Cartas à imprensa: Jornal
Brasil de Fato e o filme "Olga"
Esta carta foi enviado por
Luís Mergulhão ao Jornal Brasil de Fato em agosto de 2004
Caros Companheiros de Luta:
Permitam-me discordar profundamente
da análise do filme "Olga", publicada na última edição.
"Olga" é acusado de ser romântico, comercial e feito para
o grande público. Por sinal, muitos dos "limites" do filme são
confessados pelo próprio diretor, como apropriadamente apresenta
a matéria. Portanto, qualquer crítica que não leve
isso em consideração perde a densidade e é no mínimo
incoerente.
Evidente que o filme tem uma
forma de telenovela ou minisérie, propositalmente assim elaborado
para emocionar a platéia, mas isso serve para desqualificá-lo
totalmente? O que dizer, se esse raciocínio for seguido, sobre o
recente filme "Diários da Motocicleta"?
Desqualificar o filme como
centrado na paixão dos dois personagens e pouco referente a história
também revela estreiteza. Afinal, quantos filmes de boa qualidade,
a princípio românticos, já nos serviram para divulgar
e debater nossas lutas justamente por ter nelas o seu pano de fundo? Dou
como exemplo o excelente filme "Havana", estrelado por Robert Redford.
Quer dizer que só aprovamos filme totalmente coadunados com a nossa
visão de mundo e rigorosamente fiéis a história? Filmes
de boa qualidade, que levantem as contradições sociais e
debates sobre o mundo, mesmo que indiretamente, não valem muito
mais que outros totalmente "fiéis a causa", e muitas vezes panfletários?
Sobre o caráter romântico,
é preciso dizer que "Olga" explicita para o grande público
uma verdade que muitas vezes o dogmatismo desejou acabar: A dimensão
moral e afetiva da nossa luta, o revolucionário não só
como intrasigente nos seus princípios mais profundamente humanista,
e formado na paixão da luta e da vida. A mudança sofrida
por Olga, no sentido de sentir prazeres, que nunca pensara em desfrutar,
infelizmente para alguns até hoje considerados "burgueses", sem
perder princípios, dignidade e ousadia na luta, é um das
mensagens mais belas do filme.
Ora, a quem serve "esquecer
o filme" que relata a vida de Olga e seu companheiro, um grande líder
comunista de nossa história, Luis Carlos Prestes? Quantas pessoas,
até mesmo as mais escolarizadas, e nem me refiro apenas às
novas gerações, ouviram falar desses personagens e da luta
em que eles foram protagonistas no Brasil? Tornar mais conhecida essa etapa
da história, de bravura, sonhos, coragem e princípios não
é positivo para abrirmos uma discussão, e aí sim aprofundarmos
a dimensão da história, com uma juventude tão carente
de referências positivas e, infelizmente, já marcada pela
autêntica traição de um lider popular que, hoje presidente,
diz envergonhar-se de ser chamado de esquerda?
Portanto, é totalmente
despropisitado o título da matéria. Não devemos "ver
e esquecer o filme", e sim esquecermos o dogmatismo e o sectarismo na forma
de perceber o mundo e as relações humanas, o que não
pode ser confundido com firmeza de princípios e ousadia na contrução
de um mundo calcado em outros valores, examente aqueles que Olga e Prestes
tanto lutaram para alcançar.
Um forte abraço e saudações
comunistas
Luis Mergulhão, agosto
de 2004
Núcleo
Piratininga
de Comunicação
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