O grupo de intelectuais e artistas, que se uniu com o nome de Vozes pela Paz, se somou aos protestos generalizados sobre "o golpe midiático", similar ao de 11 de abril, que tentam repetir na Venezuela. E apresentou um documento intitulado "Diante da violência simbólica", no qual eleva sua voz de protesto e sua "vergonha diante desta insolente manipulação da informação e da opinião".
No documento, assegura-se que a "Venezuela está vivendo no meio de um terrorismo delirante. Parte da consciência nacional foi seqüestrada por cinco estações de televisão. Estas decretam ‘a verdade’ para uma parte importante e respeitável da oposição, que freqüentemente reage com violência. São numerosos os profissionais de saúde que fizeram advertências contra esta incessante violência simbólica. A paralisação fracassa, mas eles decretam que há paralisação. Dão um golpe diante do mundo inteiro e depois afirmam que não houve golpe. Negam o que existe e criam o que não existe. Executam auto-atentados e depois os proclamam aos quatro ventos".
O certo é que, desde a segunda-feira passada, os canais privados de televisão transmitem, praticamente em cadeia ou cartéis, informações que só respaldam a paralisação de atividades lançada pela central empresarial Fedecámaras e pela cúpula da Confederação de Trabalhadores da Venezuela, para tentar derrocar -ou pelo menos desestabilizar- o governo constitucional de Hugo Chávez. Dirigentes da oposição repetem em todos os canais de televisão invocações à intervenção dos militares e, inclusive, chamados para a entrada de tropas estrangeiras. Os meios gráficos se abstiveram de sair às ruas durante a segunda e a terça-feira e, após esse blackout, retornaram às ruas na quarta, aterrorizando a população diante de um presumido desabastecimento petroleiro e um confronto entre partidários e opositores do governo.
O artista Manuel Quintana Castillo, Prêmio Nacional de Artes Plásticas, porta-voz dos intelectuais, afirmou que esta é a posição "de criadores que estamos fazendo a cultura deste país e nossa preocupação é que (...) haja as correções necessárias para estabelecer meios de comunicação, de diálogo e de convivência".
O grupo de intelectuais e artistas alerta a nação "diante deste grave fato, antes que seja tarde demais. Chamamos aquela parte da população que está sendo afetada psicologicamente pelos meios para a reflexão. Essas pessoas são a transição entre a violência simbólica e a violência física". Finalmente, o Vozes pela Paz aponta "os meios de comunicação como responsáveis, diante da História e do mundo inteiro, pelas conseqüências de sua atuação".
Junto a esta preocupação dos intelectuais, profissionais de saúde destacaram que o clima de tensão e incerteza que reina atualmente no país está causando um estresse emocional severo na população, que se reflete não apenas nas mudanças de hábitos e de comportamento das pessoas, mas também no aumento de certas doenças.
Edgar Belfort, membro da Associação Psiquiátrica da América Latina, estimou que mais de 40% dos venezuelanos estão sofrendo desse mal, produto das alterações de todo tipo que acontecem quase diariamente."O slogan ´Chávez os põe loucos´ está se convertendo numa realidade, porque estamos vivendo uma sorte de espetáculos que nos fazem pensar muito. Neste momento, ninguém está satisfeito consigo mesmo, rompeu-se a lógica e isso faz com que a saúde mental seja afetada", disse.
O especialista acrescentou que a Venezuela se adiantou aos prognósticos da Organização Pan-americana de Saúde (OPS), organismo que em 1998 firmou uma resolução destacando que a ansiedade e a depressão seriam a epidemia do século XXI. "Há muita gente deprimida que vive numa situação de angústia e está apostando num final rápido. A quantidade de pessoas com transtornos de ansiedade também é grande, e isso está produzindo mudanças psíquicas e de conduta. A soma de tudo isso é uma bomba-relógio que pode trazer conseqüências graves para a população", disse ao jornal "Últimas Notícias".
A psicóloga clínica Carmen Llanos informou que mais de 60% dos venezuelanos estão sofrendo de insônia em conseqüência da incerteza e dos acontecimentos violentos ocorridos no país.
Afirmou ainda que os quadros gripais e asmáticos têm aumentado, tanto nas crianças quanto nos adultos, pois o estresse diminui as defesas do organismo e deixa os indivíduos mais vulneráveis a esses vírus.
"O fato de não saber o que vai acontecer deixa muita gente assustada. Na televisão são observadas duas realidades distintas, uns dizem que tudo está mal e outros que tudo está bem. Isso cria confusão e muito medo". Explicou que uma das manifestações mais comuns do estresse emocional é a perda de sono e de apetite, além da depressão, sudorese excessiva, mudanças de humor e, alguns casos, histeria.
"Há pessoas que se trancam por temor, perambulam pela casa e falam sozinhas; outras sofrem ataques depressivos e reagem freqüentemente de forma violenta", acrescentou. Carmen Llanos afirmou que as crianças são as que mais sofrem, porque compreendem menos o que está acontecendo. Por isso, é preciso explicar-lhes muito bem o que está se passando e não contaminá-los com as notícias negativas.* Presidente da APEX – Associação da Imprensa Estrangeira na Venezuela - Voltar ao topo