Os Jornalistas de Balzac

Relançado livro em que Honoré de Balzac faz uma caricatura muito crítica dos jornalistas de sua época. Muito ainda parece atual. Agência Carta Maior, outubro de 2004.

"Se a imprensa não existisse, seria preciso inventá-la." Honoré de Balzac, autor da frase, tornou-se imortal graças a excelência de suas observações sobre os vícios e virtudes do ser humano. Não é à toa que o estudo mais completo da sociedade (A Comédia Humana) é de sua autoria. 
De seu posto de observação privilegiado – o do gênio –, Balzac escreveu também sobre a imprensa, peça fundamental de qualquer sociedade. Certa de que as obras desse autor estão sempre atuais e continuam iluminando a mente de seus leitores, a Ediouro está relançando Os Jornalistas (R$ 29,90 - 184 páginas), que reúne dois textos de Balzac – i>Monografia da imprensa parisiense e Os salões literários – com críticas a respeito da onipotência dos jornalistas de seu tempo, sua vaidade venal, a versatilidade de seu julgamento e a influência abusiva que eles exercem sobre os governos. 

Com prefácio de Carlos Heitor Cony, é um panorama da imprensa nos meados do século XIX que pouco ou nada difere daquilo que hoje conhecemos como mídia. "Temos aqui o Balzac puro, autêntico, anedótico quase. Não o artista de tantas obras-primas que marcam a ficção do seu século, mas o homem sangüíneo e rude, esbanjando inteligência e cólera", afirma Cony. 

Em sua crítica feroz aos jornalistas e "jornaizinhos", segundo expressão da época, Balzac faz uma caricatura de cada um dos tipos presentes na ordem Gendelettre (gente de letras), onde estão presentes os publicistas (escrivinhadores que fazem política) e os críticos. Há o panfletário, o nadólogo, o publicista de carteira, o escritor monobíblia, o jovem crítico louro, o folhetinista etc. Tais caricaturas, contudo, formam um primoroso retrato da imprensa contemporânea. São os mesmos perfis, as mesmas ambições, as mesmas ilusões, as mesmas estratégias de sobrevivência e os mesmos expedientes, como pode ser notado em trechos como "Para o jornalista, tudo que é provável é verdadeiro". Ou "Os anúncios tomando a quarta página do jornal e o folhetim um quarto do que resta, os jornais não têm mais espaço". Ou ainda "Se alguém tem um concorrente a um posto para o qual deseja ser nomeado, ele pode impedir a nomeação de seu rival fazendo badalar a sua com elogios por todos os jornais". 

A cólera de Balzac é bastante vigorosa e ele parece não poupar ninguém, nem mesmo os raros tipos nos quais ele reconhece o talento, mas lamenta que este seja consumido na rotina medíocre e nos interesses rasteiros dos jornais. Alguns dentre eles, diz, são criadores natimortos que desperdiçam seu talento, prostituem sua pena e, pouco a pouco, renunciam à grandeza de uma obra que eles preterem em favor das pequenas vaidades imediatas da crônica ou do "bilhete". A pergunta que o leitor irá fazer é se Balzac não cedeu, ele próprio, à esta tentação fatal. Como escritor, sua meta não era moral. Transcendia ao interesse ético, religioso, político ou social. Era, acima de tudo, o observador da grande comédia da qual – como jornalista – era também personagem, testemunha e cúmplice
 
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