Atingidos por barragens: aconteceu
e não virou manchete!
Em março passado ocorreu mais um episódio escandaloso da mídia brasileira. Pra variar, ninguém soube: o referido escândalo diz respeito ao boicote da mídia à livre e democrática manifestação do povo! Neste caso, dos atingidos por barragens. Por Flávia Braga, assessora do MAB, abril de 2004
14 de março é o Dia Internacional de Luta Contra Barragens. Todos os anos, o MAB (Movimento dos Atingidos por Barragens) organiza uma série de manifestações, protestos, ocupações na semana do 14 de março. É a Jornada Nacional De Luta, semelhante à semana do 17 de abril para o MST. Este ano a jornada foi muito intensa: 15/03: 400 famílias atingidas ocupam a Usina Hidrelétrica (UHE) Tucuruí, no Pará. 16/03:
Mesmo com todos estes atos, mesmo com todo este povo mobilizado nenhuma linha sequer foi noticiada pela Rede Globo, pelo Jornal O Globo, pelo Jornal do Brasil, pela Folha de São Paulo nem por tantos outros grandes veículos da imprensa nacional. Algumas perguntas precisam ser respondidas. Por que este boicote? A quais interesses de classe atende? Por que esconder a mobilização de milhares de pessoas por uma semana em todo o País? A quem interessa que não se saiba que o MAB existe? A indústria de barragens (pública e privada) no Brasil e no mundo é comparável à indústria de petróleo e, obviamente, a crítica aos seus interesses e à reputação da “energia limpa” não podem ser divulgadas. Além disso, no Brasil, o setor elétrico sempre teve seu braço ditatorial bastante aguçado. Algumas das maiores barragens do mundo foram construídas no Brasil durante a Ditadura Militar e boa parte de nossa dívida externa se deve aos juros dos empréstimos alucinados que a milicada tomou na banca internacional para a construção destas obras faraônicas. Sem entrar no mérito das críticas ambientais e sociais a este tipo de empreendimento e continuando a discussão sobre o autoritarismo midiático deixamos apenas mais algumas questões para que o leitor tire suas próprias conclusões. Um outro aspecto que quero destacar é a relação do governo Lula com as lutas dos atingidos por barragens. No ano passado, começando o governo Lula, o MAB apresentou uma pauta de negociações ao Ministério de Minas e Energia cobrando a dívida social do Setor Elétrico para com as comunidades atingidas e ameaçadas por barragens. Depois de meses de enrolação, a única atitude do governo foi criar um grupo inter-ministerial para discutir o assunto. Deste grupo fazem parte doze ministérios, dentre eles o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República. O que diabos tem este organismo a ver com pequenos agricultores, indígenas e quilombolas empobrecidos por anos de descaso do poder público que apenas pedem a garantia de justa compensação das perdas sofridas com o desclocamento compulsório promovido pelo Estado? A ditadura militar considerava
as barragens como questão de segurança nacional, de polícia,
de forças armadas. O governo Lula também. Resquícios
da ditadura? Resquícios que a velha imprensa da ditadura faz questão
de abafar?
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