O
mercado andou de lado
Por Marinilda Carvalho, março
de 2005, no Observatório da Imprensa
O mercado dos principais jornais brasileiros filiados ao IVC (Instituto Verificador de Circulação) – ou seja, Folha, Extra, Globo, Estado de S.Paulo, Dia, Zero Hora, Correio do Povo, Diário de S.Paulo, Agora, Jornal da Tarde – encolheu 1% em 2004, em comparação a 2003. Pode-se considerar uma façanha, após as drásticas quedas de 2002 (-9,10%) e 2003 (-7,2%). Em 2003 foram vendidos 1.885.000 exemplares, e em 2004, 1.867.000. Mesmo no pior ano da história da imprensa brasileira, 2002, a venda foi de 2.056.000 exemplares. Ou seja, o mercado continuou ruim no ano passado. Essa análise de mercado
engloba apenas os ditos grandes jornais. As estatísticas da Associação
Nacional de Jornais (ANJ), mais amplas, abrangem o universo dos jornais
brasileiros. Em 2003, havia 529 diários no Brasil, dos quais 165
em São Paulo, 60 em Minas, 51 no Rio Grande do Sul, 43 no Paraná,
41 no Estado do Rio e 30 em Santa Catarina, para citar os estados com mais
jornais. Eis os números da ANJ (fonte IVC):
O mercado andou de lado. Num ano em que todos os números da economia se mostraram "aquecidos", esperava-se um resultado melhor para os jornais. Errou a Associação Nacional de Jornais que, pelos resultados preliminares do IVC de 2004, calculou no fim de 2003 um crescimento da circulação de 0,8%. Os dados iniciais indicavam também aumento de 18% em publicidade em relação a 2003. Embora o leitor tenha constatado nas páginas uma presença maior de anunciantes, é preciso esperar os números consolidados do faturamento publicitário. Em 2004, o chamado mercado quality (Globo, Folha, Estadão, Zero Hora, Estado de Minas, Correio Braziliense e, por incrível que pareça, o JB) caiu 5% (aos domingos e nos dias úteis) em relação a 2003 (de 549 mil para 521 mil). Esses números representam a soma das médias semanais de venda avulsa (nas bancas) dos sete jornais. Nesse quadro dos quality,
2004 registrou um movimento que vale a pena destacar. A Folha, que
há anos é líder de vendas no país, está
com o reinado ameaçado. Aos domingos, já foi ultrapassada
pelo Globo, que chega a seus calcanhares também nos dias
úteis. Os números do IVC sobre a venda aos domingos:
Como lembra o especialista,
a arrancada para essa ultrapassagem começou em agosto, mês
em que o Globo lançou sua revista dominical. Mas, como o
crescimento do Globo foi mais significativo no Rio, isso quer dizer
que a revista não teve influência direta na queda da Folha.
Observa-se também que o Estadão não registrou
crescimento importante. Portanto, a impressão é que a Folha
perdeu leitor por seus próprios erros.
Como se vê acima, em janeiro
de 2004 a diferença andava na faixa dos 60 mil. Em janeiro deste
ano, caiu para a faixa dos 30 mil. Se for mantido esse ritmo, prevê
o especialista, no segundo semestre o Globo poderá voltar
a ser "o maior jornal do país". Para quem não se lembra desse
slogan, O Globo parou de se dizer o maior jornal do país
justamente pelo crescimento da Folha nos anos 1980/1990.
De qualquer modo, é espantoso
(senão doloroso) o baixo número de exemplares de jornal vendidos
em banca no Brasil (venda avulsa, excluídas as assinaturas). Os
números dos dias úteis:
A venda em banca é justamente o forte do segmento dos jornais populares – que caiu 3% aos domingos e cresceu 1% nos dias úteis. Extra, Dia, Agora, Diário SP e JT vendiam 848 mil (média dos domingos) em 2003 e caíram para 823 mil em 2004. Nos dias úteis, cresceram de 641 mil para 647 mil. Lance!, o fenômeno Uma comparação
entre janeiro de 2004 e janeiro de 2005 (venda total do mês) mostra
um fenômeno da imprensa brasileira: o jornal esportivo Lance!,
com crescimento de 1,4 milhão de exemplares, seguido pelo Globo
e pelo Extra. Na ponta aposta, o Dia perdeu 900 mil exemplares
no período (o que motivou mudança recente no comando editorial).
Chama atenção também a estagnação da
Folha,
com apenas 30 mil exemplares a mais – a reação da direção
foi cortar pessoal [ver remissões abaixo].
No segmento dos jornais especializados,
além da consolidação do Lance! cabe destacar
a forte queda da Gazeta Mercantil: menos 500 mil exemplares vendidos
de janeiro de 2004 a janeiro de 2005. O Valor Econômico começou
a aparecer no IVC em 2004: embora criado em 2000, não entrava no
índice porque vendia pouco. Agora, vende mais de 50 mil exemplares
por mês.
A soma dos três jornais da Infoglobo (controladora do Globo, do Extra e do Diário de S.Paulo) chega a 212 milhões de exemplares em 2004. A Folha e seu popular Agora somam 142 milhões. O Estadão e seu Jornal da Tarde chegam a 107 milhões. Se o Globo não é mais o "maior jornal do país", pelo menos sua editora é a empresa que mais vende jornal no país. A soma dos grupos Folha e Estado dá 250 milhões de exemplares vendidos, contra um total de 183 milhões só da Infoglobo. Como a população
do Rio (5,8 milhões) cabe duas vezes na de São Paulo (10,4
milhões), e a economia paulista é umas quatro vezes maior,
vale uma especulação: o carioca gosta mais de jornal?
A briga Extra vs. Dia O domingo (13/3) foi um indício de que a disputa entre os jornais populares do Rio esquentou desde a mudança de rumo editorial, em janeiro, no antigo campeão carioca de vendas, O Dia, superado recentemente pelo Extra, filhote do Globo. Quase 800 mil cariocas compraram jornal popular na banca neste domingo de intenso calor. O Extra bateu seu recorde de vendas aos domingos em três anos: vendeu acima de 460 mil exemplares, o que até rendeu notícia na edição de segunda-feira. O Dia também foi feliz: vendeu 330 mil exemplares, a maior venda dominical do jornal nos últimos 15 meses, uns 70 mil a mais em relação ao domingo retrasado. "Encalhe zero", informou Eucimar de Oliveira, o novo comandante do Dia. O segredo dos dois populares foi a calorosa oferta de um Atlas. O do Extra, de capa dura, obriga o leitor a juntar 60 selos. O do Dia, em formato de revista, saiu de graça, de uma vez só. Na edição de segunda-feira, o jornal informou que vai repetir a mesma promoção no próximo domingo. A concorrência argumenta que o sucesso do Dia vai durar dois, três domingos, enquanto os selos do Extra estariam comprometendo o leitor a comprar o jornal por dois meses. Será? O "mercado" dirá. O "mercado", aliás, mesmo com o Extra ainda à frente, já acusou a melhora do adversário nas bancas, uma média de 10 mil exemplares diários a mais. Eucimar diz que melhora há, mas não fala em números – não quer parecer "pretensioso". Prefere destacar "uma redação mais mobilizada, focada em assuntos que interessam ao nosso público primário, com outro dinamismo e ânimo", elogia. "Aliás, um sentimento que posso encontrar em todos os outros setores da empresa." Quem já participou de
projetos de revitalização de jornais sabe da carga de calor
que eles levantam entre os profissionais. A concorrência que se cuide.
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