopólios, marco regulatório do setor no Brasil pode balizar participação da sociedade
Publicado em 29.12.10 - Por Eduardo Sales de Lima, da Agência Brasil de Fato Com a chegada das empresas de telefonia, que podem produzir e veicular conteúdo midiático, os poucos proprietários de canais de rádio e televisão estão se movimentando para defender o “seu”. Quer dizer, querem uma regulamentação para que se impeça a entrada dessas empresas no ramo. Para o velho oligopólio midiático, o principal motivo para a necessidade de regulação é a diferença de faturamento (com valores de 2009) entre o setor de radiodifusão (R$ 13 bilhões) e de telecomunicações (R$ 180 bilhões). Entretanto, para os defensores da democratização da comunicação no Brasil, a implementação de um marco regulatório no setor de comunicações vai muito além do estabelecimento das regras de mercado para a garantia de competição ou da gestão do espectro eletromagnético. Abarca, sobretudo, a regulação do conteúdo e o direito do cidadão comum ser beneficiado por uma programação midiática mais diversa e plural, livre da influência mercadológica. Para o professor da Universidade de São Paulo (USP), Laurindo Leal Filho, “a concessão pública [de radiodifusão] é outorgada pelo Estado em nome da sociedade; portanto, a sociedade tem o direito de criar mecanismos para acompanhar o uso desse espaço pelos concessionários”, esclarece. Segundo ele, quem faz isso em vários países do mundo são as agências reguladoras, formada por representantes do governo, dos empresários e das organizações sociais. Laurindo exemplifica que as agências reguladoras de alguns países que julgam uma determinada reportagem veiculada de forma tendenciosa, distorcendo ou mentindo, têm o poder de estabelecer a mediação entre o cidadão que reclamou e a empresa. Se for o caso, segundo conta, têm o poder de exigir desta uma retificação, uma resposta. “Agora, nunca proibindo nada. Tudo sempre a posteriori. Um órgão que faz muito bem isso é o inglês, que se chama Ofcom”. O ministro Franklin Martins, da Secretaria de Comunicação Social da Presidência (Secom), preparou, juntamente com sua equipe, um anteprojeto de lei para regulamentar os meios de comunicação e modernizar a legislação midiática atual. Segundo Martins, a intenção é que o governo Dilma já assuma com esse tema em debate no Legislativo. “Por que não temos que ter produção regional, nacional, independente? Por que não temos que observar princípios de equilíbrio, de proteção ao menor, de não permitir estímulo à discriminação, coisas gerais que existem em todos os países democráticos no mundo?”, questionou, em seminário sobre comunicação realizado pela TV Cultura, em novembro. “Controle social” Para o professor Laurindo Leal Filho, o estabelecimento de um marco regulatório para o setor de comunicação e a criação de uma agência reguladora independente não têm nada a ver com o debate sobre liberdade de expressão, como a mídia comercial tem insistido. “A Constituição brasileira já determina os limites e garante a liberdade de expressão”, pontua. O debate abrange outro viés. Jornais como O Estado de S. Paulo, Folha de S. Paulo e O Globo têm desvirtuado a discussão sobre a necessidade de um marco regulatório para a comunicação no Brasil, afirmando que se trata de uma manobra do governo federal para controlar ou censurar as informações produzidas. É por isso que Franklin Martins tem se declarado “inteiramente contra a expressão controle social da mídia”.“O governo não votará a favor de nenhuma proposta que inclua o termo controle social da mídia, porque é ambígua”, afirmou, no seminário realizado pela TV Cultura. A expressão “controle social” em países como o Brasil, segundo Sivaldo Pereira, membro do Intervozes e responsável por um estudo de órgãos reguladores da mídia em dez países, juntamente com Ramênia Vieira da Cunha (leia entrevista na página 10), tem ganhado vários significados e é objeto de disputa quando é transportada para o campo da comunicação. Para ele, as posições mais à direita ou mais liberais tendem a associar “controle social” com controle autoritário, estatal ou antidemocrático; em seguida, de acordo com Sivaldo, isso logo é remetido à censura e à ditadura. Apoderamento Por outro lado, o integrante do Intervozes mostra que as posições mais à esquerda falam de controle social ou controle público pensando em participação civil no acompanhamento da regulação do setor e prestação de contas por parte das empresas de comunicação em relação aos seus atos. Esse sentido, de acordo com ele, está mais próximo do ideal da prestação de contas do que de ditadura estatal. “Mais importante do que essa disputa terminológica é a prevalência da noção de que os meios de comunicação devem ser sensíveis à participação do público e respeitar princípios democráticos, garantindo independência e prestando contas de seus atos ao cometerem erros”, explica Sivaldo. Historicamente, segundo o pesquisador, golpes, ditaduras e guerras sempre foram combatidos pela imprensa livre mas, também, tais eventos foram e são sustentados por uma imprensa que se diz livre e imparcial, mas que defende claramente seus próprios interesses privados. “Embora não estejamos mais numa ditadura, o Brasil sofre desse mal”, pontua. Para Ramênia Vieira da Cunha, também membro do Intervozes e corresponsável pelo estudo, levando em consideração o que diz a Constituição Federal – e que o controle social está presente em áreas como a saúde e a educação –, a sociedade tem o direito de participar da formulação, acompanhamento e avaliação das políticas públicas no setor da comunicação. “Ou, de outra forma: o controle social fortalece a democracia”, afirma. Ela afirma que não se trata de interferir na prerrogativa que cada empresa tem de decidir o que vai veicular, mas de estabelecer o que não pode ser veiculado, já que se usa o espaço público de transmissão das ondas eletromagnéticas. “E o que não pode ser veiculado é tudo aquilo que agride os direitos estabelecidos, que não preserva a dignidade humana e que causa discriminação e preconceito, seja contra cor, sexo, idade, religião ou condição física”, ressalta. Segundo Ramênia, o que observamos na programação televisiva brasileira, “infelizmente”, são os casos frequentes de violação desses direitos; “o que é ainda mais inadmissível quando a empresa que exerce a comunicação tem uma concessão pública para operar”, destaca.
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