Governança
da Internet precisa da sociedade civil para se democratizar
Por Gustavo Barreto, dezembro de 2004 Poder e tecnologia estão intimamente ligados, mas ainda não há a real percepção da importância do tema para o Brasil. Este é um dos alertas feitos por Gustavo Gindre, Coordenador Executivo do Instituto de Estudos e Projetos em Comunicação e Cultura (INDECS), no 10o Curso anual do Núcleo Piratininga de Comunicação (NPC), no Rio de Janeiro, de 1 a 5 de dezembro de 2004. Gindre, que é membro da sociedade civil no Comitê Gestor de Internet do Brasil (CGIBr), explicou aos participantes aspectos relacionados à governança na Internet e sua ligação estreita com a dominação tecnológica e comercial dos Estados Unidos. Fazendo uma rápida contextualização, Gindre afirmou que a Internet nasceu em 1959, por iniciativa do exército norte-americano. A primeira rede se chamava ARPANET. Em 1969, em uma universidade nos EUA, foi enviado o primeiro correio eletrônico (“e-mail”), mas apenas nos anos 90 foi feito seu uso comercial. Um dos motivos para sua criação era a necessidade de se elaborar uma ferramenta de comunicação que não pudesse ser cortada pelos inimigos – como ocorria com as comunicações da época. Na nova rede, se algum ponto fosse cortado, os outros eram mantidos. Gindre lembrou que o Brasil continua muito aquém no que diz respeito à inclusão digital. Apenas 12% das pessoas possuem computador, sendo 9% do total com Internet. Além disso, 800 municípios têm provedor, o que indica que mais de quatro mil cidades precisam fazer um interurbano para acessar a rede por discagem. Para exemplificar em que estágio nós estamos, Gindre afirmou que, na Coréia do Sul, 90% das casas tem internet banda larga (acesso rápido 24 horas). Isso ocorreu por conta de uma forte intervenção estatal no setor. Mito e realidade Gustavo
Gindre fala sobre a Internet e a Imprensa
“A
Internet não é tão descentralizada e tão sem
controle quanto parece”, alerta o pesquisador. Apenas uma empresa, a ICANN
(Internet Corporation For Assigned Names and Numbers – www.icann.org),
controla todos os endereços (domínios e números).
Gindre explica que cada sítio na Internet é um número,
representado pelo seu IP – ou ‘Internet Protocol’, uma espécie de
linguagem mundial da rede.
Alternativa ao lado de Kátia Marko e Bia Barbosa Sediada no sul da Califórnia, a ICANN é uma instituição privada que presta contas apenas ao Senado norte-americano. Já a infra-estrutura da rede é controlada diretamente pelo Departamento de Comércio dos Estados Unidos. Além disso, do total de 13 servidores que abrigam a Internet, 10 estão nos Estados Unidos. O Brasil possui apenas “espelhos de espelhos”, sujeitos à política dos servidores estrangeiros. “Existe o mito de que a ICANN somente se ocupa de 'questões técnicas' quando, na verdade, ela faz praticamente nada que possa vincular-se sequer remotamente com questões técnicas. A existência da ICANN tem se pautado pela promoção dos planos de seletos interesses comerciais (particularmente dos EUA e da Europa), evitando envolver-se em questões que atendam (e muito menos promovam) a estabilidade técnica da internet”, afirma o matemático Enrique Chaparro, da ONG argentina Via Libre, no texto “Un documento de posición sobre el ´gobierno' de la Internet”. Além disso, Gindre lembra que a NSA, sigla em inglês da agência norte-americana tecnológica de espionagem, possui uma base de dados que monitora todas as mensagens eletrônicas na atualidade – incluindo aí mensagens de celular e e-mail – denominada ECHELON. Em texto para a revista “Caros Amigos” de agosto de 2000, o jornalista José Arbex Jr. escreveu: “De fato, no início de julho [de 2000], apoiando-se em documentos divulgados pelo Parlamento Europeu, a promotoria pública da França solicitou formalmente ao órgão francês de contra-espionagem (Serviço de Vigilância do Território) que investigue a existência e as atividades do Echelon. Caso se comprove, Paris pretende declarar que Washington promove um ‘ataque aos interesses vitais da França’.” Gindre lembrou que a União Européia suspeita que o ECHELON tenha sido utilizado para fins comerciais, numa concorrência, à época, entre a empresa européia de aviação AIRBUS e a norte-americana BOIENG. Conscientização e mobilização Para mudar esse quadro, já existe o Grupo de Trabalho sobre a Governança da Internet (GTGI - www.net-gov.org/wgig), com a intenção de formar um comitê gestor de Internet mundial, já que em muitos países – como o Brasil – já existem comitês gestores eficientes. Ao lado do Brasil estão países desenvolvidos ou em desenvolvimento que querem que a governança da Internet seja a mais democrática e transparente possível, com maior participação dos governos. Do outro lado da briga estão os Estados Unidos, que querem continuar com a hegemonia na rede mundial, mantendo a abordagem "pró-negócios" na liderança da web. Ao contrário do que acontece na ICANN, empresas, governo e sociedade civil estão representadas no comitê brasileiro. O problema é que os governos não estão interessados em comprar uma briga de frente contra os interesses norte-americanos. Por conta disso, é fundamental o apoio da sociedade e o aprofundamento no tema. Saiba mais sobre o Instituto
de Estudos e Projetos em Comunicação e Cultura em www.indecs.org.br
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