A
mídia brasileira está cada vez mais venezuelana
No episódio da nacionalização dos hidrocarbonetos bolivianos, mídia queria sangue. Como os fatos desmentem sua conduta, o problema, para a revista Veja, a Folha e o Estadão, está com os fatos. Por Gilberto Maringoni, na Agência Carta Maior, maio de 2006
O maior atestado da correção oficial brasileira é a lambança que a maior parte da mídia fez da questão. Aqui transparece, ironicamente, a grande influência venezuelana nos países do continente, após a chegada de Hugo Chávez ao poder. Elitistas, racistas, preconceituosas, entreguistas e sobretudo alicerçadas no pantanoso terreno da ficção, publicações como “Veja”, “O Estado de S. Paulo” e “Folha de S. Paulo” foram cuidadosas na escolha de lorotas para entreter o leitor. Até mesmo o ex-ministro Rubens Ricupero – o que se auto definiu, em 1994, nas telas da Globo,como sem escrúpulos – resolveu dar o ar de sua graça. Acompanharam-no ex-auxiliares do governo tucano, ávidos por se livrarem do merecido ostracismo. PRÊMIO
DE FICÇÃO
A “Folha de S. Paulo”, tradicionalmente mais sóbria, busca pelo em ovo. A manchete de domingo (7) é sensacional: “Bolívia já prepara desapropriação de terras de brasileiros”. É assim sem mais. No mundo encantado da grande mídia, o pérfido governo de Evo Morales e seus asseclas, monitorados pelos arqui-vilões Hugo Chávez e Fidel Castro, pensaram num plano diabólico só para prejudicar brasileiros. Quando o espantado leitor avança até o caderno de Economia, verifica ter sido vítima de uma pegadinha do jornal. Muito jocosa, por sinal. O repórter Fabiano Maisonnave relata: “São aproximadamente oito decretos e um projeto de lei, que têm a finalidade de reverter ao Estado boliviano todas as terras que não cumprem uma função econômica e social ou cujos títulos de propriedade tenham sido obtidos fraudulentamente", disse à Folha o ministro de Desenvolvimento Rural, Agropecuário e Meio Ambiente, Hugo Salvatierra. E vai adiante: "Isso representará a recuperação de 11 a 14 milhões de hectares de terras, que serão distribuídos a camponeses sem-terra, comunidades indígenas e originárias e a todos os bolivianos que não possuem terra e estão dispostos a trabalhá-la. Mas representará também a segurança jurídica para todos os pequenos, médios e grandes proprietários e empresários que cumprem a função socioeconômica, trabalham a sua terra e a possuem de maneira legal”. Ah, bom, então não é contra brasileiro? É contra grileiro? Mas quem se importa? A rima é a mesma. É tudo festa! Esse pessoal da “Folha” é realmente muito espirituoso. RICUPERO
PEDE PIQUES
A imprensa claramente quer sangue. Desejosa de fracionar a aliança entre governos que rejeitaram a Alca e tentam outro tipo de integração, não subordinada a Washington, irá espernear cada vez mais. E cada vez mais se parecerá com a direita venezuelana e seus repetidores encastelados na mídia. “INTERESSES
NACIONAIS”
Primeiro, a aprovação da Lei 9478/1997, que acabou com o monopólio estatal do petróleo e possibilitou a empresas estrangeiras explorar jazidas brasileiras e a comercializar e exportar petróleo; Segundo, a venda de 59% das ações da Petrobrás. Destes, 40 % foram comercializados em Wall Street e 19 % foram passados a investidores e especuladores brasileiros. Embora a maioria dos votos na direção da empresa pertença ao Estado, tem sofrido pressões crescentes para não atender prioritariamente os interesses do país, mas a de contentar seus sócios privados. Houve aqui uma privatização por dentro. E terceiro, o governo FHC assinou, em 1999, um contrato de fornecimento 30 milhões de metros cúbicos de gás, por 20 anos, com empresas multinacionais que exploravam as reservas bolivianas. O Brasil consumia pouco mais da metade deste volume. Houve intensa pressão internacional para que nosso país mudasse sua matriz energética hídrica, possibilitando a produção de eletricidade através de usinas térmicas. Na raiz desse fato estava a privatização de nosso sistema elétrico. Mais caras e mais poluentes, a instalação de termelétricas, no entanto, era de interesse das grandes transnacionais do setor que acabaram vindo para o Brasil. Não é à toa que a Enron, por exemplo, atuasse em duas frentes, na Bolívia e no Brasil, durante esse período. O contrato é denominado “take or pay”. A Petrobrás teve de pagar pelo gás, mesmo sem utiliza-lo integralmente. A imprensa e a direita têm repetido que a nacionalização do gás boliviano enfraquece a integração dos países latino-americanos. Ao contrário. Uma integração justa e sólida só será possível se for baseada em países soberanos. Mas a
mídia não está aí para isso. Está para
nos fazer pegadinhas. Muito, mas muito engraçado, mesmo.
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