A manipulação na cobertura da guerra no Iraque

Por Miriam Abreu, outubro de 2004

 
A guerra do Iraque proporcionou a democratização do acesso à informação apesar da manipulação velada da mídia. A conclusão é da jornalista Paula Fontenelle, que entrevistou 18 correspondentes de guerra e quatro coordenadores de mídia, todos do Ministério da Defesa da Grã-Bretanha, para escrever o livro “Iraque: a guerra pelas mentes”.

Além das entrevistas com profissionais de veículos como The Guardian, The Daily Mirror, The Sun, The Independent e sistema BBC, a obra explica como foi a operação de mídia conduzida pelos americanos e britânicos e traz a análise de Paula sobre o que estava por trás das reportagens sobre o conflito, sobre as abordagens diferentes no tratamento da mídia e sobre como a imagem política do presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, do primeiro ministro britânico, Tony Blair, foi afetada.

O autora explica que havia cinco categorias na cobertura da guerra: aqueles que ficavam no Centro de Mídia, no Qatar; outros que ficavam na unidade móvel de transmissão, no Iraque; os engajados, que acompanhavam os soldados; os repórteres hospedados no Hotel Palestine, que viviam sob controle de Saddam Hussein; e os independentes, que corriam mais riscos que os demais. 

“Tanto na unidade móvel quanto no Centro de Mídia, os jornalistas tinham acesso à tecnologia de ponta. Na unidade móvel, havia clipping logo pela manhã, Internet 24 horas por dia, comunicação via satélite e coletivas de imprensa. Os que ali ficavam também tinham acesso a dados oficiais e às estratégias de guerra”, diz Paula. 

Ela define o Centro de Mídia como o ápice da frustração jornalística, já que os repórteres não tinham facilidade de acesso a informações, a não ser sigilosas. “Só para se ter idéia do problema que era ficar no centro de mídia, o repórter Bob Roberts, do Daily Mirror, disse que a estadia dele lá, que durou três semanas, só rendeu três matérias para o diário”. 

Paula percebeu durante as entrevistas que os britânicos tinham muito mais interesse em fornecer informações do que os americanos. Os números comprovam a tese da jornalista: 72% da população americana, no início da guerra, era a favor da invasão no Iraque, o que despreocupava o governo americano de ceder informações sobre o conflito. “Já na Inglaterra a opinião pública era contra a invasão”. 

Havia 700 jornalistas no sistema de engajados, destes, 135 britânicos e a grande maioria restante americanos. Segundo o coordenador geral da operação britância de mídia, David Howard, o maior número de vagas para os repórteres engajados é explicado pela cobertura jornalística que, afirma ele, é mais positiva. “Ele me disse que em função do tempo que convive com os soldados, o pessoal acaba construindo um elo de amizade com o exército”. Ben Brown, da BBC, reconheceu a fragilidade de sua posição como engajado. Ele relatou o que sentiu logo após ter sua vida salva por um soldado britânico. O oficial havia assassinado um iraquiano que estava prestes a jogar uma granada em direção ao repórter. “Bem me contou que sua reação foi correr e abraçar o soldado que o salvou para agradecer. Foi ali que percebeu que cruzou a linha do jornalismo”.

“Iraque: a guerra pelas mentes” também traz fotos cedidas por repórteres-fotográficos que Paula entrevistou, pelo Ministério da Defesa da Grã-Bretanha e imagens registradas por ela durante protestos na Inglaterra contra a adesão do país à invasão no Iraque.

O livro foi lançado na semana passada no Recife. O próximo lançamento será em São Paulo, em data e lugar ainda a serem definidos.

"Iraque: a guerra pelas mentes", de Paula Fontenelle
Editora Sapienza
Preço: R$ 32,00
208 páginas
 

Publicada anteriormente em www.comunique-se.com.br

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