Como a mídia cobre a favela
Por Tiago Chediak, estudante de Comunicação, junho de 2004

O Observatório da Imprensa do dia 22 de junho debateu como a imprensa cobre as favelas e periferias de nossas cidades, sempre focalizando seu lado negativo e esquecendo-se do seu dia-a-dia, o que faz com que essas comunidades produzam informação, cultura e consciência. Logo em seu editorial Alberto Dines questionou: "Se a favela faz parte da cidade, então porque a cidade não toma conhecimento do que se passa na favela?"

Participaram ao vivo do programa a jornalista Flávia Oliveira e o diretor-executivo do CECIP (Centro de Criação de Imagem Popular), Claudius Ceccon, no Rio de Janeiro; o jornalista César Camasão, em São Paulo; e o cineasta Helvécio Ratton, direto de Belo Horizonte. Também estiveram no Observatório, em participações gravadas, o coordenador da Rádio Viva Rio, Sebastião Santos, o coordenador da TV Roc Dante Quinterno, a editora da Rádio Viva Rio, Patrícia Rodrigues, o coordenador de Comunicação Comunitária da PUC-RJ, Miguel Pereira, o coordenador do Núcleo Comunicação da Maré, André Esteves e o líder comunitário de Paraisópolis, José Rolim.

A repórter de O Globo, Flávia Oliveira, autora de reportagens sobre o tema, falou sobre a origem dessas sugestões. "Tem um pouco das duas coisas. Eu não posso ignorar a minha origem, eu fui criada em Irajá, subúrbio, então eu tenho uma ligação de vida com comunidades populares (...) É óbvio que, ao fazer um trabalho desse tipo em um jornal como o Globo, você encontra eco da chefia, da diretoria da redação, senão as matérias não sairiam com o destaque que saem".

E continuou. "Eu tenho uma opinião crítica em relação ao jornalismo, ai eu não estou falando do Globo especificamente, estou falando do jornalismo brasileiro, que é muito ‘classe média’ sim. É um jornalismo feito por pessoas da classe média para pessoas de classe média."

Helvécio Ratton, diretor do filme ‘Uma Onda no Ar’, falou sobre a rádio retratada em seu filme. "A Rádio Favela é uma experiência muito interessante, que nasceu há mais de vinte anos numa grande favela daqui (BH) que é o aglomerado da Serra (...) O Mizael, um dos fundadores da rádio, me contou uma coisa muito interessante. Nos anos 70 se instalou lá no morro uma rádio FM (...) A rádio se instalou no alto do morro porque era topograficamente um lugar bom para transmitir suas ondas e ele dizia que quando o locutor dizia bom dia, ele sentia que dizia bom dia pro pessoal do asfalto mas não para a favela. Eu acho inclusive que foi essa situação que deu a eles uma grande vontade de criar um meio deles."

César Camasão, do jornal Agora São Paulo, justificou a cobertura elitista dizendo que "mesmo num jornal popular a gente sente dificuldade, pois são jornalistas de classe média, morando também em regiões mais nobres da cidade, que fazem um jornalismo popular. É difícil, muitas vezes são mundos conflitantes e distintos demais para a produção dessas pautas (...) Na nossa editoria de ‘Cidades’ a gente tem alguns representantes oriundos dessa periferia. Isso é uma coisa muito importante porque a gente consegue boas pautas dessas pessoas."

Em seguida Claudius Ceccon lembrou como funcionava a TV Maxambomba, que atua na Baixada Fluminense: "Na televisão brasileira, se você olhar bem, quando os pobres aparecem é porque alguma tragédia aconteceu (...) Nós procuramos retratar a vida dos bairros, a vida cotidiana das pessoas e a imensa criatividade que existe em um lugar como Nova Iguaçu".

E continuou falando sobre o CECIP: "Nós começamos um projeto dentro da escola com adolescentes. Primeiro, trazendo alguma informação e filmando a discussão que eles tinham. (...) Uma semana depois, nós chegávamos com esse programa editado e o primeiro espanto era porque nós tínhamos usado tal trecho, ai é a primeira lição sobre comunicação. Alguém decidiu que é esse o trecho e não o outro. A primeira lição foi esta (...) Nós fizemos um projeto chamado ‘Botando a Mão na Mídia’, que nada mais é do que familiarizar os professores, os educadores, fazer com que percam o medo da tecnologia, aprendam a gravar um vídeo (...) Isso significa uma nova maneira de ensinar e novas possibilidades dentro do espaço escolar."

Na conclusão do programa César Camasão ressaltou a importância de haver uma maior sintonia entre os leitores de classes mais pobres e o jornalistas. Helvécio Ratton lembrou que as rádios comunitárias são necessárias para que haja uma comunicação mais horizontal e menos dominante. Em sua participação final, Cláudius Ceccon citou Paulo Freire: "Uma das missões da comunicação é também educar. Paulo Freire dizia que aprender a ler é entender o mundo e aprender a escrever é transformar esse mundo. Se nós levarmos isso para a televisão, por exemplo, ver televisão seria receber essa informação. Mas se nós nos apropriarmos do meio, podemos contar a nossa história, escrever a televisão."

Flávia Oliveira encerrou o Observatório com otimismo: "Eu acho que nós temos nos esforçado para entender melhor, para retratar melhor essas comunidades."
 
 

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