Fórum Social das Américas: "outra América e outra comunicação são possíveis"
Por Eula Dantas Taveira Cabral, julho de 2004

Discutir a sociedade da informação sob a perspectiva da construção de um mundo melhor e garantir que a Cúpula Mundial da Sociedade da Informação (CMSI) inclua a sociedade civil como contraparte no processo de preparação e realização do evento é a missão da Campanha CRIS "Direitos de Comunicar na Sociedade da Informação". Lançada em 2001, luta internacionalmente para que os direitos humanos sejam alcançados e fortalecidos os aspectos sociais, econômicos e culturais das pessoas.

Dentre os temas e ações da Campanha CRIS, destacam-se: fortalecer o domínio público, assegurando que a informação e o conhecimento estejam disponíveis para o desenvolvimento humano e não controlados por mãos privadas; assegurar o acesso e uso efetivo de redes eletrônicas em torno de desenvolvimento; assegurar e estender os bens coletivos globais, tanto para difusão como para telecomunicações; institucionalizar o manejo democrático e transparente da sociedade da informação em todos os níveis, desde o local até o global; parar a vigilância e a censura governamental ou comercial; apoiar os meios comunitários e centrados nas pessoas.

Viver numa sociedade mais justa e democrática é o sonho da maioria das pessoas. Porém, para torná-lo realidade é preciso entender a conjuntura atual e se engajar com propostas e ações, buscando soluções. No caso dos povos que vivem no continente americano, esse passo importante poderá ser dado no 1º Fórum Social das Américas que será realizado em Quito (Equador) no período de 25 a 30 de julho de 2004, tendo como slogan: "outra América é possível". O evento faz parte do processo desencadeado pelo Fórum Social Mundial (FSM) que desde 2001 se tornou o grande espaço de articulação de iniciativas sociais, cuja meta é mostrar que "outro Mundo é possível".

Dentre os organizadores, destacam-se: Ação Ecológica; Agência Latino-americana de Informação (ALAI); Confederação de Nacionalidades Indígenas do Ecuador (CONAIE); Confederação de Afiliados ao Seguro Social Campesino (CONFENUASSC); Conselho Latino-americano de Igrejas (CLAI); Diálogo Sur-Sur GLBT; Facultad Latinoamericana de Ciencias Sociales (FLACSO); Fundación Ecuatoriana de Acción, Estudios y Participación Social (FEDAEPS); Fundación María Luisa Gómez de la Torre (FMLGT); e Red de Mujeres Transformando la Economía (REMTE).

A escolha de Quito (Equador) para a realização do primeiro FSA resultou do reconhecimento do Equador ser um país que luta contra o neoliberalismo com um movimento indígena organizado, considerado um símbolo de resistência. Assim, serão realizados eventos regionais com o objetivo de analisar como a globalização neoliberal vem afetando cada região, abrindo espaços para debates críticos e troca de experiências de resistência e construção de alternativas. Um deles será o Encontro pelos Direitos da Comunicação nas Américas.

O Fórum Social das Américas terá cinco eixos temáticos, analisando as vantagens e desvantagens da ordem econômica; o projeto neoliberal; a relação entre poder, democracia e Estado; culturas e comunicação; e as questões que envolvem os povos indígenas e afro-descendentes. No caso da comunicação, serão analisados: a democratização da comunicação; direito à comunicação e políticas públicas; a monopolização dos meios e os sistemas comunicacionais; a mercantilização da informação; independência e ética jornalística; meios independentes, alternativos e comunitários; apropriação e controle social das novas tecnologias; gênero e diversidades.

A escolha dos temas comunicacionais não foi aleatória, pois, observa-se que hoje a população vem sendo sufocada, sendo proibida de manifestar seus pensamentos diante da realidade em que vive. Além disso, a mídia é controlada por um pequeno número de grandes grupos que decidem o que deve ser levado ao povo. Dessa forma, como observou a pesquisadora colombiana María del Carmen Moreno Vélez, é preciso quebrar as barreiras entre os povos para que estes lutem por seus direitos. Uma delas é a falta de conhecimento das culturas latino-americanas, resultando na subordinação da América Latina aos países desenvolvidos. "É necessário que conheçamos alguns elementos fundamentais das nossas culturas para que possamos nos comunicar e ser tolerantes em vários aspectos que, por desconhecê-los, podem gerar conflitos entre os comunicados", argumentou.

Outro assunto de destaque que será debatido pelos participantes do eixo temático quatro (culturas e comunicação) é a importância do uso do software livre, que vem sendo colocado em prática pelo governo brasileiro e é fundamental na democratização da comunicação e inclusão digital. Para María del Carmen, o assunto exige um debate urgente pelos povos americanos, pois muitas pessoas não conseguem entendê-lo, não tendo, inclusive, conhecimento de como usá-lo. "Penso que existem, neste tema, ferramentas que nos podem ajudar a nos fortalecer en nossas culturas e, em conseqüencia respeitar as outras e interatuar com eles produtiva, calma e tranqüilamente". Quanto ao uso das tecnologias de informação e comunicação ressalta que deve ser divulgado entre as crianças, jovens e adultos de todos níveis sociais e econômicos.

Redes de Comunicação se encontram em Quito

Além dos debates que ocorrerão no Fórum, um grupo de redes de comunicação que apóiam a Campanha pelos Direitos da Comunicação na Sociedade da Informação (CRIS) está organizando o "Encontro pelos Direitos da Comunicação nas Américas". São elas: A Associação para o Progresso das Comunicações (APC), Rede Latino-americana de Rádios para uma Cultura de Paz (RADIPAZ), Associação Latino-americana de Educação Radiofônica (ALER), Agência Latino-americana de Informação (ALAI), Associação Mundial de Rádios Comunitárias (AMARC), Organização Católica latino-americana e caribenha de comunicação (OCLACC), Associação Mundial para a Comunicação Cristã (WACC) e Agência de Informação Frei Tito para América Latina (ADITAL).

O Encontro tem como objetivos apresentar a situação dos movimentos e os cenários de ação da comunicação como direito e sua democratização e articular as propostas e estratégias como ações prioritárias para impulsionar a Campanha CRIS na região. De acordo com a Coordenadora de Políticas de TIC na América Latina e Caribe, Valeria Betancourt, é preciso analisar os direitos da comunicação e buscar soluções conjuntas.

Pois, como propõe a organização do FSA, ele será um espaço democrático e pluralista, aberto à participação de todos os que querem construir um mundo diferente. Assim, podem se inscrever todos os representantes (como delegados) das organizações, movimentos e entidades da sociedade civil que reconheçam e concordem com a Carta de Princípios do FSM. A inscrição de ativistas e interessados que não pertençam a nenhuma organização pode ser feita como participantes. Já entidades ou pessoas ligadas a governos ou partidos políticos como observadores.

Dessa forma, espera-se que os eventos realizados em julho na cidade de Quito tenham um grande impacto na América e que o FSA "se constitua num cenário permanente de debates, discussões, controvérsias... tudo aquilo que nos permita nossa comunicação e compreensão", como enfatizou María del Carmen Moreno Vélez. Pois, é preciso mudar a realidade e permitir às pessoas um mundo melhor com outra América e comunicação possíveis.
 

Por Eula Dantas Taveira Cabral - Informativo Sete Pontos
 
 

Núcleo Piratininga de ComunicaçãoVoltar