Mostra de Imprensa Sindical conta história da luta operária

(Lili Amaral *)

Vida é o que se respira nas salas da antiga sede do Sindipetro/RJ, no 20º andar  do prédio da CUT/RJ, no centro do Rio, das 14h às 21h. Durante a mostra o Núcleo Piratininga promove também a exibição de filmes, de segunda a sexta, às 18h30. Cinema e bate-papo, tudo grátis.

O Núcleo Piratininga de Comunicação (NPC) bancou a idéia, os Petroleiros e a CUT/RJ compraram o desafio. A I Mostra de Imprensa Sindical Brasileira 1988-2002 foi idealizado um mês antes de sua realização, durante o curso de História dos Trabalhadores no Sindicato dos Petroleiros do Rio. “Foi tomando um cafezinho”, explica Cláudia Santiago, coordenadora do NPC. Um trabalho de cinco anos produzido em uma semana. Para isso, houve muita dedicação, principalmente da equipe que tocou todo o serviço.

“A idéia é mostrar para o movimento sindical aquilo que ele mesmo produz. Temos a preocupação no Núcleo de não criar arquivos mortos. Que seja um arquivo vivo. Por isso, nos interessa que esse trabalho esteja em contato com jornalistas, sindicalistas e muitos estudantes”, diz Claúdia. A abertura da exposição, 30 de abril, foi precedida por um debate com os professores de história da UFF, René Dreifuss e Marcelo Badaró, e com a própria Cláudia. Mais de 130 pessoas lotaram o auditório da CUT/RJ. Os idealizadores pretendem que a Mostra, que no Rio fica até 15 de junho, itinerante. Assim como os jornais vieram do Iapoque ao Chuí, que ela percorra todos os cantos do Brasil.

“Apagar a história de luta operária no país sempre foi uma forma de dominação. A imprensa sindical é extremamente privilegiada. É a principal fonte para a memória operária no Brasil que mostra o sindicalismo combativo. Com essa mostra dá para perceber esse horizonte e com ele podemos avaliar o potencial político dos trabalhadores e do que eles construíram ao longo de sua história”, afirma Badaró.

Na história dos trabalhadores, a nossa história

A mostra reúne cerca de cinco mil jornais de mil sindicatos de todo o Brasil. Uma produção que envolve cerca de 600 profissionais de comunicação. Na sala principal, que trata da história das lutas dos trabalhadores, um arrepio toma conta da espinha. É como reviver um pouco da história de cada um de nós. No dia da abertura, muita gente se emocionou, reencontrou velhos amigos e recordou.

Na sala principal está exposta a história das lutas dos trabalhadores nos últimos 15 anos. Existem ainda duas salas com exposições dedicadas à CUT; uma para cada um dos seguintes setores: Bancários do Brasil, Bancários do Rio de Janeiro, Educação Federal e Estadual; Petroleiros, Servidores Públicos Federais e Previdenciários, Justiças Federal e Estaduais, Metalúrgicos, Movimento dos Sem-Terra, Massacre de Volta Redonda e mais uma sala dedicada a sindicatos de outros setores.

Transitavam pelos corredores o senador Geraldo Cândido, três vezes presidente da CUT/RJ, e ex-presidentes como Iná Meirelles e Washington Costa. Sem falar do atual, Antônio Carlos Carvalho (Carlinhos) e do ex-diretor da Central no Rio e atual secretário do Trabalho, Adeilson Ribeiro Telles. O fotógrafo Niko, que trabalha há anos para vários sindicatos, entre um flash e outro, lembrava dos seus tempos de militância quando ainda fa­zia parte da então corrente Convergência Socialista, expulsa do PT em 1992. A presença da jornalista Jocilene Chagas, do sindicato dos Metalúrgicos de São José e Edmar Nas­ci­men­to Felipe, assessor do Sindicato dos Trabalhadores de Justiça de Minas Gerais (Si­traemg), vindos de suas cidades especialmente para a abertura do evento e de inú­me­ros pro­fessores aumentaram a emoção. Entre outros, foram conferir a mostra sindical os mestres Rubin Aquino (Franco Brasileiro), Virgínia Vontes (UFF), Esther Kuperman (Suan), Lúcia Freire (Uerj), Gustavo Gindre (Cândido Mendes) e Telma (Veiga de Almeida).

O diagramador Caio Souto apontava a sala onde fazia, nas madrugadas, o jornal Nação Brasil, “junto com as baratinhas”. Os olhos da editora e do repórter do Jornal da ADUFRJ, Manoela Soares e Kelvin Melo Carvalho, brilhavam de tanto orgulho e satisfação.

Esta lá, estampada em letras garrafais, no jornal de oposição da chapa 2 dos metalúrgicos de São Paulo a manchete Roubaram o teu salário, acompanhada de uma charge com a então ministra da Economia Zélia Cardoso de Melo. Quem não se lembra do confisco da poupança orquestrado por Collor em 1990? Por falar em charge, o nosso eterno Lattuf, deixou seu traço e seu carinho nas paredes da mostra.

Os atentados de 11 de Setembro de 2001, em Nova Iorque e Washington, estão registrados pelo Jornal do SINTUFRJ. Na capa, o Apocalipse Capitalista. A dimensão da realidade neoliberal em 2002 é bem representada na manchete da Tribuna Metalúrgica, do ABC: 1,7 milhão de desempregados. Este jornal tem uma tiragem diária de 60 mil exemplares, maior do que a do Jornal do Brasil, que está em torno de 40 mil.

A Tribuna Metalúrgica está em uma bonita sala azul dedicada aos sindicatos de metalúrgicos. Ao seu lado está o Jornal dos Metalúrgicos de São José dos Campos. “um aspecto muito importante é que todos os seus 24 mil exemplares são distribuídos semanalmente de mão em mão”, conta o coordenador geral do NPC, Vito Giannotti. Esse sindicato realiza um trabalho pioneiro na produção de um jornal específico para a família metalúrgica.

Logo à frente da sala dos metalúrgicos está a sala de Volta Redonda, para jamais esquecermos o assassinato dos três companheiros da CSN, William Fernandes Leite, 22 anos, Valmir Freitas Monteiro, 27 anos, Carlos Augusto Barroso, 19 anos, em 1988. Este espaço foi organizado por Ernesto Germano, ex-assessor do Sindicato dos Metalúrgicos de Volta Redonda. E mais jornais de metalúrgicos do Rio, Minas Gerais e demais estados. Outra covardia cometida contra os trabalhadores também está marcada na sala do MST: o massacre de 19 sem-terra por 150 policiais militares, em Eldorado dos Carajás, no Pará, em 1996.

Nas salas da CUT dá saudade, muita saudade das boas lutas. O jornal Conquista não deixou escapar nenhuma. O jornal da CUT de São Paulo, que foi uma das primeiras experiências em buscar uma nova linguagem para a imprensa sindical, chegou a circular nacionalmente por 18 meses. “O sucesso foi tanto que garantia a sua sustentação com assinaturas”, testemunha o assessor de imprensa da CUT Nacional, Cid Marcondes. Os destaques são o boletim eletrônico diário da CUT/RJ, o Rápido, que completou dois mil números esse ano. Uma iniciativa pioneira da Central carioca. E o boletim diário da CUT Nacional, o Informacut que surgiu em 1987. Este evoluiu para revista em 1999 e foi reformulado em 2001 transformando-se no boletim eletrônico diário da Executiva Nacional. Há aproximadamente seis mil e-mails cadastrados.

“Da mais bela experiência da classe trabalhadora nos últimos tempos” que é a CUT, como define seu presidente nacional João Felício, a comunicação cumpre um papel importante, “mais ainda está muito aquém do que pode atingir”. Um dos organizadores da mostra, Guilherme Marques, o Soninho, enfatiza essa questão. “Apresentamos o trabalho que é realizado em mil sindicatos. E revela duas coisas: a noção de classe; outra que é a produção de uma imprensa grande e forte, mas que ainda tem dificuldade de disputar a hegemonia na sociedade. Porque não formar uma única imprensa para disputar em pé de igualdade com o jornal o Globo”.

Depois da angústia da luta contra o tempo, depois de superar inúmeras dificuldades e muito cansaço, comemoramos mais uma vitória em mais uma das muitas batalhas que vivemos a travar. No coração dos jornalistas e sindicalistas, uma certeza: a luta é dura. Quando não machuca, mata. Mais sempre valerá a pena para aqueles acreditam e trabalham para construir um mundo melhor.

* Lili Amaral é editora do Jornal do SINTUFRJ

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