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Dossiê denuncia violações de direitos por causa dos megaeventos no Rio
Publicado em 21.4.12 - por Sheila Jacob
Foto: Renato Cosentino (Comitê Popular da Copa e Olimpíadas)
Altair Guimarães, Marcelo Edmundo, Raquel Rolnik e Orlando Júnior no lançamento do dossiê
Na quinta-feira, 19 de abril, foi lançado o dossiê Megaeventos e Violações dos Direitos Humanos no Rio de
Janeiro, elaborado pelo Comitê Popular da Copa e Olimpíadas do Rio. A
publicação foi feita para denunciar o desrespeito aos direitos fundamentais dos
moradores da cidade devido aos jogos mundiais que nela serão realizados. Além
de conscientizar a população brasileira e as autoridades públicas para o que
está acontecendo, o objetivo do documento é mobilizar cada vez mais movimentos sociais,
sindicatos e organizações de esquerda para a construção de outro projeto:
popular, democrático e coletivo, que privilegie a maioria da população, e não
apenas as grandes empresas e os grupos dominantes.
Na atividade de lançamento foi realizado um debate com o tema “Esporte, Paixão e Negócio”. Estiveram presentes a Relatora Especial
da ONU para o Direito à Moradia Adequada, Raquel Rolnik; o Presidente da Associação de Moradores da Vila Autódromo,
Altair Guimarães; e o professor
do IPPUR/UFRJ, Orlando Santos Júnior. A mesa foi mediada por Marcelo
Edmundo, da Central dos Movimentos Populares, que explicou que não apenas
o Rio, mas todas as cidades que sediarão os megaeventos estão sofrendo
violações de diversos direitos. “Essa violência vem sendo praticada em nome de
projetos que não atendem os interesses do povo, mas do grande capital.
No caso do Rio, todos sentem os efeitos desse modelo: tanto aqueles que são
vítimas diretas das remoções, quanto a população que diariamente paga o alto
preço da especulação imobiliária”, comentou Edmundo na abertura do debate.
Remoções são orientadas por interesses
imobiliários
Foto: Adriana Medeiros
Raquel Rolnik (Relatora Especial
da ONU para o Direito à Moradia Adequada)
Raquel Rolnik avaliou que há megaoperações imobiliárias em
curso no Rio, com a mobilização de capitais financeiros para se apropriar de
certas áreas da cidade e valorizá-las com investimentos ligados à Copa e às
Olimpíadas. Procura-se, então, eliminar as marcas de pobreza e de resistência
em certos territórios, com o objetivo de se construir uma imagem de cidade
“limpa”. “É o que vem ocorrendo em São Paulo. A construção do Estádio do
Corinthians em Itaquera é uma oportunidade para remover os pobres de lá. Foi
exatamente isso que aconteceu em Nova Delhi (Índia) e na África do Sul”, observou.
A mesma tragédia está sendo anunciada para a Vila Autódromo, comunidade localizada
na Barra da Tijuca, zona nobre da cidade. Sua localização não é definida como
área de risco nem será terreno de obras de interesse público. “A única
justificativa para a sua remoção é o processo de apropriação do território e
sua transferência para o capital e o desenvolvimento imobiliário”, esclarece
Rolnik, lembrando que o que a comunidade precisa é de investimentos em
urbanização e saneamento.
Ela destacou ainda a importância do lançamento do dossiê
para se refletir sobre a política urbana no Brasil de modo geral. Para ela, a
publicação serve como um instrumento de luta, resistência, formação e
informação de todos os interessados em acompanhar o processo de preparação do
país para a Copa e as Olimpíadas de forma aprofundada, e não a veiculada pela
grande mídia. “A mobilização social, as denúncias e a resistência são cada vez
mais necessárias na construção uma cidade sem injustiça e exclusão. Por isso é
importante a construção de um projeto alternativo, como o que vem sendo
construído pela população, movimentos populares e universidades”, afirmou.
Foto: Adriana Medeiros
Altair Guimarães (presidente da Associação de Moradores da Vila Autódromo)
Já Altair Guimarães apresentou o relato de quem é testemunha
viva da história de remoções no Rio. Aos 14 anos ele teve que deixar sua casa
na Ilha dos Caiçaras, localizada na Zona do Sul do Rio. De lá foi para a Cidade
de Deus, de onde teve que sair para a construção da Linha Amarela. Resolveu
então morar na Vila Autódromo, e agora corre o risco de a história se repetir. Há
seis anos como presidente da Associação de Moradores, diz que não vai desistir
da luta, pois entende que os laços afetivos das famílias que estão ali há 40
anos não podem ser desfeitos por causa de um evento de quinze dias. “A
tentativa de retirar a Vila Autódromo é muito anterior à realização dos jogos,
pois em área valorizada não pode ter favela. Já faz 19 anos que a Vila
Autódromo luta contra a remoção, e vamos continuar resistindo. Também tenho
direito a essa cidade”, concluiu.
Documento destaca sete áreas que
apresentam principais violações
Em uma rápida apresentação do dossiê, o professor Orlando
Júnior explicou que sua proposta é mostrar o outro lado das intervenções do
poder público municipal no âmbito do Projeto Olímpico. “Normalmente essas ações
são divulgadas pela mídia como positivas, pois possibilitariam uma maior
integração na cidade e deixariam um legado social. Mas o que vemos é o
contrário disso: mais desigualdade e mais injustiça, tornando nossa cidade cada
vez mais de exceção”, disse Júnior, que também é relator pelo
Direito à Cidade da Plataforma Brasileira de Direitos Humanos Econômicos, Sociais,
Culturais e Ambientais (Dhesca).
O documento divide-se em sete eixos de
violações dos direitos: moradia, com
a reorganização do espaço público conforme os interesses econômicos,
distanciando cada vez mais os pobres das regiões mais valorizadas; mobilidade, com investimentos em
transporte público que só visam ao aumento da especulação imobiliária, ao invés
de atenderem a demanda já existente, reduzindo custos e garantindo boa
qualidade na prestação desse serviço; trabalho,
com a precarização justificada pela pressão de conclusão das obras em curso,
além da proibição e perseguição a camelôs e trabalhadores informais; esporte, com a previsão de elitização
do acesso aos estádios pela perspectiva de aumento dos ingressos; segurança pública, com aumento da
militarização em certas áreas, focando em pequenos delitos e na repressão a
algumas categorias sociais; informação e
participação popular, com a falta de transparência e diálogo com a
população em todas as decisões que vêm sendo tomadas, principalmente em relação
às remoções; e, por fim, orçamento e
finanças, com informações muito precárias sobre os investimentos e os gastos
públicos destinados às obras para os jogos.
O dossiê Megaeventos e Violações dos Direitos Humanos no Rio de
Janeiro também traz um histórico da resistência dos
moradores de comunidades e dos movimentos sociais, além de apresentar propostas
de intervenção para alterar essa realidade de exclusão. A publicação está
disponível na internet. Clique para baixar.
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