Comunicação,
Ideologia e Política na batalha da hegemonia
Por Rosângela Gil, de Santos, dezembro de 2004 Encerramento: parte da equipe do NPC Foram cinco dias com temas pertinentes para quem quer fazer comunicação para fazer a disputa mais do que necessária com quem nos explora e domina neste sistema econômico. Os debates que desenvolveram o tema "Comunicação, Ideologia e Política na batalha da hegemonia" foram: 1- Mídia e política: a Globo na transição da Ditadura à Nova República, com o professor Venício A. Lima, professor de Comunicação do Instituto de Ensino Superior de Brasília. Neste tema, o professor apresentou uma série de fatos transmitidos pela mídia que contribuíram para criar o consenso de que existia no Brasil uma transição da ditadura militar, de 1964, para a chamada Nova República. Ele coloca um fato preocupante quando a "cena" política brasileira dos últimos anos, mais precisamente a partir de 1964, passa a ser analisada a partir do que diz a Rede Globo e seus vários meios (televisão, rádio, jornais, revistas). Ou seja, como ele mesmo destacou, sabemos que a história sempre é contada pelo lado dos vencedores, agora entramos numa fase ainda mais perigosa, o da história alterada pelas novas tecnologias. É nossa responsabilidade, dos movimentos sindical e social, fazer e preservar a nossa história para que ela não seja alterada pela Rede Globo e pelas novas tecnologias. Os sindicatos têm papel fundamental nisso quando organizam e preservam a memória das lutas, não só específicas da categoria, como das lutas sociais e populares de um povo. É importante a preservação da história para contá-la e não para refazê-la. 2- Revista Veja: o Indispensável Partido Neoliberal, tema desenvolvido pela professora de História da Unioeste-PR, Carla Luciana Silva. A professora faz um alerta importante: a revista Veja, hoje, no Brasil, pauta a própria história do País. A revista já virou referência de pesquisas até em universidades para temas, como meio ambiente, saúde, grupos de auto-ajuda, etc. 3- A Dimensão pedagógica da Comunicação Popular, tema desenvolvido pelo professor do curso de Educação da Universidade Federal Fluminense (UFF), Gaudêncio Frigotto. Ele destaca a importância da sintonia de três elementos da comunicação sindical e popular: conteúdo - forma - método. 4- Comunicação sindical: de Collor a Lula e leituras operárias, tema desenvolvido pela jornalista Cláudia Santiago. A jornalista praticamente faz um desabafo: "Se queremos disputar a hegemonia precisamos nos preparar muito bem. E a comunicação é uma ferramente-chave nessa disputa. Os patrões já sacaram isso. Investem como ninguém na comunicação, pagam bem seus profissionais, não poupam esforços para disputar os corações e mentes de seus empregados. Por outro lado, o que fazemos? Essa é a grande pergunta que precisamos responder com seriedade e todos os dias". 5- Comunicação e Ideologia em Marx e Gramsci, tema desenvolvido pelas professoras Virgínia Fontes (professora de História da UFF) e Sônia Mendonça (professora de História da UFF). A professora Virgínia Fontes, que brilhantemente desenvolveu o tema Comunicação e Ideologia em Marx, iniciou sua aula assim: "O tema para mim é Comunicação e Ideologia em Marx. Em primeiro lugar, para Marx sempre foi fundamental a comunicação. É central. Marx foi um autor que foi jornalista uma boa parte da vida dele. Um jornalismo muito diferente desse jornalismo que a gente está acostumado a ver, um jornalismo reflexivo, um jornalismo que exige avançar nas questões e pensar. 90% do jornalismo que a gente vê hoje é um jornalismo de superfície, quando chega a ser de superfície. A questão, portanto, em Marx, não era comunicar para socializar conhecimento. Para produzir conhecimento e difundir esse conhecimento. Toda a vida do Marx, desde muito novinho, está ligada à publicação em jornais. Os jornais nos quais ele trabalhou foram sendo fechados. Vários deles foram fechados pela censura e muitas vezes ele era expulso, como foi o caso da França, da Alemanhã. A participação dele em determinados jornais levou à expulsão dele dos países onde ele estava. Então, reparem que o combate do Marx é comunicar, mas não é comunicar por comunicar. É comunicar o que se tem a dizer, socializar o que precisa ser dito. O que se tem a dizer é algo que precisa ser construído. Isto é, se não é comunicar por comunicar e é para dizer alguma coisa que precisa ser dito, a próxima pergunta é: O que é que precisa ser dito?" Extraímos apenas um pequeno pedaço, uma introdução ao tema. A professora, na verdade, mostra que a comunicação e a ideologia não estão separadas. Andam juntas. Já a professora Sônia Mendonça desenvolveu o tema "Comunicação e Ideologia em Gramsci". Também de forma espetacular, a aula da professora da UFF iniciou levantando conceitos de fundo de Antonio Gramsci: Estado ampliado, aparelhos privados de hegemonia. E a palavra-chave, segundo a professora, de todo o pensamento de Gramsci: organização. O estado ampliado, conceito específico de Gramsci, aponta que o Estado capitalista não é apenas coerção, mas também consenso. Para isso, o sistema conta com aparelhos privados de hegemonia, que são difusores e produtores de cultura, ideologia e comunicação. E as instituições que perpassam toda a produção cultural de uma sociedade são três: Igreja, Escola e Imprensa. A importância da comunicação é tão grande para Gramsci que ele vai analisar toda a imprensa do seu tempo no volume 2 dos Cadernos do Cárcere. Para Gramsci, o papel da imprensa integral é aquela que não apenas dá informação, mas aquela que também forma opinião. 6- Aula-Oficina: Comunicação Sindical: exigências específicas, com o escritor e ex-metalúrgico ferramenteiro Vito Giannotti. Esta aula foi um show à parte. Vito Giannotti prendeu a atenção do público explicando o que devemos e não devemos fazer nos nossos informativos. Frente a uma bancada de jornais sindicais, Vito Giannotti explicou praticamente quais os erros mais comuns que cometidos nos informativos sindicais. Antes, ele destaca que devemos prestar atenção às tendências da grande mídia. Por exemplo, prestarmos atenção à forma de dispor a informação por parte de jornais, como Folha de S.Paulo e Estadão, por exemplo. Vito Giannotti observa que esses jornais fizeram pesquisas caras sobre a forma de melhor comunicar. Ou seja, sabem o que estão fazendo. Cabe destacar que não estamos falando de conteúdo, mas de forma, apresentação gráfica. Uma falta grande destacada por Vito Giannotti é a linguagem utilizada: a do sindicalês, do politiquês e do economês, etc. "Não podemos usar termos, como: conjuntura, mais-valia, irredutível e tantas outras palavras que só confundem ou espantam o trabalhador para a nossa comunicação. Precisamos ser simples, inteligentes, diretos. E escrever frases curtas, com menos de 20 palavras. Precisamos entender que vivemos num país onde não se lê. É uma minoria que lê e sabe interpretar corretamente o que lê". Vito Giannotti destacou a importância da pauta dos informativos sindicais não ser só "umbigo". Ou seja, falar apenas dos problemas específicos e imediatos da categoria. Precisa falar de tudo, mas sempre numa ótica de integração, mas reservando 60% do espaço para as notícias da categoria. Outra questão importante que o escritor destacou é o de quando falamos de outras categorias profissionais nos nossos informativos, caracterizamos bem que não somos apenas uma categoria, mas que fazemos parte de uma classe. 7- A Internet e a Comunicação Alternativa, com Bia Barbosa (Agência Carta Maior), Ermano Allegri (Agência de notícias Adital) e Gustavo Gindre (membro eleito do Comitê Gestor da Internet no Brasil). Ermano Allegri relatou a experiência da agência de notícias Adital, Agência de Informação Frei Tito para a América Latina, lançada no dia 13 de maio de 2001. Mais uma ferramenta da comunicação alternativa e popular, com informações e com enfoque que normalmente não saem na mídia. Ermano Allegri diz que o desafio de todos os movimentos que se contrapõem à exploração do sistema atual é o de comunicar para incluir. Já Gustavo Gindre explicou que a internet ainda não é uma alternativa de informação e comunicação totalmente livre. Ela ainda está sob a tutela dos Estados Unidos. A jornalista Bia Barbosa falou sobre a Agência Carta Maior, que nasceu da vontade de apresentar mais informação de interesse social e popular. E para sair da "lógica" da informação da mídia. Ela entende como fundamental os sindicatos usarem mais e melhor a "ferramenta" internet para passar informação e se comunicar com os trabalhadores. 8- Debate: Comunicação e Movimentos Sociais, com: Idson Alves, do MUCA (Movimento dos Camelôs do Rio de Janeiro), João Paulo Rodrigues, do MST e Sandra Quintela, do Jubileu Sul. Todos os debatedores questionaram a forma como os meios de comunicação tratam os trabalhadores e os movimentos sociais e populares no Brasil. Por isso, todos eles destacam precisamos fazer a nossa comunicação. O MST, por exemplo, mantém uma grande estrutura de informação, que vai desde jornais, boletins, programas de rádio, portal na imprensa, boletim eletrônico, etc. O MUCA, com estrutura bem menor que a do MST, sem linha de comparação, inclusive, usa de muita criatividade para manter uma comunicação alternativa com a comunidade. "Somos tratados como marginais pela imprensa. Mas somos importantes para a economia do nosso Estado", diz Idson Alves. O movimento faz murais enormes com recortes de jornais, faz panfletos e "inunda" as redações com releases. Sandra Quintela, do Jubileu Sul e do PACS, falou da experiência com o plebiscito da ALCA, em 2002. Como não se pôde contar com a chamada grande imprensa, o movimento investiu tudo nas comunicações alternativas, de sindicatos, do MST, de ONG's, etc. "No início, alguns disseram que éramos loucos em tentar explicar o que é ALCA para a população. Investimos em todo tipo de material de informação, boletins, cartazes, programas de rádio, vídeo, etc. O fato é que conseguimos a participação de mais de dez milhões de pessoas no plebiscito da Alca, em setembro daquele ano." 9- Os comentaristas de Rádio e TV e a Opinião Pública, com Pedrinho Guareschi, professor do curso de Psicologia da PUC-RS. 10- Mídia Vigiada e Observatório da Mídia, com o professor de Comunicação da ECA/USP, José Luis Proença, e Sérgio Domingues, sociólogo e do NPC. 11- Escolaridade, Muralhas da Linguagem e Hegemonia, com Vito Giannotti. Parte final do curso, onde Vito Giannotti analisou as "muralhas" da linguagem, quando escrevemos para o trabalhador não entender. Ele cita exemplo de uma brasileira de Barretos, em Pernambuco, no Show do Milhão do Sílvio Santos. A pergunta lhe feita foi se ela sabia o significado da palavra "otimista". Vito Giannotti disse que viu o programa e não acreditou que ela não sabia o significado da palavra otimista. Mas como não acreditou? Vito responde: é uma minoria que sabe bem o significado de otimista, a esmagadora maioria da nossa população não sabe o que significa otimista. O grau de escolaridade no Brasil é baixo e a qualidade do ensino é pior ainda. Não contamos com um país de letrados. Ao contrário. O nosso povo não lê, tem dificuldade em interpretar corretamente o que está escrito. Além do grande número de analfabetos, temos outro grave problema: o analfabeto funcional, aquele só sabe escrever o nome praticamente. Os dados apresentados por Vito, segundo pesquisa do IBGE, mostram que precisamos fazer os nossos boletins, jornais e informativos com bastante cuidado. Falar e escrever de forma simples não é rebaixar o nível ou dar pouco valor ao trabalhador. Ao contrário. Falar e escrever de forma simples para que todos entendam é uma arte, e necessária. Para que a gente consiga comunicar e formar os trabalhadores de modo a ganhá-los para a batalha da hegemonia. Destacamos apenas alguns trechos dos debates e aulas do 10º Curso Anual do NPC que nem de longe representam a riqueza e importância deste evento. Todos os participantes, entre dirigentes sindicais e jornalistas, tinham apenas uma preocupação: como melhorar e fazer a nossa comunicação com os trabalhadores. Foram cinco dias intensos. Tivemos a oportunidade de vermos como estão os jornais e a comunicação de outras categorias. Trocarmos idéias e experiências. Entendemos que, apesar de estarmos
no caminho certo, o de dar toda a atenção à comunicação,
precisamos fazer acertos e inovações. O que não podemos
deixar é o trabalhador entregue às garras da comunicação
oficial, tantos dos patrões como da comunicação oficial
do sistema.
"Somente um jornal
que divulgue de modo conseqüente os princípios da luta política
e levante bem alto a bandeira da democracia estará em condições
de convencer todos os elementos democráticos combativos e aproveitar
todas as forças progressistas na luta pela liberdade política.
Só então conseguirá transformar o ódio surdo
dos trabalhadores à polícia e às autoridades em ódio
consciente ao governo autocrático". Lenin, Del pasado
de la prensa obrera em Rusia, 1914.
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