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voz da terra: duas décadas líder de audiência
Por Rogério Almeida, abril de 2006
Num estado que concentra quase metade de sua população na zona rural, o programa tem como público-alvo o homem e a mulher do campo. Atualmente é produzido e apresentado pela radialista Majô Ferreira. O ‘Homem e a Terra” tem como âncora a ONG Associação Agroecológica Tijupá. O programa já é um marco na história de radiodifusão no estado, que, como muitos no Norte e Nordeste, tem os meios de comunicação concentrados e/ou aliados de interesses políticos de verniz conservador. Daí a importância desse canal de comunicação, que, além do seu caráter pedagógico, acaba por possibilitar uma agenda de debates que não seria permitida em outras emissoras do Maranhão. Num Estado que coleciona os piores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) do país, e que ainda tem uma atmosfera dominada por oligarcas, impregnado da lógica patrimonialista, o programa se constitui num canal de comunicação da sociedade civil organizada. Ocupa um papel de vanguarda, posto a percepção de uso de áudio, quando os setores considerados de esquerda, pautavam a produção de impressos. Entre os assuntos da linha editorial do programa constam: Agricultura familiar; Pequena produção e melhoria das condições de vida dos trabalhadores (as) rurais reforçando sua permanência no campo, relatos de pesquisas sobre agroecologia e experiências alternativas executadas por técnicos e trabalhadores rurais. Reminiscências da história O Programa o Homem e a Terra foi inaugurado pela iniciativa da própria direção da Educadora do Maranhão AM no distante 1983. Sob os ares da transição democrática. A iniciativa partiu de Vitor Asselin, e o Projeto de Tecnologias Alternativas (PTA) da Sociedade Maranhense de Direitos Humanos (SMDDH), que veio a desaguar na fundação da Tijupá, lembra Marluze Pastor, atual gerente do Instituto Nacional de Meio Ambiente e dos Recursos naturais Renováveis (IBAMA) do Maranhão. Na época Pastor era técnica da Cáritas, e foi convidada na condição de agrônoma para com os trabalhadores rurais discutir problemas e alternativas para a realidade camponesa. Inicialmente tocado sem muita organização, tornou-se líder audiência. Na gênese do programa transitaram profissionais como Vera Salles, ex-técnica de comunicação do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), Itaan Santos, professor da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA). Além do o arte-educador Lio Ribeiro, que foi titular do programa por uma década. Entre os parceiros, contou como o apoio financeiro da ONG alemã de cooperação internacional GTZ, e ainda com o Banco do Estado do Rio de Janeiro (BANERJ), lembra Marluze Pastor. “Lá em 1986, lembro que procuramos a Associação de Igaraú (zona rural de São Luís), que era coordenada pelo Manoel Baldez, que topou a empreitada. Assim passamos a coordenar o programa. No começo Robson Pereira e eu, éramos os locutores, era tudo meio 'baguçado”, mas, tinha uma audiência estrondosa”, arremata Marluze. Quando da fundação da Associação Agroecológica Tijupá em 1990, o programa o Homem e a Terra passa a ser organizado pela ONG, que prima pelo processo educativo de mão dupla entre equipe técnica e público alvo. No horizonte utópico o aprofundamento da convivência harmoniosa entre o ser humano e a natureza é o que se vislumbra. No que pese todas as pedras no caminho. Como um tiro certeiro na ausência de democracia dos meios de comunicação no Maranhão, o programa procura agendar os principais debates relacionados com a questão das políticas agrícolas, agrárias e ambientais, experiências de trabalhadores e trabalhadoras rurais, e mesmo de outras entidades nas áreas da agricultura sustentável, sócio-ambiental etc. O programa O programa é transmitido ao vivo e conta com a participação do ouvinte por telefone. Também tem sido aproveitado por movimentos sociais e pela população em geral para discutir e denunciar os impactos dos grandes projetos, grilagem de terras, crimes ambientais e outras mazelas corriqueiras no estado do Maranhão, na região Amazônica, além de agendas nacionais. No último domingo de cada mês acontece o especial com cultura popular. Assim o programa se transforma num palco dos cantadores de repente, de bumba-meu-boi, tambor de crioula, e outras manifestações culturais. Fartas nas terras maranhenses. Gente parida da matriz afro, maioria tem na terra sua fonte de sobrevivência. Além da participação da arte-educadora Arli Arnauld (a Lili) que apresenta o seu rico acervo musical (quase sempre em vinil), há pérolas da poesia e do cordel nordestino, como Zé da Luz e Patativa do Assaré. Como a dinâmica é a ordem na radiodifusão, além de entrevistas, o programa tem “quadros fixos”, como a Agenda Rural (divulgando as ações da TIJUPÁ nos municípios em que a ONG atua. O espaço noticia ainda os eventos organizados por outras organizações). Dicas sobre produção, saúde, trato com animais, alimentação alternativa, entre outras, são os pontos do quadro e a tradicional Dica da Terra. Programa de rádio que se preze tem que ter uma recheada sessão de alôs e de recados enviados pelos ouvintes, principalmente da zona rural, é certa garantida em todos os programas e espelha a sua vasta audiência. Perto do fim? À cada ano que passa fica mais delicada a manutenção do programa no ar. Os recursos das agências financiadoras à cada instante rareiam. Pela aspiração política de provocar a organização e o debate na zona rural, estreita a possibilidade de anunciante. E talvez o ponto mais sensível resida na direção da emissora ligada à Igreja Católica, que no plano de modernizar-se, tem fechado os olhos para o papel exercido ao longo dos anos pelo programa. Segundo a coordenação da Tijupá, a direção da Educadora AM, que a despeito de tudo, sempre teve uma opção pelos oprimidos do estado, não tem a intenção de subsidiar mais o programa. Até o início do mês haviam duas propostas sobre a mesa. A redução drástica para 20 minutos, ou a extinção do programa. A Associação Agroecológica Tijupá Fundada em Janeiro de 1990, a TIJUPÁ , tem como missão buscar a melhoria da qualidade de vida dos agricultores e agricultoras familiares promovendo o desenvolvimento local sustentável. A ação ocorre através da difusão dos princípios da agroecologia e do fortalecimento das relações de gênero e geração tornando-as mais eqüitativas. A entidade, sediada em São Luis/MA, tem em seu quadro social trabalhadores e trabalhadoras rurais (maioria) e profissionais de várias áreas se destacando a agronômica e social. Atualmente o trabalho da TIJUPÁ se desenvolve principalmente na região Baixada Oriental Maranhense, e tem como principais parceiros os trabalhadores e trabalhadoras rurais e suas organizações (Sindicatos, Associações, etc.). A entidade trabalha na perspectiva da produção em bases sustentáveis (difusão da agroecologia), da sócio-economia solidária e da organização e formação continuada de trabalhadores e trabalhadoras rurais. A perspectiva
é respeitar e valorizar o saber e a cultura local. Além disso,
a entidade integra redes e articulações importantes como
a Rede GTA (Grupo de Trabalho Amazônico), RAMA (Rede Agroecológica
do Maranhão), Rede Abelha, ANA (Articulação Nacional
de Agroecologia), entre outros e tem cadeiras em conselhos e comissões
nacionais e estaduais de políticas de públicas (FNMA, CEDRUS,
CONSEMA, CPOrg).
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