Revista alternativa tem mensagens
censuradas na Internet
Em abril de 2004, e-mails com mensagens sobre o 11 de setembro foram interpretadas como “spams” por servidor norte-americano que hospeda a página da revista Consciência.Net. Em maio, foi a vez do Grupos.com.Br bloquear a atuação do editor da publicação, inutilizando sua atuação sem qualquer justificativa; Veja porque interesses contrariados de grandes empresas como RBS e Gerdau podem ter provocado “pequenos incidentes” de censura de mensagens eletrônicas. Editores não descartam, no entanto, possibilidade de erro técnico sem intenção discriminatória.
A revista Consciência.Net (www.consciencia.net), apesar de ter sua sede física no Rio de Janeiro, Brasil, está toda ela baseada, na prática, em “território” norte-americano. Isto ocorre porque quem hospeda (ou seja, dá o espaço para os textos e imagens) a Consciência.Net é a empresa norte-americana XO Communicantions (www.xo.com). Já o domínio “ponto NET” é adquirido por meio do “Register.com”, também com base jurídica nos Estados Unidos. Os editores da publicação — que funciona há mais de quatro anos — nunca foram entusiastas de teorias de conspiração, mas era intrigante o fato de sermos constantemente visitados por computadores oriundos de bases militares e de órgãos governamentais norte-americanos. É possível visualizar estas visitações, pois o próprio contador do nosso servidor oficial nos disponibiliza diversas informações sobre a máquina do visitante, tais como horários de entrada, horários de saída e páginas lidas durante a visita. Por meio de terminações como “ponto BR” (Brasil) ou “ponto UK” (Reino Unido), é possível saber o país do usuário. Outras terminações, no entanto, são mais específicas. “Ponto GOV.BR” indica que algum funcionário público brasileiro visitou a revista. Já “ponto EDU” indica que o visitante estava em uma instituição de ensino superior norte-americana. Trata-se de padrões definidos pela agência que regulamenta a Internet. Duas ‘terminações’ que freqüentemente nos dão o prazer da visita são a “ponto MIL” (base militar do governo dos EUA, não necessariamente em território norte-americano) e “ponto GOV” (governo norte-americano). Quem diz é o próprio contador da XO Communications, que acusa seis visitas destas instituições nas últimas duas semanas de abril. É possível analisar ainda quais páginas foram visitadas. Mas como foram seis visitas em um universo de quase 108 mil visitas em duas semanas, o processo de análise poderia levar dias, até que achássemos a hora correta da visita. Servidor excluiu e-mails com termos “perigosos” O processo de exclusão de algumas mensagens enviadas à redação da revista foi, no mínimo, muito suspeito. Em março de 2004, resolvi adotar o sistema “anti-spam” do nosso servidor. Pareceu um bom sistema, eliminando 90% do lixo eletrônico que chega por e-mail e falhando muito pouco no processo de exclusão de mensagens autênticas. Até que uma colega resolveu colaborar com uma matéria que eu estou escrevendo acerca da relação das famílias Bush e bin Laden e das falhas cometidas pelos serviços de inteligência norte-americanos (CIA e FBI) no atentado do 11 de setembro, chamada “O terrorismo e suas raízes financeiras”. Ao mesmo tempo em que meu anti-spam liberou diversas mensagens dessa colaboradora sobre outros temas — tais como Agroecologia e Economia —, o servidor decidiu desviar para o lixo nada mais nada menos que 40 mensagens sobre o artigo envolvendo a política dos Estados Unidos. As mensagens podem ser recuperadas, mas em geral o usuário confia no “anti-spam” e deixa de ler as informações, que são apagadas ou pelo próprio usuário, ou após 15 dias armazenadas. Paranóia? O jornalista José Arbex Jr. avisa aos céticos que esse assunto já vem sendo debatido no âmbito do Parlamento Europeu, e é tão sério que ameaçou, em 2000, causar uma crise diplomática entre França e Estados Unidos. Diz Arbex: “De fato, no início de julho [de 2000], apoiando-se em documentos divulgados pelo Parlamento Europeu, a promotoria pública da França solicitou formalmente ao órgão francês de contra-espionagem (Serviço de Vigilância do Território) que investigue a existência e as atividades do Echelon. Caso se comprove, Paris pretende declarar que Washington promove um ‘ataque aos interesses vitais da França’.” [Revista Caros Amigos, agosto/2000] As denúncias partiram do Comitê de Avaliação Científica e Tecnológica do Parlamento Europeu, que criou em 5 de julho de 2000 uma “comissão temporária” para investigar o Echelon – nome dado ao banco de dados que intercepta todas as mensagens por telefone, e-mail e/ou fax que contenham termos “perigosos” como “bin Laden”, “fundamentalismo”, “comunista” e outros. Nas mensagens enviadas por uma colaboradora da revista Consciência.Net, havia evidentemente pelo menos uma dezena de “termos perigosos” em cada texto, como diversos nomes árabes e figuras famosas da política norte-americana dividindo o mesmo parágrafo. O que ocorre, portanto, é que o meu anti-spam, monitorado pela XO Communications, mesmo nunca tendo excluído uma única mensagem sequer da referida colaboradora, decide subitamente desviar para a lixeira 40 mensagens, todas sobre o mesmo tema: as relações das famílias Bush-bin Laden e análises críticas sobre a atuação da CIA e do FBI em casos relacionados ao terrorismo. Por que? Mais problemas: Grupos.com.Br As dificuldades que tenho freqüentemente com o sistema de fórum ‘online’ Grupos.com.Br foram vistas por mim como dificuldades técnicas, resolvidas sempre com atraso, porém técnicas. Esta minha visão cética começou a mudar no começo de maio, quando o Grupos.com.Br — mais uma vez — não queria aceitar mensagens minhas enviadas pelo sistema “outlook” de e-mail. O problema, que vinha acontecendo pelo menos duas vezes por ano, era resolvido em um mês, por vezes em dois meses, porém de forma completamente enigmática. Minhas reclamações eram respondidas pela equipe do Grupos.com.Br no sentido de que “nada sabiam informar” sobre a causa dos problemas. Depois de algum tempo, de forma aleatória, minhas mensagens eram novamente aceitas. Além disso, em relação aos problemas anteriores, bastava acessar a página do grupo em questão para que minhas mensagens fossem aceitas. O processo de envio por formulário na página, registra-se, reduz evidentemente o número de mensagens enviadas, pois reduz a praticidade que o “outlook” nos proporciona. Atualmente sou moderador de quatro listas pela empresa Grupos Internet — que administra o Grupos.com.Br —, sendo uma pela revista Consciência.Net e três listas independentes. Desta vez, porém, algo de novo ocorreu. As mensagens não eram aceitas de forma alguma. Ao verificar meu cadastro, não havia nada de errado. A senha funcionava. Constava corretamente a inscrição nos grupos. No entanto, nem por e-mail (via outlook), nem pela própria página (via formulário) as mensagens eram aceitas. Ao redigi-las e envia-las, o administrador indicava: “Sua mensagem foi enviada corretamente!” Onde, portanto, foram parar? Não se sabe. Sabemos, no entanto, que o grupo “Ética na Mídia” (www.grupos.com.br/grupos/eticanamidia) é um destacado fórum na internet, composto de diversos editores com ampla influência midiática, que discute alternativas para uma mídia mais humana, além de divulgar eventos e notícias críticas relativas ao tema. Os grandes grupos de mídia do país — como, por exemplo, os grupos Globo e Rede Brasil Sul (RBS) — são alvos constantes de denúncias. Conforme as políticas definidas pelo grupo “Ética na Mídia”, pode-se ler que ele é “aberto”, ou seja, qualquer pessoa pode assinar o grupo. O mesmo vale para os outros grupos por mim administrados. Conexões comprometem A Grupos Internet S/A é a empresa responsável pelo site Grupos.com.br. Formada com capital do Fundo RS-Tech (BID/FOMIN, Bndespar, entre outros), iniciou suas operações em janeiro de 2000, sendo pioneira no segmento de "grupos de discussão" na Internet brasileira. O Fundo RS-Tech, por sua vez, é administrado pela CRP – Companhia Riograndese de Participações. Na página da CRP, na área “Quem Somos” (www.crp.com.br/quemsomos.htm), podemos ler que a principal acionista da empresa é a holding PARGS S.A., composta de investidores privados do Rio Grande do Sul. Entre estes investidores está o maior grupo de mídia da região sul do país: a RBS. Está claro, para quem não é míope, que esta empresa se encontra em campanha constante contra o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra. De acordo com a própria RBS (www.rbs.com.br/rbscom), um dos três pilares comerciais do grupo é a “Gestão Rural”. Para ficar claro: o maior grupo de comunicação da região sul do país tem como um dos três pilares comerciais a gestão rural. Não é crime, estou apenas registrando. Para tanto, criou em 1998 a “Planejar Brasil”, oficialmente conhecida como “Planejar Informática e Certificação Ltda”, organização com sede em Porto Alegre (RS), com negócios voltados ao setor de agronegócios (ver em www.planejar.com). Não se discute, aqui, por que um grupo tão grande de Comunicação teria como “um dos três pilares comerciais” a gestão rural. E até que ponto isto influencia na linha editorial dos seus meios de comunicação. Deixemos isso para um outro momento. Não é o nosso foco neste momento. Rivais no RS Outro investidor de peso da holding PARGS S.A é o Grupo Gerdau, “maior produtor de aços longos no continente americano, com usinas siderúrgicas distribuídas no Brasil, Argentina, Canadá, Chile, Estados Unidos e Uruguai. Hoje, alcança uma capacidade instalada total de 14,4 milhões de toneladas de aço por ano.” (ver em www.gerdau.com.br). Na contramão da crise brasileira, a multinacional apresenta lucros exorbitantes que chegam a R$ 1,3 bi. Um dos maiores inimigos do Grupo Gerdau no Rio Grande do Sul é a entidade ambientalista Greenpeace (www.greenpeace.org.br). Por diversas vezes, esta organização denunciou que a empresa Gerdau Riograndense contamina o meio ambiente e a população. Em 2001, por exemplo, os ativistas relataram fartamente o uso, por parte de Gerdau, do PCB, uma substância química altamente tóxica também conhecida como ascarel. Acrescenta-se, por fim, que uma das listas que administro no Grupos.com.Br é exatamente o GP-Rio, grupo local de ativistas ligados ao Greenpeace, com base no Rio de Janeiro. (ver em www.grupos.com.br/grupos/gp-rio/) Com tantas “coincidências”, é razoável dizer que tais fatos provocam estranhamento, dúvida, confusão. Tornam as coisas um pouco mais obscuras. Provoca muitas perguntas sem resposta. Pergunta-se por que uma pessoa com intensas atividades pró-MST, pró-Greenpeace e crítico fervoroso dos grandes conglomerados de mídia, com destaque para a RBS e para a Globo (ligada também à RBS institucionalmente), — tudo isso, ressalto, dentro da normalidade democrática, livre debate de idéias e obedecendo sempre os conceitos éticos do bom jornalismo —; por que essa pessoa foi simplesmente inutilizada, sem qualquer explicação, pelos administradores do Grupos.com.Br, por pelo menos quatro vezes, sem nenhum esclarecimento ou pedido de desculpas por parte da empresa. Deixa-se claro que não se trata de um usuário comum. Trata-se de um administrador de mais de oito grupos de discussão e divulgação na rede, sendo quatro delas hospedadas na empresa Grupos Internet S.A., sendo duas das listas recheadas de amplas atividades de denúncia a pelo menos duas empresas acionistas e, portanto, donas do Grupos Internet. Alguém fácil de ser “achado” e com muita “movimentação” neste tipo de mídia. Mensagens anti-MST passam. Erro técnico? O leitor mais cético há de ficar intrigado com o seguinte fato: em meio a tudo o que estava acontecendo comigo no grupo "Ética na Mídia", uma última mensagem chega à lista, mais especificamente às 15 horas e 48 minutos do dia 9 de maio. Com o assunto "As novas cotas do MST", o texto acusa o MST por conta de cotas recentemente adotadas no curso de Agronomia da Universidade Federal de Sergipe. Diz a matéria: "Com a criação do curso de Agronomia destinado exclusivamente aos sem-terra, foram esbulhados os 369 candidatos que não conseguiram vagas – e aprenderam da maneira mais dura que a condição para entrar na universidade pela janela é fazer parte do MST." (leia aqui) Não se acusa quem enviou a mensagem, deixo claro. Mas por que foi esta a única mensagem liberada no período de três dias, visto que o grupo recebia cerca de cinco contribuições diárias sobre os mais diversos assuntos, em geral tidos como "de esquerda"? Alguém explica? No dia 10 de maio, nova supresa Nesta data, a revista é retirada do ar. A minha surpresa foi seguida de "esclarecimento", depois de breve consulta: o período de inscrição do nome "consciencia.net" — concedido pela norte-americana Register.com — havia acabado. Mais especificamente no dia 8 de maio, como qualquer usuário poderá ver no referido endereço. Por que, então, não fomos avisados sobre a renovação? A funcionária do servidor XO Communications — que armazena os dados da revista, com base também nos EUA — me informa: "Eles certamente deveriam ter feito isso". Mas não fizeram. Como o distinto leitor poderá conferir, o e-mail presente nas informações da nossa revista está correto: gustavo@consciencia.net (leia aqui). O Register.com não poderia, portanto, afirmar que fora enviado um aviso sobre o período de renovação. Nos anos anteriores, este tipo de aviso veio por pelo menos quatro vezes antes que o contrato acabasse. Por que agora nós não recebemos tal lembrete? Por que a Register.com subitamente se desinteressou em renovar contrato com a revista Consciência.Net? Alguém responde? O contrato foi renovado dois dias depois, assim que soubemos que nossos servidores estavam fora do ar. Este "esquecimento" do Register.com abriu uma brecha que poderia simplesmente anular nossa marca. Tal erro poderia ter significado o fim da revista com endereço consciencia.net. A quem exatamente interessa tal mudança repentina de comportamento por parte da Register.com? Sendo a análise influenciada
ou não por teses conspiratórias, estas são perguntas
que gostaríamos de ver respondidas. Ficam os sinceros pedidos para
que possamos trazer à luz tais questões, ficando no ar a
sincera dúvida: o que está acontecendo? No âmbito nacional,
por que até agora o Grupos.com.Br não se manifestou e meus
e-mails continuam completamente bloqueados?
Gustavo Barreto é
editor da revista Consciência.Net (www.consciencia.net), colaborador
do Núcleo Piratininga de Comunicação (www.piratininga.org.br),
estudante de Comunicação Social da UFRJ e bolsista do Programa
Institucional de Bolsa de Inciação Científica (PIBIC)
pela ECO/UFRJ
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